Resultados da pesquisa por “Férias” – SINPROFAZ

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Resultado da busca para: Férias

DEPOSITADAS AS RPVS PARA PAGAMENTO DOS VALORES DE PSS SOBRE O TERÇO DE FÉRIAS

Para promover o levantamento, basta se dirigir a qualquer uma das agências da Caixa Econômica Federal com original e cópia do RG, do CPF e do comprovante de residência, e solicitar o saque dos valores depositados em conta judicial aberta no próprio nome.


SINPROFAZ INFORMA SOBRE PAGAMENTO DOS VALORES REFERENTES À CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE O TERÇO DE FÉRIAS

O SINPROFAZ iniciou a fase de cumprimento de sentença da ação relativa ao pagamento dos valores referentes à contribuição previdenciária sobre o terço de férias, para todos os que tinham diferenças a receber a esse título.


SINPROFAZ GARANTE A FILIADOS INDENIZAÇÃO POR FÉRIAS NÃO GOZADAS

Entre os argumentos de defesa, a União alegou que, nos autos, não foram comprovadas as aposentadorias dos PFNs. A sentença, por sua vez, refutou o argumento e decidiu favoravelmente ao SINPROFAZ, representado, na ação, por Wagner Advogados Associados.


SINPROFAZ AJUÍZA CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PARA DEVOLUÇÃO DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA COBRADA SOBRE O TERÇO DE FÉRIAS DOS FILIADOS

O SINPROFAZ ingressou com o cumprimento de sentença pelo escritório Mendes Plutarco Advocacia e Consultoria.


TRANSITA EM JULGADO AÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE O TERÇO DE FÉRIAS

A Diretoria esteve em reunião no escritório Mendes Plutarco tratando dos detalhes para obtenção das fichas financeiras dos filiados, elaboração dos cálculos e ajuizamento do cumprimento de sentença.


SUSPENSO O DESCONTO DO TERÇO DAS FÉRIAS DE 60 DIAS

Caros colegas, O SINPROFAZ informa que foi proferida decisão deferindo a liminar para impedir o desconto dos valores relativos à questão das férias de 60 dias.


Férias: Nova Visita ao Supremo Tribunal Federal

O Presidente do SINPROFAZ, Heráclio Camargo, juntamente com os advogados do Sindicato, estiveram novamente no gabinete do Ministro Luis Roberto Barroso para requerer a intimação da União para dar imediato cumprimento à decisão proferida pelo STJ no REsp n.º 415.691 e hoje em vigor.


Projeto isenta adicional de férias de IR e Contribuição Previdenciária

A Câmara analisa o Projeto de Lei 4965/13, do deputado César Halum (PSD-TO), que muda a legislação que trata do Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Previdenciária para que não haja descontos de nenhuma natureza no pagamento do adicional de férias. Atualmente, a legislação (Lei 7.713/88) isenta do Imposto de Renda os seguintes rendimentos…


Vitória! Contribuição Previdenciária sobre o 1/3 de Férias

A sétima turma do TRF declarou a não incidência de contribuição previdenciária sobre o 1/3 de férias dos PFNs, bem como a devolução dos valores descontados no passado, devidamente corrigidos.


FILIADOS AO SINPROFAZ PODEM ADQUIRIR CURSO DE MILHAS OFERECIDO PELO ASACLUB

A parceria firmada entre o ASAclub e a Vamos Milhar representa uma oportunidade imperdível para filiadas e filiados ao SINPROFAZ: aquelas e aqueles que adquirirem o curso sobre milhas serão beneficiados com 40% de desconto! Confira todas as vantagens do curso e aproveite!


ESCLARECIMENTOS A RESPEITO DA TRIBUTAÇÃO INCIDENTE SOBRE AS RPVS

Em atenção aos questionamentos recebidos acerca da incidência de imposto de renda sobre os créditos para pagamento dos valores devidos a título de contribuição previdenciária ao PSS sobre o terço constitucional de férias, o SINPROFAZ presta alguns esclarecimentos.


DIRIGENTES SINDICAIS E ADVOGADO REALIZAM REUNIÃO NA SEDE DO SINPROFAZ

Ao longo do encontro na sede do Sindicato, em Brasília/DF, os presentes trataram especialmente dos cumprimentos de sentença para devolução dos valores indevidamente descontados a título de contribuição previdenciária sobre o 1/3 de férias e de auxílio-pré-escolar.


DIRETORIA DO SINPROFAZ ATUA PARA GARANTIR OS DIREITOS DA CARREIRA

O SINPROFAZ, representado pelo presidente Achilles Frias e pelos diretores Giuliano Menezes e Roberto Rodrigues, esteve reunido na terça-feira (20) com o advogado Hugo Plutarco, sócio do escritório que patrocina a maior parte das ações judiciais do Sindicato. Saiba mais!


SINPROFAZ PLEITEIA APOIO DO MINISTÉRIO DA ECONOMIA PARA CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS EM BENEFÍCIO DA CARREIRA

Foi pleiteado o apoio do ME para a obtenção de informações e a elaboração de cálculos visando ao cumprimento de sentenças de procedência transitadas em julgado. Saiba mais sobre a atuação jurídica do SINPROFAZ.


SINPROFAZ INGRESSA COM NOVAS AÇÕES JUDICIAIS EM DEFESA DOS FILIADOS

O Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional, com o patrocínio do escritório Wagner Advogados Associados, ingressou com cinco (5) novas ações coletivas em nome de filiadas e filiados. As referidas ações versam sobre diferentes assuntos. Confira!


EM WEBINAR, DIRIGENTES SINDICAIS ABORDAM A DEFESA DOS DIREITOS DA CARREIRA

O SINPROFAZ promoveu o primeiro Webinar Jurídico do Sindicato. Representantes da Diretoria e da Mendes Plutarco Advocacia fizeram exposições a respeito da situação das ações judiciais em curso.


ASSOCIADOS TIRAM DÚVIDAS JURÍDICAS EM REUNIÃO NO XVII ENCONTRO DO SINPROFAZ

O diretor Roberto Rodrigues e os advogados Hugo Plutarco e Nara Nishizawa responderam aos questionamentos, esclarecendo questões a respeito dos direitos dos filiados e discutindo as estratégias adotadas para dar celeridade aos pleitos.


SINPROFAZ DEBATE PLEITOS JURÍDICOS EM REUNIÃO NO ESCRITÓRIO MENDES PLUTARCO

Atender com presteza, responsabilidade e zelo às demandas dos filiados é prioridade do SINPROFAZ. Em 23 de fevereiro, o diretor-jurídico Roberto Rodrigues reuniu-se com Hugo Plutarco e demais membros da equipe da Mendes Plutarco.


SINPROFAZ FIRMA CONVÊNIO COM ALIANÇA FRANCESA DO RIO DE JANEIRO

O convênio firmado pelo SINPROFAZ garante aos filiados do Sindicato 20% de desconto na mensalidade dos cursos ofertados pela escola. E não é só isso: o convênio se estende também aos cônjuges e filhos dos associados. Saiba mais!


NOTA CONJUNTA

Tomou-se conhecimento de que a Frentas divulgou nota na qual critica a conduta do Senado que deixou de aprovar o pedido de urgência e o mérito dos projetos que reajustam os subsídios dos ministros do STF e do PGR.


ENTIDADES DIVULGAM PERFIL DOS CANDIDATOS PARA FORMAÇÃO DA LISTA TRÍPLICE DA AGU

Confira as apresentações dos seis candidatos mais votados na primeira etapa do processo de consulta à carreira.


SINPROFAZ LANÇA ENQUETE SOBRE UNIFICAÇÃO

Considerando que a discussão acerca da Unificação das Carreiras da Advocacia-Geral da União está posta e vem sendo amplamente discutida pelos Procuradores da Fazenda Nacional, a Diretoria do SINPROFAZ lança enquete para definir o seu posicionamento a ser adotado.


ORIENTAÇÕES GERAIS DAS ENTIDADES REPRESENTATIVAS DA ADVOCACIA PÚBLICA FEDERAL – MOBILIZAÇÃO 2015

Em ofício conjunto, ANAJUR, ANAUNI, ANPAF, ANPPREV, APBC, SINPROFAZ e UNAFE publicam orientações para continuidade da mobilização das Carreiras.


Nota aos Colegas Procuradores da Fazenda Nacional

SINPROFAZ repudia nota da assessoria jurídica da Unafe acerca do processo de férias de 60 dias por conter menção inadequada a Procuradores da Fazenda Nacional.


Senador Vital do Rêgo garante a manutenção de honorários

É o que revela matéria divulgada no site do senador na última quarta, 6/8. Vital do Rêgo é o relator do novo Código de Processo Civil (CPC) e posicionou-se a favor da advocacia pública.


Câmara aprova novo CPC com avanços para a advocacia

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na noite de terça-feira (5/11), a base da parte geral do novo Código de Processo Civil. O texto traz consideráveis avanços para a advocacia.


Ministro do STF decide sobre questão em que SINPROFAZ interveio no CNJ

Decisão refere-se à possibilidade de assessoramento de magistrados por Procuradores da Fazenda Nacional.


Deputado manifesta apoio à PEC 555/06

A proposta, que acaba com a contribuição previdenciária dos servidores aposentados e pensionistas, está pronta para votação no plenário da Câmara.


SINPROFAZ notifica PGFN sobre estudo de lotação

Sindicato formalizou a insatisfação dos PFNs com o estudo de lotação e pediu a revisão de seus critérios. Resultados demonstraram a falta de diálogo da PGFN com a carreira na condução desse processo.


Ministro Napoleão Nunes Maia Filho atendeu a um pedido da Fazenda Nacional

O ministro Napoleão Nunes Maia Filho, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), suspendeu ontem decisão da 1ª Seção que afastou a incidência da contribuição previdenciária sobre férias e salário-maternidade. A questão foi analisada em fevereiro por meio de um recurso da Globex, controladora do Ponto Frio. De acordo com o despacho do ministro, os efeitos…


Fazenda tenta suspender decisão de tribunal

Por Bárbara Pombo | De Brasília A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) pediu a suspensão da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que afastou a incidência da contribuição previdenciária sobre férias e salário-maternidade. A questão foi analisada em fevereiro, a partir de um recurso da Globex, controladora do Ponto Frio. A discussão é relevante…


Novo presidente da OAB toma posse

Durante seu discurso, Marcus Vinícius Furtado citou a previsão de honorários para o advogado público entre os projetos de maior interesse da Ordem em tramitação no Congresso.


Honorários serão luta do novo presidente da OAB

A percepção de honorários de sucumbência e outros assuntos de interesse da Advocacia Pública foram defendidos pelo novo presidente da OAB em artigo publicado no jornal O Globo na última quarta-feira (6).


Protagonista de causas

A Ordem dos Advogados do Brasil cumpre sua maior missão institucional, a defesa intransigente dos valores constitucionais, o maior deles, o Estado de Direito, da mesma forma que não abre mão das causas corporativas a favor da advocacia. Não são lutas excludentes, mas complementares. Quando clama pelo Estado de Direito está preservando a profissão do…


Direito Constitucional Tributário no Império do Brasil

André Emmanuel Batista Barreto Campello
Procurador da Fazenda Nacional. Exerceu os cargos de Advogado da União/PU/AGU, Procurador Federal/PFE/INCRA/PGF e Analista Judiciário – Executante de Mandados/TRT 16ª Região, tendo também exercido a função de Conciliador Federal (Seção Judiciária do Maranhão). É Professor de Direito Tributário da Faculdade São Luís e ex-professor substituto de Direito da UFMA. Especialista em Docência e Pesquisa no Ensino Superior. Membro do Conselho Superior da Advocacia-Geral da União.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O Nascimento do Império do Brasil; 2 A Competência Tributária; 3 Limites ao Poder de Tributar; 5 Conclusão.

RESUMO: Direito Tributário Constitucional no Império do Brasil. Trata-se de artigo que tem por finalidade estudar o sistema tributário brasileiro vigente durante o Império do Brasil, sobretudo durante o entre os anos de 1822 e 1840, que marca o período das grandes definições fiscais imperiais, relacionadas sobremaneira com a fixação das competências tributárias nacionais, sem deixar de analisar problemas jurídicos surgidos relacionados com estas escolhas políticas. Por se pretender analisar a repartição do poder de tributar, almejou-se estudar o direito constitucional tributário então vigente, bem como as limitações ao poder de tributar opostas ao Estado imperial brasileiro. Por meio de tal análise buscou-se também vislumbrar a construção do Império do Brasil e suas turbulências, nestas primeiras décadas, relacionadas, sobretudo, com o tipo de Estado adequado para atender aos conflitos entre as pretensões provinciais e a Monarquia centralizadora.

PALAVRAS-CHAVE: História. Direito. Tributário. Constitucional. Brasil império.

INTRODUÇÃO

O direito, em qualquer sociedade, não pode ser compreendido como um fenômeno isolado no tempo e no espaço. Não pode ser vislumbrado como um amontoado de normas que não estão relacionadas com os valores, as visões de mundo e as expectativas de um grupo social (que o cria e que por ele é governado), em determinado momento da sua história (FERREIRA, 1975, p.31).

A percepção deste fenômeno fica mais evidente quando se estuda o direito contemporâneo, pois, de certo modo, vive-se sob a égide destas normas e se consegue compreender os institutos e o alcance deles, sendo possível vislumbrar-se a alteração da interpretação do Direito, e como as normas se relacionam para construir um sistema jurídico.

Os indivíduos que integram a nossa sociedade, por exemplo, sejam ou não operadores do Direito, percebem as normas jurídicas, isto é, tem uma mínima compreensão dos principais limites impostos pelo ordenamento às suas condutas, inferindo também os direitos que lhe são assegurados.

Em outras palavras, por se viver sob o império do direito, é possível senti-lo; consegue-se perceber a sua dinâmica.

Para o operador do Direito, ao se ler as grandes obras jurídicas, ao conversar com os demais colegas, ao trocar informações na faculdade, ao se defrontar com a jurisprudência dos Tribunais ou ao se atualizar com as informações colhidas na internet, fica manifesta a vivacidade do ordenamento jurídico que está em vigor.

Entretanto, quanto mais se recua no tempo, ao se estudar o direito do passado, algo começa a desaparecer: a percepção de “vida” das normas começa a se esvair.

Não se detecta, com mais facilidade como estas normas se organizavam, de como era construído o sistema jurídico, qual era o alcance e a sua aplicação.

Por exemplo, por constar nos livros dos grandes autores clássicos, como Pontes de Miranda (MIRANDA, 1966, p. 25) ou Aníbal Bruno (BRUNO, 2003, p. 106), compreende-se como era aplicado e compreendido o Código Penal, quando dos primeiros anos da sua origem. Ainda se é possível perceber como era a sua essência e a sua conexão com o direito penal atual, pois, além deste diploma legal está em vigor (apesar da reforma da sua parte geral e de inúmeros dispositivos da parte especial), houve uma constante aplicação, sem rupturas, desde a sua criação, com a interpretação das suas normas, tomando por base as inúmeras constituições vigentes, em cada um dos períodos históricos (Constituições de 1937, de 1946, de 1967/69 e de 1988).

Em outras palavras, um leitor que viesse a desejar fazer a leitura do Código Penal, na sua redação original, não estranharia o seu conteúdo, pois se trata de diploma legal que ainda guarda pontos de contato com o pensamento jurídico contemporâneo e com a própria sociedade brasileira, em alguns de seu aspectos, apesar de tal Código ser datado da década de 40, no século XX, já possuindo algumas de suas partes, quase 70 anos.

No direito tributário, vive-se uma experiência um pouco mais complicada.

O Código Tributário Nacional (Lei nº. 5.172/66), decorrente da Emenda constitucional nº 18/66, foi um diploma revolucionário na história do Brasil, por ter conseguido, de forma sucinta, clara e precisa, apresentar alicerces para a construção de uma teoria do tributo e das novas bases para a relação entre Fisco e contribuinte (MARTINS, 2005, p. 29-31).

Toda a teoria contemporânea do direito tributário, por óbvio, foi edificada sobre os alicerces lógicos do nosso Código Tributário de 1966.

Em outras palavras, o operador do direito, quando busca estudar o Direito Tributário, irá sempre tentar visualizar as normas jurídicas sob as categorias lógicas fornecidas pelo nosso Código Tributário: competência tributária, capacidade tributária, limitações ao poder de tributar (princípios e imunidades), conceito de tributo, elementos da norma tributária, espécies tributárias, legislação tributária, obrigação tributária, crédito tributário etc.

Em outras palavras, a legislação fiscal brasileira pré-Código Tributário, para alguns, pode até se parecer com leis de civilizações desaparecidas, como se fora o Código de Hamurabi, da Babilônia, pelo seu exotismo e estranha forma de se apresentar, não guardando, aparentemente, nenhum contato com o nosso direito atual.

De fato, ao se estudar o direito tributário do Império do Brasil, o operador do direito se defronta com obstáculos que devem ser transpostos, sendo que o primeiro deles é que alguns dos parâmetros interpretativos contemporâneos não se conectam às estruturas fiscais do Brasil imperial, isto é, a doutrina jurídica não cria pontos de enlace entre o direito tributário brasileiro atual e o que vigia no século XIX.

O segundo empecilho reside no fato de que estudar o direito vigente no Império do Brasil é estudar normas jurídicas que foram criadas para reger uma sociedade que possui significativas diferenças econômicas (e culturais) em relação ao Brasil contemporâneo, logo, as bases para compreensão não podem se fundamentar em valores vigentes atualmente.

As categorias lógico-jurídicas que regiam o direito brasileiro no Império do Brasil são, em demasia, distintas das que vigoram atualmente, a começar pela inexistência de um Código Civil, pela manutenção do odioso instituto jurídico da escravidão como alicerce do trabalho produtivo (pelo menos até 1860), e pelo fato de que o Império era um Estado unitário sui generis, sobretudo após o Ato Adicional de 1834, que reformou a Constituição de 1824.


Adverte-se que, assim como no estudo do direito romano (ALVES, 1995, p. 67-74.), não se pode vislumbrar o Império do Brasil como um conjunto monolítico de normas, inalteradas no tempo.

As necessidades fiscais do reinado de D. Pedro I, sem dúvidas, não se assemelham às da Regência, muito menos às existentes durante o longo reinado em que D. Pedro II governou a nação, no qual o Brasil se envolveu muito na política interna dos seus vizinhos do cone sul, culminando no conflito armado no Paraguai. (BALTHAZAR, 2005, p.93)

Para saciar estas necessidades fiscais, o Império criou tributos (e as províncias também) sobre novos fatos geradores, instituiu alíquotas adicionais sobre tributos já existentes, abusou da bitributação, mas, sobretudo, buscou taxar as principais atividades econômicas da sociedade brasileira: a exportação, a importação e o consumo de bens não-duráveis.

Mas o Império, apesar do seu desequilíbrio fiscal, deixou de tributar a renda e a propriedade territorial rural, se abstendo de impor taxação sobre a acumulação de riqueza da elite brasileira.

Estudar o direito do Império do Brasil é assaz interessante pelo fato de que nos fornece as perspectivas da sociedade brasileira que estava, após a independência, tentando construir uma nação continental, já sendo possível perceber o nascer de algumas das estruturas do Brasil contemporâneo.

No estudo que será realizado, por óbvio, tenta-se sistematizar o conhecimento à luz de algumas das categorias lógicas do direito tributário contemporâneo, para que o leitor possa compreender o direito vigente naquele período tentando-se adentrar na essência das normas tributárias.

Assim como nas obras de direito romano (CRETELLA JUNIOR, 1995, p. 19-20), faz-se uma tentativa de, didaticamente, apresentar aos operadores do direito as facetas de como era a estrutura e a aplicação do direito em uma sociedade que existiu há quase dois séculos.

Evidente que não se busca cair no erro do anacronismo, mas apenas utilizar as ferramentas dadas pela moderna ciência do estudo do Direito Tributário para entender a realidade passada, a fim de compreender as normas então vigentes, segundo os valores da sociedade brasileira do século XIX.

Este passo é necessário, pois, por óbvio, não seria possível ao autor, simplesmente, estudar o direito do passado, com os olhos do homem daquele contexto histórico, já que tanto o leitor deste trabalho quanto o seu autor integram a sociedade brasileira do início do século XXI, ou seja, pertencem ao presente.

Por esta razão, ao longo desta pequena obra, buscou-se estudar o Direito imperial do Brasil à luz das interpretações do Marquês de São Vicente, que talvez possa ser considerado o grande Constitucionalista do período imperial. A visão e a compreensão deste autor acerca do ordenamento jurídico serviu de ponto de partida para nossas reflexões.

Não obstante esta forma de fazer a leitura da legislação, não nos furtamos a tentar adequar os institutos tributários com a tecnologia lingüística do direto contemporâneo, sobretudo a fim de decifrar as disposições legais estabelecidas. Deve-se frisar que o estudo da legislação tributária imperial, com a utilização de alguns dos arquétipos construídos pala doutrina de direito tributário contemporâneo, não é algo estranho ao estudo de temas relacionados com a história do direito

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Este mesmo método é utilizado pelos autores quando se busca a compreensão do direito romano (CORREIA e SCIASCIA, 1996, p. 32): realiza-se a divisão da matéria em uma parte geral e especial, analisando os institutos civilísticos romanos, sob os parâmetros dados pela codificação do direito civil moderno, apesar de o direito romano clássico (aproximadamente, de 140 a.C, com a criação da Lei Aebutia, até o término do reinado de Diocleciano, em 305 d.C.) não ter construído nenhum código ou instrumento legal similar, já que, neste período, surgiram duas ordens distintas: o ius civile (direito aplicável apenas aos cidadãos romanos) e o ius honorarium (criado pela atuação dos pretores peregrinos, com o advento da Lei Aebutia, os quais eram magistrados que dirimiam os conflitos entre gentios, ou entre estes e os romanos). (ALVES, 1995, p. 69-70)

Feitas estas considerações iniciais, convida-se o leitor a vislumbrar o nascimento do Império do Brasil, com a outorga da Constituição de 1824.

1 O NASCIMENTO DO IMPÉRIO DO BRASIL

1.1 A INDEPENDÊNCIA E A CONSTRUÇÃO DE UMA NAÇÃO

O Império do Brasil não nasceu pronto e acabado: trata-se de um projeto político das elites das províncias do sul ao qual se associou a figura do Imperador D. Pedro I.

A proclamação da independência por sua majestade imperial, um ato derivado, sem dúvidas, da sua impetuosidade (LUSTOSA, 2006, p.152-153) não foi suficiente, por si só, para promover a adesão das demais capitanias (e futuras províncias) do então restante Reino do Brasil, sobretudo no norte da América lusitana.

Não existia uma nação brasileira, não existia um Estado brasileiro.

Em verdade, ao longo da história colonial, a metrópole lusitana buscou fazer com que os principais portos e zonas econômicas tivessem laços imediatos apenas com Portugal e não entre si. Pode-se afirmar que os principais pólos econômicos da colônia brasileira estariam mais interligados ao contexto de exploração econômica do Atlântico sul (Luanda, Guiné etc.), devido ao intercâmbio escravista, do que de regiões interioranas do Brasil (ALENCASTRO, 2000, p.9).

Nas palavras de MELLO (2004, p.18): “Como observava Horace Say, ao tempo da Independência, o Brasil era apenas “a designação genérica das possessões portuguesas na América do Sul”, não existindo “por assim dizer unidade brasileira”.

A inexistência de uma nação brasileira, de um país denominado de Brasil, fica mais claro ainda quando se vislumbra o surgimento da Confederação do Equador (1824), quando as capitanias de Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Rio Grande do Norte e do Ceará não compactuaram com o projeto político de criação do Império do Brasil, que faria com que estas passassem a se subordinar à Corte imperial, no Rio de Janeiro.

Entretanto, a Corte necessitava da Bahia, de Pernambuco e das demais capitanias do norte, tendo em vista que estas ricas regiões poderiam financiar tanto a independência da América portuguesa, quanto os projetos políticos de D. Pedro I e a guerra na província Cisplatina. (MELLO, 1999, p. 249-250)

1.2 A HERANÇA LEGISLATIVA COLONIAL

O Império do Brasil não herdou apenas a estrutura econômico-social vigente durante o seu período de vínculo para com Portugal colônia, mas também a legislação metropolitana portuguesa que foi recepcionada pela Lei de 20 de outubro de 1823:

Art. 1.º As Ordenações, Leis, Regimentos, Avaras, Decretos, e Resoluções promulgadas pelos Reis de Portugal, e pelas quaes o Brazil se governava até o dia 25 de Abril de 1821, em que Sua Magestade Fidelíssima, actual Rei de Portugal, e Algarves, se ausentou desta Corte; e todas as que foram promulgadas daquella data em diante pelo Senhor D. Pedro de Alcântara, como Regente do Brazil, em quanto reino, e como Imperador Constitucional delle, desde que se erigiu em Império, ficam em inteiro vigor na parte, em que não tiverem sido revogadas, para por ellas se regularem os negócios do interior deste Império, emquanto se não organizar um novo Código, ou não forem especialmente alteradas.

O Império do Brasil, no seu nascedouro, recepcionou a legislação portuguesa inclusive a legislação tributária da metrópole.


Por esta razão os mesmos defeitos que constavam no sistema de tributação da metrópole portuguesa, no que se refere a sua lei vigente no Brasil, também assolavam a estrutura tributária brasileira quando da ocorrência da independência do Brasil:

[…] a Independência não significava um rompimento com a estrutura patrimonialista, tendo em vista o interesse de determinados setores de manter o status quo. Desta forma, quanto aos tributos, herdou-se a frágil estrutura colonial, embora a mudança na excessiva carga tributária constasse como um dos objetivos do movimento patriótico. (BALTHAZAR, 2005, p.78)

D. Pedro I proclamou expressamente que uma das razões para independência era a necessidade de um novo regime de tributação, diferente do existente na metrópole, que não asfixiasse a vida econômica do Brasil:

[…] grande dose de verdade havia na afirmativa que o então príncipe regente constitucional fizera, dias antes do grito do Ipiranga, de que Portugal, em suas relações com a antiga colônia, queria “que os brasileiros pagassem até o ar que respiravam e a terra que pisavam. (ELLIS, 1995, p. 62)

O então Príncipe regente alardeava os seus desejos:

[…] os brasileiros teriam um sistema de impostos que respeitaria “os suores da agricultura, os trabalhos da indústria, os perigos da navegação e a liberdade do comércio”, sistema esse tão “claro e harmonioso” que facilitaria “o emprego e a circulação dos cabedais”, desvendando “o escuro labirinto das finanças”, que não permitia ao cidadão “lobrigar o rosto do emprego que se dava às rendas da Nação”. (ELLIS, 1995, p.62)

Evidente que tal promessa não foi cumprida, tendo em vista a impossibilidade de reforma profunda da legislação lusitana que havia sido recepcionada, pelos sucessivos déficits fiscais e pelos tratados internacionais que fixavam as alíquotas do imposto de importação em patamares insignificantes.

O brilhante Procurador da Fazenda Nacional Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, ao analisar a tributação no período joanino, expõe as razões dadas pelo príncipe regente (o futuro rei D. João VI) para a diminuição da alíquota do imposto de importação em face de mercadorias portuguesas (Decreto de 11 de junho de 1808):

Sendo conveniente ao bem público remover todos os embaraços que possam tolher o livre giro e a circulação do comércio: e tendo consideração ao estado de abatimento, em nome de que presente se acha o nacional, interrompido pelos conhecidos estorvos e atuais circunstâncias da Europa: desejando animá-lo e promovê-lo em benefício da causa pública, pelos proveitos, que lhe resultam de se aumentarem os cabedais da Nação por meio de um maior número de trocas e transações mercantis, e de se enriquecerem os meus fiéis vassalos que se dão a este ramo de prosperidade pública e que muito pretendo favorecer como uma das classes úteis ao Estado: e querendo outrossim aumentar a navegação que prospere a marinha mercantil, e com ela a de guerra, necessária para a defesa dos meus Estados e Domínios: sou servido ordenar que todas as fazendas e mercadorias que forem próprias dos meus vassalos, e por sua conta carregadas em embarcações nacionais, e entrarem nas Alfândegas do Brasil, pagarem por direito de entrada dezesseis por cento somente. (GODOY, 2008, p.31)

Tendo em vista este desequilíbrio estrutural na legislação fiscal, o Império do Brasil nasceu tendendo a não conseguir organizar seu orçamento, já que, além das inúmeras obrigações político-militares que teve de assumir, em face do rompimento com a metrópole lusitana, ainda recepcionou tratados internacionais que lhe impediam de tributar, de modo significativo, a importação de mercadorias, então a mais significativa atividade econômica do país.

1.3 A CONSTITUIÇÃO DE 1824: A CONSTRUÇÃO DE UM ESTADO UNITÁRIO

1.3.1 A DISSOLUÇÃO DA ASSEMBLÉIA CONSTITUINTE DE 1823

Pelo Decreto de 12 de novembro de 1823, D. Pedro I dissolveu a Assembléia Geral Constituinte e Legislativa, que havia sido convocada, pelo próprio soberano, pelo Decreto de 03 de junho de 1822.

Segundo o nosso Imperador, tal fato se deu porque este órgão (fundante do próprio Estado brasileiro) teria perjurado o solene juramento de defender a integridade do Império, sua independência e a dinastia de D. Pedro I. Tal ato extremo, segundo o soberano, deu-se para a salvação do Império, como consta no referido instrumento normativo.

Observe-se que Frei Caneca, na edição natalina do periódico Typhis Pernambucano, de 25 de dezembro de 1823, demonstra que as decisões políticas cristalizadas no título 1º, arts. 1, 2 e 3, da abortada Constituição de 1823, não agrediam o juramento feito pelos constituintes de defender a integridade do Império, sua independência e a dinastia de D. Pedro I. (CANECA, 2001, p.309)

Pela Proclamação de 13 de novembro de 1823, S. Majestade Imperial comunicou ao povo brasileiro, que a Assembléia Constituinte de 1823 foi dissolvida e, em seguida, pelo Manifesto de 16 de novembro de 1823, explicitou as razões da prática de tal ato: o “fel da desconfiança”, que elaboravam planos ocultos para semear a discórdia no Brasil, ameaçando o futuro e a própria existência da Nação.

Em 17 de novembro do mesmo ano (de 1823), também por meio de Decreto, o Defensor Perpétuo do Brasil ratificou mandou proceder à realização de eleições para composição de nova Assembléia Geral Constituinte e Legislativa, que como se sabe, nunca promulgou nova Constituição.

Coube ao Conselho de Estado, sobretudo pelo trabalho de José Joaquim Carneiro de Campos (o futuro Marquês de Caravelas, integrante da futura regência trina provisória, constituída em 07 de abril de 1831), influenciado pelo pensamento de Benjamin Constant, preparar um anteprojeto de Constituição, sobre os escombros dos trabalhos da Assembléia Constituinte de 1823.

Este anteprojeto foi apresentado à Câmara Municipal do Rio de Janeiro, que, ao declarar que o seu texto era imelhorável, apresentou respectiva proposta de juramento (em 08 de janeiro de 1824), para coincidir com o Dia do Fico.

O Imperador rejeitou a proposta e fixou o juramento da Constituição para 25 de março daquele ano (1824). (MELLO, 2004, p.169)

Ao povo brasileiro, por meio da Carta de Lei de 25 de março de 1824, o Imperador do Brasil apresentou o teor da Constituição do Império do Brasil que deveria ser jurada por ele e pelos representantes das Câmaras (advindas de diversas províncias), em local e data já fixados: no dia 25.03.1824, na Câmara do Rio de Janeiro, como consta no Decreto de 13 de março de 1824.


É interessante observar que o Imperador buscou legitimidade para a outorga da sua carta política não em uma Assembléia Constituinte (ou Legislativa), mas nas Câmaras municipais, a começar, pela Câmara do Rio de Janeiro, o que era de se estranhar, já que tais órgãos não eram representantes do povo, mas do próprio Rei, tendo em vista a sua natureza jurídica oriunda da legislação metropolitana portuguesa:

No direito português, o poder das Câmaras, como o das antigas Cortes, não advinha da nação mas do Rei, pois uma e outras „não são representantes dos povos; representam sim pelos povos. A Câmara do Rio, […], tomava-se pelo Senado romano e decidia pelo Brasil, como havia feito em 1822 o Conselho de Procuradores, que tampouco tivera competência para aclamar d. Pedro fosse Defensor perpétuo, fosse Imperador. [grifos do autor] (MELLO, 2004, p.170)

Portanto, por ato do Defensor Perpétuo do Brasil, foi outorgada a Constituição de 1824.

1.3.2 O ESTADO UNITÁRIO

A natureza jurídica do Império do Brasil era a de um Estado Unitário (LOPES, 2002, p.313), resultante de uma proclamada: “associação Politica de todos os Cidadãos Brazileiros. Elles formam uma Nação livre, e independente, que não admitte com qualquer outra laço algum de união, ou federação, que se opponha á sua Independencia. (art. 1, da Constituição de 1824)”.

As províncias eram órgãos administrativos decorrentes da desconcentração do órgão central, sendo, portanto, uma extensão deste, que tinham por atribuição a gestão das regiões do Império, na forma da Lei (arts. 165 e 166 da Constituição de 1824)

Tais Províncias, por serem órgãos responsáveis pela gestão de parcela do território da Nação, poderiam ser alteradas, isto é, a sua amplitude territorial poderia ser modificada sem consulta aos habitantes destas regiões: “art. 2. O seu territorio é dividido em Provincias na forma em que actualmente se acha, as quaes poderão ser subdivididas, como pedir o bem do Estado.”.

Como exemplo, menciona-se o Decreto de 07 de julho de 1824, da lavra de Sua Majestade Imperial, que, após parecer do Conselho de Estado (art. 137 da Constituição de 1824), “desligou” da província de Pernambuco a comarca do Rio de São Francisco.

A Constituição que em cada Província seria assegurado aos cidadãos o direito de intervir nos seus negócios, tendo em vista os interesses peculiares destas regiões.

Tal direito deveria ser exercitado pelos Conselhos Gerais de cada Província (art. 71 e 72 da Constituição de 1824), cujas resoluções deveriam ser submetidas ao Poder Executivo (art. 77 da Constituição de 1824), não podendo estes órgãos deliberativos dispor sobre: assuntos de interesse geral; ajustes interprovinciais; criação de imposições (tributos); ou execução das leis (art. 83 da Constituição de 1824).

1.4 A REFORMA DA CONSTITUIÇÃO DE 1824: O ATO ADICIONAL DE 1834

1.4.1 O PROCEDIMENTO DE REFORMA DA CONSTITUIÇÃO DE 1824

A Constituição de 1824 estabelecia que durante determinado período (04 anos) ela seria imutável (MORAES, 2003, p.39), podendo a partir daí ser reformada (art. 174 da Constituição de 1824): “Se passados quatro annos, depois de jurada a Constituição do Brazil, se conhecer, que algum dos seus artigos merece reforma, se fará a proposição por escripto, a qual deve ter origem na Camara dos Deputados, e ser apoiada pela terça parte delles”.

Apesar desta imutabilidade transitória, a Constituição de 1824 poderia ser classificada como uma constituição semi-rígida (ou semi-flexível): isto é, parte do seu texto poderia ser alterado pelo procedimento das leis ordinárias. (MORAES, 2003, p.39)

A Constituição declarava que existiam determinados temas contidos no seu corpo que eram materialmente constitucionais: “É só Constitucional o que diz respeito aos limites, e attribuições respectivas dos Poderes Politicos, e aos Direitos Politicos, e individuaes dos Cidadãos” (art. 178, 1ª parte, da Constituição de 1824).

Tais normas que dispunham sobre tais temas representavam o núcleo constitucional desta Charta e só poderiam ser alteradas sob o rito previsto nos seus arts. 175, 176 e 177.

Todas as demais matérias eram consideradas apenas formalmente constitucionais e, portanto, não se submetiam a este rito especial de reforma: “Tudo, o que não é Constitucional, póde ser alterado sem as formalidades referidas, pelas Legislaturas ordinarias.” (art. 178, 2ª parte, da Constituição de 1824).

1.4.2 A ABDICAÇÃO DE D. PEDRO I

Por uma ironia do destino, o reinado do Defensor Perpétuo do Brasil D. Pedro I se encerrou com a sua abdicação, em favor de seu filho, às 10 horas, de 07 de abril de 1831, praticado no Senado brasileiro, onde se encontravam presentes 26 senadores e 30 deputados.

Além de ter ocorrido durante as férias parlamentares (art. 18 da Constituição de 1824) (VIANNA, 1967, p.104), a abdicação trazia um problema em si: não existia previsão de a Assembléia Geral eleger um Regente para esta situação (art. 15, II, da Constituição de 1824), pois a Charta política apenas elencava tal possibilidade em caso de falecimento do soberano, se não fosse possível a coroação

do seu sucessor (art. 47, IV c/c arts. 121 e 122, da Constituição de 1824).

Ou seja, a sucessão deveria se dar apenas na forma do art. 117 da Charta imperial, o que se apresentava como outro problema.

O Regente deveria ser o parente mais próximo do soberano com mais de 25 anos e, se não houvesse, deveria ser instituída uma Regência provisória composta por dois Ministros (Estado e Justiça) e dois dos mais antigos membros do Conselho de Estado, sob a presidência da Imperatriz viúva (e, na sua ausência, pelo mais antigo membro do Conselho de Estado). Esta Regência provisória se manteria até a escolha da Regência permanente pela Assembléia Geral, na forma do art. 123 da Constituição de 1824.

Entretanto, os fatos do turbulento dia de 07 de abril de 1831 atropelaram as disposições constitucionais, já que a Imperatriz havia falecido (em 11.12.1826), não existiam outros herdeiros maiores de 25 anos e o Imperador, que deveria ter sido o Defensor Perpétuo do Brasil, havia subitamente abdicado: “A regulamentação constitucional, como se vê, pressupunha situações normais, enquanto o que acontecera naquele tumultuado 7 de abril fora anormalíssimo, excepcional, reclamando, desta sorte, tratamento diferente”. (PORTO, 1981, p.10)

No mesmo ato de abdicação foi constituída provisoriamente uma Regência Trina, composta pelos seguintes membros: Brigadeiro Francisco de Lima e Silva, José Joaquim Carneiro de Campos (o Marques de Caravelas) e pelo Senador Nicolau Pereira do Santos Vergueiro.

Iniciava-se o período regencial no Brasil e com ele aguçaram-se os debates sobre a reforma constitucional.


1.4.3 O ADVENTO DO ATO ADICIONAL DE 1834

Com o advento da era regencial, a pressão por maior autonomia provincial se intensificou, culminando na edição de uma verdadeira tentativa de revolução constitucional: o Ato Adicional de 1834.

O Ato Adicional de 1834 que instituiu a Regência Una, foi o resultado de um processo de negociação que se iniciara em 1831 e que concedeu autonomia às Províncias, estabelecendo a existência nelas de dois centros de poder: a Assembléia Legislativa – que substituiu os Conselhos Gerais, e a presidência provincial. (DOLHNIKOFF, 2005, p. 93 e 97)

Nas palavras do Padre FEIJÓ, Regente do Brasil, vislumbrava-se os limites da autonomia político-legislativa concedida às províncias:

Somente os negócios gerais, quais os direitos e obrigações dos cidadãos, os códigos criminal e de processo, o emprego das forças e do dinheiro foram excluídos da ação das assembléias provinciais. Hoje as províncias têm em seu meio a potência necessária para promover todos os melhoramentos materiais e morais. A seus filhos está encarregada a espinhosa tarefas, mas honrosa, de fazer desenvolver os recursos necessários a seu bem ser. (apud DOLHNIKOFF, 2005, p. 100)

Ou seja, a Constituição do Império foi alterada de tal forma que já se nota o despontar do embrião da futura federação brasileira.

O Ato Adicional de 1834, a Lei nº 16, de 12 de agosto de 1834, foi votado observando os ritos previstos para a reforma da Constituição (DOLHNIKOFF, 2005, p. 97), bem como ao disposto na Lei de 12 de outubro de 1832, que determina que os eleitores, ao elegerem os membros da Câmara dos Deputados, para legislatura seguinte, lhes concederiam poderes para a reforma de inúmeros dispositivos da Constituição Imperial.

Devido a problemas gerados pela aplicação de normas jurídicas contidas no Ato Adicional de 1834, foi editado uma Lei Interpretativa deste diploma, Lei nº 105, de 12 de maio de 1840, restringindo os excessos desta experiência semi-federalista ocorrida durante o período regencial (DOLHNIKOFF, 2005, p. 125), inclusive com a possibilidade revogação de leis provinciais, por ato praticado pelo Poder Legislativo Geral (art. 8º), se afrontarem as interpretações autênticas conferidas por este diploma legal; bem como a faculdade de o presidente da província negar sanção a projeto de lei local que venha contrariar a Constituição do Império (art. 7º da Lei Interpretativa combinado com o art. 16 do Ato Adicional de 1834). (VIANNA, 1967, p.111)

Evidente que a história legislativa imperial não se encerra neste momento, mas a partir daqui o leitor já possui subsídios para a compreensão dos temas que serão a seguir estudados.

Nos capítulos seguintes pretende-se adentrar no estudo do Direito Tributário no Império do Brasil.

2 A COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

2.1 A CONSTITUIÇÃO E O PODER DE TRIBUTAR

A partir da ascensão da doutrina constitucionalista (MORAES, 2003, p.35), no século XVIII, o poder de tributar, assim como qualquer espécie de poder, tem a sua origem no Povo, que se apresenta como o seu titular.

O Povo, por meio de seus representantes, reunido em assembléia constituinte, poderá instituir um Estado, por meio de uma Constituição:

A Constituição é a ordem fundamental jurídica da coletividade. Ela determina os princípios diretivos, segundo os quais deve formar-se unidade política e tarefas estatais ser exercidas. Ela regula procedimentos de vencimento d conflitos no interior da coletividade. Ela ordena a organização e o procedimento da formação da unidade política e da atividade estatal. Ela cria as bases e normaliza traços fundamentais da ordem total jurídica. Em tudo, ela é “o plano estrutural fundamental, orientado por determinados princípios de sentido, para a configuração jurídica de uma coletividade.” (HESSE, 1998, p.37)

Pelo fenômeno do constitucionalismo, o Povo, por meio da Constituição por ele proclamada, edificaria o Estado, delegaria poderes às entidades políticas do Estado, repartiria atribuições entre os órgãos estatais, criaria limites e os respectivos instrumentos para assegurar as liberdades individuais.

Dentro da perspectiva da delegação de poderes e a sua repartição entre os órgãos estatais, pode-se vislumbrar um dos fundamentos do Direito Tributário: o exercício da competência tributária.

2.2 O PODER DE TRIBUTAR E A COMPETÊNCIA LEGISLATIVA NA CHARTA MAGNA DE 1824

O Direito Tributário, como nós conhecemos, também só pode ser compreendido a partir dos eventos das revoluções burguesas do século XVIII que ensejaram o surgimento do fenômeno do constitucionalismo.

Pode-se afirmar, sem muitos receios, que um dos marcos, do direito tributário, foi a revolta popular contra a Lei do Selo de 22 de março de 1765, que impunha a obrigatoriedade de obtenção de selo público em todos os contratos, jornais e cartazes, mediante pagamento de taxa nas colônias americanas da Inglaterra. A Declaração dos colonos, oferecida ao rei Jorge III, se inspirou na idéia de que o Parlamento inglês não poderia impor uma tributação à sociedade (da colônia), pelo simples fato de que neste órgão legislativo não existiam representantes populares das colônias americanas, as quais sofreriam a imposição fiscal: not tributation without representation. A lei foi revogada em 1766.

Mais adiante, como o Parlamento metropolitano inglês pretendia instituir tributação adicional sobre o chá que seria exportado desta colônia para a metrópole, a comunidade de Boston reputou por injusta e abusiva a incidência deste tributo, o qual prejudicaria o seu comércio, bem como a vida econômica daquela sociedade: estava armado o palco para a deflagração da revolta, que culminou com o Massacre de Boston, em 5 de maio de 1770. (KERNAL, 2008, p. 77-79).

O tributo passou a ser compreendido como uma exceção a dois direitos fundamentais, o de livre obrigar-se e o de propriedade: ninguém está obrigado a fazer ou a deixar de fazer algo senão em virtude lei (art. 179, I, da Constituição de 1824) e é assegurado a todos o direito de possui patrimônio (art. 179, XXII, da Constituição de 1824).

Ou seja, o indivíduo só estaria obrigado a pagar algo, contra a sua vontade, transferindo parte do seu patrimônio, se a lei (em sentido formal) assim o declarasse.


A Charta Magna de 1824 incorporava estes princípios, ao estabelecer, em seu art. 36, I, que era da competência privativa da Câmara dos Deputados, cujos representantes eram eleitos (para mandato provisório) pelo voto dos cidadãos habilitados (art. 35 e 90 da Constituição de 1824), a instauração do processo legislativo sobre impostos:

Os impostos e o recrutamento são dois gravames que pesam muito sobre os povos, são dois graves sacrifícios do trabalho ou propriedade, do sangue e da liberdade, são dois assuntos em que a nação demanda toda a poupança, meditação e garantias.

[…]

Se a Câmara rejeita a medida, a rejeição é peremptória, pois que o Senado não pode propô-la; se adota, os termos da adoção vêm já acompanhados do juízo expressado, das circunstâncias dos debates, de uma influência moral ou predomínio importante, que gera impressão sobre a opinião pública e que deve ser bem considerado pelo Senado, que antes disso não é chamado a manifestar suas idéias. Acresce que , por uma conseqüência lógica e rigorosa, o senado não pode mesmo emendar tais projetos no fim de aumentar por forma alguma o sacrifício do imposto […], ou de substituir a contribuição por outra mais onerosa, pois que seria exercer uma iniciativa nessa parte. Seu direito limita-se a aprovar, rejeitar ou emendar somente no sentido de diminuir o peso ou duração desses gravames

[…]

Tal é o privilégio que a Câmara dos Comuns mais zela na Inglaterra; ela não tolera que nenhuma medida que tem relação direta ou estreita com money-bill possa ser iniciada na Câmara dos Lordes. (SÃO VICENTE, 2002, p. 172-173)

Este poder conferido à Câmara dos Deputados se justificava, em verdade, pela natureza da composição deste órgão, no qual se faziam presentes os mandatários que representavam o Povo, de modo mais imediato:

Os deputados são os mandatários, os representantes os mais imediatos e ligados com a nação, com os povos. Tema a missão sagrada de expressar as idéias e desejos destes, de defender suas liberdades,, poupar os seus sacrifícios, servir de barreira a mais forte contra os abusos e invasões do poder, em suma, de substituir na Assembléia Geral a presença dessas frações sociais e da nação inteira cumpre pois que sejam escolhidos e eleitos por aqueles que lhes cometem tão importante mandato, cumpre que dependam só e unicamente daqueles de cujas idéias, necessidades e interesses, de cujo bem ser e progresso têm o destino de ser órgãos imediatos e fiéis. (SÃO VICENTE, 2002, p. 112)

Portanto, apesar do silêncio (e concordância tácita) sobre a escravidão (art. 94, II), apesar da manutenção do padroado (art. 102, II e XIV) et cetera, a Constituição de 1824 estava (formalmente) em plena sintonia com os baluartes liberais do século XIX, como vangloria LIMA:

A monarquia no Brasil achava-se estreitamente ligada ao sistema parlamentar e foi, até, no século XIX, sem falar na Inglaterra, alma mater do regime representativo e não obstante defeitos procedentes das deficiências políticas do meio, uma das expressões mais legítimas e pode mesmo dizer-se mais felizes. (LIMA, 1962, p. 371)

A competência tributária, portanto, seria o poder delegado pela Constituição para que órgãos do Estado pudessem, mediante Lei, instituir tributos. O exercício de tal competência, em última análise, pressupõe que aquele órgão teria, também, atribuição legiferante, já que o tributo deveria ser instituído mediante Lei em sentido formal (AMARO, 2005, p. 93):

Após a Independência constitui-se, no Brasil, o estado fiscal. A principal característica deste estado consiste em um “novo perfil da receita pública, que passou a se fundar nos empréstimos, autorizados e garantidos pelo legislativo, e principalmente nos tributos” em vez de estar consubstanciada nos ingressos originários do patrimônio do príncipe. Além disso, o tributo deixa de ser cobrado transitoriamente, vinculado a uma determinada necessidade conjuntural (ainda que, às vezes, continuasse sendo cobrado mesmo quando não existia mais necessidade, como se verificou no caso de dotes nupciais), para ser cobrado permanentemente. (BALTHAZAR, 2005, p.79)

A Lei (em sentido formal) é espécie legislativa que, por meio de determinado processo realizado pelos representantes políticos (art. 52 usque art. 70 da Constituição de 1824), a vontade do Estado fica cristalizada. A Lei, portanto, seria um instrumento de inserção, no ordenamento jurídico, daquelas normas que o Estado entende por criar, após a observância de determinado procedimento.

Em outras palavras, a lei é fruto da vontade popular, que, por meio de determinado procedimento, e concretiza as decisões políticas tomadas pelos mandatários do povo (deputados, senadores etc.), inserindo novas normas no ordenamento jurídico, permitindo que o povo se governe.

2.3 A COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA NO IMPÉRIO DO BRASIL

2.3.1 A CONCENTRAÇÃO DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

Como exposto, a Constituição de 1824 instituiu um Estado Unitário, em que as províncias não gozavam de autonomia, não participavam do exercício do poder político, o qual estava concentrado no ente central, que representava a Nação.

Se não existia repartição deste poder, sendo as Províncias mera extensão do ente político central, é evidente que não faria sentido que o legislador constituinte as dotasse de parcela do poder de tributar.

De fato, os Conselhos Gerais, que eram órgãos colegiados de deliberação sobre assuntos provinciais (art. 71 da Constituição de 1824), foram expressamente proibidos de instituir tributos (ELLIS, 1995, p.64):

Art. 83. Não se podem propôr, nem deliberar nestes Conselhos Projectos.

I. Sobre interesses geraes da Nação.

II. Sobre quaesquer ajustes de umas com outras Provincias.

III. Sobre imposições, cuja iniciativa é da competencia particular da Camara dos Deputados.

IV. Sobre execução de Leis, devendo porém dirigir a esse respeito representações motivadas á Assembléa Geral, e ao Poder Executivo conjunctamente.

Somente a Câmara dos Deputados detinha a atribuição privativa para iniciar os debates sobre a instituição de tributos, na forma do art. 36, I, da Charta imperial, logo, nenhum outro órgão estatal (central ou provincial) poderia iniciar o processo legislativo para a criação da lei tributária.


Note-se que a deliberação e a aprovação de uma lei (inclusive a tributária) era da atribuição da Assembléia Geral (arts. 13 e 15, VIII, da Constituição imperial), a qual era composta pela Câmara dos Deputados e pelo Senado (art. 14, da Constituição imperial).

Apesar de a atribuição para instituir a Lei tributária residir na Assembléia Geral, o exercício da iniciativa para apreciação de propostas de criação de lei tributária partia, necessariamente, da Câmara dos Deputados.

O Poder Legislativo, consoante a Charta Magna imperial, era delegado à Assembléia Geral, com a sanção do Imperador (art. 13 da Constituição imperial), isto é, o Imperador participava do exercício deste Poder, como se infere da interpretação dos arts. 64 a 70 da Constituição imperial. (SÃO VICENTE, 2002, p.111)

2.3.2 PROBLEMAS DECORRENTES DA CONCENTRAÇÃO DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

Tendo em vista a concentração da competência tributária no Ente central, as Províncias ficaram na dependência de decisões políticas de repasses do tesouro público, algo que não ocorria com freqüência, tendo em vista o déficit fiscal crônico que assolava o governo imperial (LIMA, 1962, p.452) e que praticamente impedia a realização de significativas transferências.

Ademais, como exposto, o Império do Brasil recepcionou a legislação tributária lusitana e as Províncias, tendo em vista a penúria fiscal crônica, além de continuarem a cobrar tributos antigos, em flagrante agressão à Charta Magna, instituíram, dissimuladamente, novos tributos, inclusive sobre as mesmas hipóteses de incidência de tributos gerais (isto é, instituídos pelo ente central) (BALTHAZAR, 2005, p.82): “A Constituição de 1824 não resolveu o problema de competências tributárias. Alguns impostos eram cobrados várias vezes sobre o mesmo gênero.” (BALTHAZAR, 2005, p.81)

A situação se agravou a ponto que, em 1835, o Ministro da Fazenda Miguel Calmon du Pin e Almeida, por meio da Circular, de 17 de dezembro de 1827 (decisão nº 126), veio a exigir que as Juntas de arrecadação, nas províncias, elaborassem uma lista completa e circunstanciada de todos os “tributos e impostos”, com a indicação da denominação, da data da criação, do ato normativo que o instituiu, do valor arrecadado líquido (nos últimos três anos), bem como a indicação da despesa pública e do estado atual da dívida ativa da Nação, naquela Província.

Dois dias depois, por meio da Circular, de 19 de dezembro de 1827 (decisão nº 129), o mesmo Ministro da Fazenda exigiu que os presidentes das províncias informassem, minuciosamente os impostos “mais gravosos aos contribuintes e por isso mais nocivos ao desenvolvimento da riqueza pública”, de modo a ser possível determinar quais poderiam ser arrecadados diretamente pela Fazenda pública e quais poderiam ser arrematados por contratos. Requereu também informações sobre eventuais abusos quando da cobrança e fiscalização dos tributos e como corrigir estes excessos, tudo isto a fim de diminuir as despesas e aumentar as receitas.

Com o advento da primeira Lei orçamentária brasileira, a Lei de 14 de novembro de 1827, buscou-se organizar a precária relação entre despesas e receitas.

Apesar desta lei expressamente se referir ao Tesouro público da Corte e da Província do Rio de Janeiro, ela também conferia parâmetros para as demais províncias.

Note-se que as províncias deveriam concorrer para custear as despesas gerais, sendo que seus eventuais saldos existentes deveriam servir para o financiamento do governo central (art. 4º), tendo em vista o déficit público existente (art. 5º). Foram mantidos em vigor, para o exercício de 1828, todos os tributos que estavam sendo exigidos (art. 6º).

2.3.3 O ATO ADICIONAL DE 1834: O SURGIMENTO DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA PROVINCIAL E A GUERRA FISCAL

2.3.3.1 O ATO ADICIONAL DE 1834.

O Ato Adicional de 1834, a Lei nº 16, de 12 de agosto de 1834, transformou os Conselhos Gerais em Assembléias Legislativas (art. 1º) e delegou a estes órgãos diversas competências legislativas (art. 10), dentre elas as de fixar as “despesas municipais e provinciais e os impostos para elas necessários, contanto que não prejudiquem as imposições gerais do Estado”.

Recebendo esta competência legislativa, bastante genérica, o legislador, no art. 12, do mesmo Ato Adicional, também estabeleceu outro limite ao exercício do poder de tributar por aqueles órgãos legislativos provinciais: “As Assembléias Provinciais não poderão legislar sobre impostos de importação […]”.

Com o advento deste Ato Adicional ocorreu que as Províncias receberam poderes para instituir quaisquer tributos, desde que não prejudicassem as imposições gerais do Estado e que não se confundissem com os impostos de importação. (SÃO VICENTE, 2002, p.252)

2.3.3.2 INVASÕES DE COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA.

Evidente que estas vedações genéricas não bastavam para impedir os excessos dos legisladores provinciais, que reiteradamente invadiam a competência tributária do ente central:

É que as Assembléias Provinciais, contrariando proibição expressa da lei de 12 de agosto de 1834 (Ato Adicional), continuavam a legislar sobre importação e exportação, bem como sobre outras contribuições […] “A circulação dos produtos da indústria nacional é gravada em algumas Províncias com imposições quase proibitivas; em outras os próprios gêneros que já pagaram direitos de importação são novamente tributados, segundo a sua natureza e qualidade, com o intuito de proteger algumas fábricas estabelecidas nas ditas Províncias”. Impunha-se, assim, uma decisão sobre o assunto, pois, do contrário, não só seria perturbado o sistema fiscal, “como prejudicada profundamente a riqueza pública.” (SÃO VICENTE, 2002, p.252)

Em verdade, ao se dotar às províncias de competência tributária sem se estruturar um sistema tributário nacional, que de modo eficaz impedisse os conflitos no exercício deste poder de tributar, criou-se uma grande guerra fiscal no Império do Brasil, pois as províncias, em busca de novas fontes de receitas, instituíam muitas vezes adicionais aos impostos gerais ou então estabeleciam dissimuladamente impostos de importação ou de exportação (o que era vedado), ou tributavam o comércio interprovincial.

A razão para este fenômeno era, sem dúvidas, a escassez de fontes significativas de receitas provinciais:

Dois anos depois, Sales Tôrres Homem acentuava, também, e igualmente na posição de ministro da Fazenda, as distorções causadas pela exorbitância legislativa das Assembléias Provinciais, em matéria de impostos, com grave reflexo nas atividades do país. Mas esse era, sem dúvida, o resultado, que se agravava com o decorrer do tempo, do excessivo poder de tributar que detinha o governo central, em detrimento das províncias, as quais, na falta de recursos, exigidos pela evolução de sua própria economia, não viam outro meio para obtê-los senão desrespeitar os limites fiscais que lhes haviam sido traçados. (ELLIS, 1995, p.73)


2.3.3.3 CRISE FISCAL

Esta falta de recursos, justificada pela impossibilidade de criação de tributos, que pudessem incidir sobre relevantes fatos econômicos se agrava pelo fato que a sociedade brasileira do século XIX continuava a ter por principais atividades econômicas aquelas relacionadas com a monocultura agrícola, fundada no trabalho escravo, bem como, e a exportação destes produtos primários:

[…] podemos dizer que o Período Imperial se assemelhou ao Período Colonial em três aspectos: a economia do Brasil conservava-se monocultora, agro-exportadora e escravocrata. Outro ponto em comum residiu na importância dada ao imposto de importação, alterado conforme as necessidades e anseios protecionistas da Coroa. (BALTHAZAR, 2005, p.101)

As Províncias, portanto, eram praticamente compelidas a invadir a competência tributária do ente central, em busca de fontes de financiamento, tendo em vista que significativamente muito pouco restava para a incidência de eventuais tributos locais: “Na área provincial, como se viu, os governos locais, premidos pela falta de meios, eram levados a recorrer com freqüência, a impostos que conflitavam, ostensivamente, com sua reduzida competência tributária”. (BALTHAZAR, 2005, p.101).

Este conflito ficava mais evidente quando se tinha em conta que, antes mesmo do advento do Ato Adicional de 1834, por meio de leis ordinárias, o Império discriminou as competências tributárias do ente central e das Províncias, classificando-as em Receitas Gerais e Receitas Provinciais.

2.3.3.4 RECEITAS GERAIS E RECEITAS PROVINCIAIS: A REPARTIÇÃO DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

O conceito de Receita Geral e de Receita Provincial foi inicialmente previsto na Lei nº 58, de 08 de outubro de 1833, que era a lei orçamentária para o exercício financeiro que foi de 1º de julho de 1834 a 30 de junho de 1835.

Inicialmente, como era de praxe nas leis orçamentárias imperiais, determinou-se que todos os impostos que haviam sido instituídos pela lei orçamentária de 24.10.1832 continuariam em vigor naquele exercício financeiro (art. 30, Lei nº 58, de 08 de outubro de 1833).

Por Rendas públicas integrantes da Receita geral (art. 36, da Lei nº 38, de 03 de outubro de 1834), enquanto lei geral não viesse a dispor especificamente sobre o tema, consideravam-se todos as receitas (inclusive os impostos) a que se referiam a Lei nº 58, de 08 de outubro de 1833, bem como os impostos provinciais da Corte e do Município do Rio de Janeiro.

Ou seja, a especificação das receitas gerais era discriminada de forma taxativa, numerus clausus, sendo que na Corte e no Município do Rio de Janeiro havia uma competência tributária cumulativa do ente central (art. 36, §1º, da Lei nº 38, de 03 de outubro de 1834) para cobrar os impostos provinciais, com exceção de alguns impostos que eram de competência da Câmara Municipal do Rio de Janeiro: os arrecadados pela Polícia e os foros anuais decorrentes de terreno de marinha, art. 37, §§1º e 2º, da Lei nº 38, de 03 de outubro de 1834.

As Rendas Provinciais (art. 39 da Lei nº 38, de 03 de outubro de 1834) eram as demais rendas que eram cobrados pelas Províncias e que não eram abarcadas pela competência tributária do ente central, passando a pertencer o produto da arrecadação à Receita Provincial, sendo possível a sua alteração pelas respectivas Assembléias Legislativas.

Ressalte-se que antes mesmos das alterações na competência tributária instituídas pelo Ato Adicional de 1834, a Lei orçamentária nº 58, de 08 de outubro de 1933 já fazia referência expressa ao poder de tributar das Províncias (art. 35), isto é, todos os impostos não inclusos dentro do conceito de Receita Geral, sendo permitido que os Conselhos Gerias (das províncias) fixassem o orçamento local.

A partir da Lei orçamentária nº 99, de 31 de outubro de 1835, que fixava as despesas e receitas para o exercício financeiro compreendido entre 1º de julho de 1936 e 30 de junho de 1937, ficou melhor delineado a amplitude das receitas gerais (art. 11). Por este diploma legislativo, as províncias recebiam uma espécie de competência tributária residual, que deveria ser exercida por sua Assembléia Legislativa (art. 12, da Lei nº 99, de 31 de outubro de 1835):

Ficam pertencendo à Receita Provincial todas as imposições não delineadas nos números do art. 11 antecedente; competindo ás Assembleas Provinciaes legislar sobre a sua arrecadação e altera-las, ou aboli-las, como julgarem conveniente.

O complicador na delimitação das competências tributárias residia no fato de que não existiam normas constitucionais dispondo sobre o tema, ficando ao arbítrio do legislador ordinário, ao elaborar as leis orçamentárias, definir a repartição do poder de tributar e também na existência de um efetivo sistema de controle de constitucionalidade das leis provinciais.

2.3.3.5 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NA CHARTA MAGNA IMPERIAL E A GUERRA FISCAL

Ao contrário das Constituições republicanas que adotaram, na sua evolução, um misto do sistema americano-germânico para o Controle de Constitucionalidade das leis, a ser exercido pelo Judiciário, de forma difusa (por qualquer órgão jurisdicional, a partir de 1891) ou concentrada (pela nossa Corte Suprema, a partir de 1946), a Charta Magna imperial adotou o sistema britânico de controle, isto é, somente o Parlamento, órgão composto por representes populares, poderia realizar a fiscalização dos atos normativos à luz da nossa Constituição. (MENDES, 2007, p. 154 e 983)

Competia à Assembléia Geral velar pela guarda da Constituição, bem como interpretar, suspender ou revogar as Leis (art. 15, IX e X, da Constituição de 1824), pelo fato de que, pelos ensinamentos de SÃO VICENTE:

O art. 15, §9º da Constituição confirma uma atribuição que o direito de fazer as leis por certo importa; ele inclui necessariamente o direito de inspecionar, de examinar se elas são ou não fielmente observadas.

[…]

De todas as leis as que demandam maior inspeção, por isso mesmo que demandam o mais alto respeito, são as leis constitucionais, pois que são o fundamento de todas as outras e da nossa existência e sociedade política. São os títulos dos direitos dos poderes políticos, e não são só títulos de seus direitos, mas também de suas obrigações, não são só brasões de autoridades, são também garantias dos cidadãos; ligam o súdito e o poder; é por isso que a Constituição ordena que a Assembléia Geral que vele na guarda de seus preceitos. (SÃO VICENTE, 2002, p. 168)

Competia também à Assembléia Geral controlar os atos do Poder Executivo, limitando os seus poderes:

A principal vigilância que a Assembléia Geral deve exercer é que o poder executivo se encerre em sua órbita, que não invada o território constitucional dos outros poderes, é a primeira condição da pureza do sistema representativo e que decide das outras; que respeite as liberdades individuais.

A exata observância das leis ordinárias, das leis fiscais, cujos abusos são mui opressivos, das que promovem os melhoramentos vitais do país, como suas estradas e colonização, cuja omissão tanto pode afetar a sorte do povo, enfim de todas as normas da sociedade, muito interessada, ao seu desenvolvimento e bem-estar. (SÃO VICENTE, 2002, p. 168)


A Charta Magna de 1824 originariamente, por instituir um estado Unitário, sem delegar aos Conselhos Gerais provinciais competências legislativas, estabeleceu que as resoluções tomadas por estes órgãos deveriam ser remetidas ao Poder Moderador (o Imperador), por meio do Presidente da Província (art. 84, da Constituição imperial), o qual poderia mandar executar ou suspender a eficácia da resolução até ulterior deliberação da Assembléia Geral (arts. 86, 87, 88, e 101, IV, da Constituição imperial).

Se a Assembléia Geral estivesse reunida, deveria ser enviada diretamente para este órgão a resolução do Conselho geral provincial, nos termos do art. 85 (da Constituição imperial), para que fosse a proposta debatida como projeto de lei.

Em outras palavras, como os Conselhos Gerais tinham sua atribuição legislativa limitadíssimas, o risco de haver leis provinciais inconstitucionais também era (em tese) reduzido.

Com o advento do Ato Adicional de 1834 e a criação de Assembléias provinciais dotadas de competência legislativa, inclusive tributária, a situação se modificou, pois o risco de surgimento de leis inconstitucionais provinciais aumentou em muito (art. 10, da Lei nº 16, de 12, de agosto de 1834).

Este risco ficou tão evidente para SÃO VICENTE que ele analisa, de modo enérgico, a natureza de uma lei provincial inconstitucional:

§2º Das leis provinciais ofensiva das Constituição:

235. É evidente que qualquer lei provincial que ofender a constituição, ou porque verse sobre assunto a respeito de que a Assembléia Provincial não tenha faculdade de legislar, ou porque suas disposições por qualquer modo contrariem algum preceito fundamental, as atribuições de outro poder, os direitos ou liberdades individuais ou políticas dos brasileiros, é evidente, dizemos, que tal lei é nula, que não passa de um excesso ou abuso de autoridade.

Um ato tal é uma espécie de rebelião da autoridade provincial contra seu próprio título de poder. A própria A própria Assembléia Geral não tem direito para tanto, as Assembléias Provinciais não podem, pois, pretendê-lo. No caso de se dar tal abuso ele deve ser desde logo cassado. (SÃO VICENTE, 2002, p.251)

Como se daria esta cassação da lei provincial inconstitucional?

O art. 20, do Ato Adicional de 1834 (que reformou a Constituição imperial) atribuiu à Assembléia Geral poderes para revogar apenas as leis provinciais que ofendessem a Constituição, os impostos gerais, os direitos de outras províncias ou os tratados.

Entretanto, esta revogação não era automática, dependendo de expressa prática de ato pelo Poder legislativo (art. 8º da Lei nº 105, de 12 de maio de 1840 (Lei de Interpretação do Ato Adicional de 1834)).

A Lei nº 105, de 12 de maio de 1840 (Lei de Interpretação do Ato Adicional de 1834), estabelecia, no seu art. 10, §8º, a possibilidade de o Presidente provincial vetar (não sancionar) lei aprovada pela Assembléia Legislativa, por inconstitucionalidade (art. 7º). (SÃO VICENTE, 2002, p.258)

O problema envolvendo esta forma de controle de constitucionalidade era manifesta: a revogação (ou suspensão da eficácia) de uma Lei provincial, pela Assembléia Geral, necessitava de articulação política para que resultasse em deliberação no legislativo nacional, como ocorreu com o imposto de consumo (de giro) instituído pela Assembléia Legislativa pernambucana (1885), em manifesta afronta ao disposto no art. 10, §5º, do Ato Adicional de 1834. O Governo imperial preferiu manter-se inerte, não comprando esta briga, tendo em vista que a existência destas espécies de imposto provinciais era um “mal menor”: o Poder Executivo não desejava intervir para não gerar conflito com as Assembléias Provinciais. (MELLO, 1999, p.277-278)

Diante deste deficiente sistema de controle de constitucionalidade, o estudo dos limites ao poder de tributar ganha um realce maior.

3 LIMITES AO PODER DE TRIBUTAR

À luz do constitucionalismo, o poder de tributar, como qualquer outra forma de poder, tem como seu titular o próprio Povo, que o delega, pela Constituição a órgãos do Estado.

Evidente que o Povo não delega o poder de tributar de forma absoluta, ao contrário, limita o exercício destes poderes a fim de proteger os direitos fundamentais à liberdade e ao patrimônio.

Neste momento, busca-se estudar quais os limites ao poder de tributar que existiam no Direito do Império do Brasil.

3.1 LEGALIDADE

Não existia, no art. 179, da Constituição do Império, uma previsão explícita de que os tributos apenas poderiam ser instituídos por meio lei, em sentido formal.

Entretanto, facilmente se extrai este princípio da leitura da Constituição de 1824: estava assegurado, como direito fundamental dos cidadãos, que ninguém está obrigado a fazer ou a deixar de fazer algo senão em virtude lei (art. 179, I, da Constituição de 1824) e é que seria assegurado, a todos, o direito de possuir patrimônio (art. 179, XXII, da Constituição de 1824).

Esta proclamação do império da Lei também se percebe quando se está diante da criação de tributos.

Nos termos da Constituição do Império, a atribuição privativa para se iniciar o processo legislativo para criação de tributos, nos termos do art. 36, I, era da Câmara dos Deputados, cujos representantes eram eleitos (para mandato provisório) pelo voto dos cidadãos habilitados (art. 35 e 90 da Constituição de 1824). Entretanto, a criação da Lei deveria se dar após procedimento que previa debate e deliberação em ambas as Casas do Poder Legislativo (arts. 55 e 60, da Constituição de 1824), com posterior sanção do Imperador, no exercício do Poder Moderador (art. 101, III, da Constituição de 1824).

Portanto, para a criação de tributos, nos termos da Constituição de 1824, exigia-se Lei, em sentido formal.

3.1.1 LEIS ORÇAMENTÁRIAS

Uma prática muito comum, durante o Império do Brasil, a partir da Lei orçamentária nº 58, de 08 de outubro de 1833, era a descrição e a possibilidade de instituição de tributos por meio das leis orçamentárias que iriam vigorar no exercício fiscal seguinte.

Nas próprias leis orçamentárias vinha a descrição dos tributos existentes e, em alguns casos, a instituição de outros ou a alteração das alíquotas dos tributos existentes.


3.1.2 TRATADOS INTERNACIONAIS

Os tratados internacionais podem ser considerados como o calcanhar de Aquiles do 1º Reinado e merecem um estudo mais detalhado.

Nos termos do art. 102, VII e VIII, da Constituição de 1824, competia ao Poder Executivo entabular negociações co


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Petição agravo 03 01
Decisão negando provimento ao agravo 73 01
Agravo SINPROFAZ 76 01
Acórdão que não conheceu o agravo 82 01
Embargos de declaração SINPROFAZ 90 01
Acórdão nos embargos de declaração 98 01
Embargos de declaração SINPROFAZ 110 01
Acórdão nos embargos de declaração 134 01
Certidão de trânsito e remessa à origem 140 01

Última folha: 14

OBJETO: Seja condenada a União ao pagamento de indenização aos Procuradores da Fazenda Nacional filiados ao sindicato autor, no montante equivalente à diferença entre o que deveria ter sido pago pela União, caso tivesse realizado a revisão geral anual com base em índice oficial de inflação, e o que foi efetivamente recebido mês a mês pelos servidores, incluídos os reflexos sobre o 13° salário, férias e sobre o adicional de 1/3 de férias, devendo incidir sobre esses valores juros de mora e correção monetária até a data do efetivo pagamento;


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OBJETO: Seja condenada a União ao pagamento de indenização aos Procuradores da Fazenda Nacional filiados ao sindicato autor, no montante equivalente à diferença entre o que deveria ter sido pago pela União, caso tivesse realizado a revisão geral anual com base em índice oficial de inflação, e o que foi efetivamente recebido mês a mês pelos servidores, incluídos os reflexos sobre o 13° salário, férias e sobre o adicional de 1/3 de férias, devendo incidir sobre esses valores juros de mora e correção monetária até a data do efetivo pagamento;


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Decisão 84 01
Pedido de Reconsideração 88 01
Decisão 106 01

Última folha: 119

OBJETO/PEDIDO: Ação ordinária para declarar o direito a 60 dias de férias anuais, com respectivo pagamento do adicional de férias de 1/3, aos procuradores da Fazenda Nacional filiados ao Sindicato a partir de 20/12/2006.


Titularidade dos membros da Advocacia-Geral da União aos honorários advocatícios de sucumbência


Os honorários advocatícios de sucumbência são compatíveis com regime de subsídio, e são assegurados pela Lei n.º 8.906/94 aos membros da Advocacia-Geral da União.


Resumo: O presente trabalho tem como objetivo fornecer argumentos jurídicos aptos a justificar a titularidade dos membros da Advocacia-Geral da União aos honorários advocatícios de sucumbência, bem como criticar o entendimento firmado no Parecer GQ – 24.

Palavras-chave: Honorários advocatícios de sucumbência. Membros da Advocacia-Geral da União. Titularidade.

Abstract: Union, by law and in compliance with the principle of decentralization in the Constitution, is not qualified to perform actions directly under block funding of the Brazilian Public Health System (SUS) called attention to secondary and tertiary care outpatient and inpatient. Nevertheless, it is increasing the number of court decisions that impose to Union an obligation to perform these actions. It was demonstrated, through analysis of current case law, as judicial decisions disrupt the way the SUS is structured, with respect to the actions planned for the mentioned block funding. On the other hand, it was explained as the Judiciary, to consider the principle of decentralization, in its decisions, can become an ally in implementing the system in order to ensure achievement, more effective health actions in the block care of ambulatory and tertiary care hospitals.

Keywords: Brazilian Public Health System (SUS). Principle of Decentralization. Block Funding Attention of Middle and High Complexity Hospital Outpatient. Public Policy. Lawsuits

Introdução

O objeto da presente estudo reside no exame da titularidade dos membros da Advocacia-Geral da União aos honorários advocatícios de sucumbência nas causas em que a Fazenda Pública se sagre vencedora.

I – Da ausência de suspeição ou impedimento.

De início, cumpre analisar eventual suspeição ou impedimento dos Advogados da União no exame de questões que se encontram umbilicalmente relacionados com o interesse da Instituição.

A Advocacia-Geral da União encontra assento no art. 131 da Constituição Federal, que assim dispõe:

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.

A referida norma está inserida na segunda sessão do Capítulo IV do Titulo IV da Constituição Federal, com a seguinte denominação: “Das Funções Essenciais à Justiça” . Infere-se, assim, que a Advocacia-Geral da União é uma Instituição que exerce, segundo o texto constitucional, “funções essenciais à justiça”. A propósito, convém transcrever as fecundas lições do eminente Uadi Lammêgo Bulos1 sobre a matéria:

Por isso, o Judiciário só funciona por provocação, ou seja, se o agente exigir que ele atue, donde resulte a importância dos protagonistas da dinâmica processual, titulares das funções essenciais à Justiça.

A Carta Magna os enumerou, taxativamente:

  • Ministério Público (arts. 127 a 130);
  • Advocacia Pública (arts. 131 e 132);
  • Profissional da Advocacia (art. 133); e
  • Defensoria Pública (arts. 134 e 135).

Todos esses organismos desencadeadores da atividade jurisdicional atuam por meio de seus agentes públicos ou privados, isto é, promotores, procuradores, advogados e defensores públicos.

Dessa maneira, a inércia da jurisdição é compensada pelo dinamismo dos protagonista das funções essenciais à Justiça.

Em verdade, o papel constitucional dos promotores, procuradores, advogados e defensores públicos é relevantíssimo, porque, de modo genérico, compete-lhes agir em defesa dos interesses do Estado-comunidade, e não do Estado-pessoa.

O arquétipo prefigurado na Constituição da República distancia-os da caricatura usual de que ocupam posição de superioridade se comparados aos cidadãos comuns. Ao invés, encontram limites ao exercício de suas atribuições, pois quem tem o poder e a força do Estado não pode exercer em benefício próprio a autoridade que lhe foi conferida.

A Advocacia-Geral da União, como função essencial à Justiça, tem a atribuição privativa de representar judicial e extrajudicialmente a União, bem como exercer as atividades de consultoria e assessoramento do Poder Executivo. Ao examinar a questão, o Pleno do Supremo Tribunal Federal não hesitou em reconhecer a referida exclusividade, ao atestar a ilegitimidade da representação judicial do advogado constituído pelo Presidente do Tribunal Regional Federal da 3º Região, no julgamento da RCL 8025, veja-se:

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão plenária, sob a Presidência do Senhor Ministro Gilmar Mendes, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, em julgar preliminarmente, o Tribunal afirmou a ilegitimidade da representação judicial do advogado constituído pelo Presidente do Tribunal Regional federal da 3ª Região. Em seguida, o Tribunal rejeitou a questão de ordem no sentido de intimar a Advocacia Geral da União para que, querendo, se manifeste nos autos. E no mérito, o Tribunal, por maioria julgou procedente a reclamação, para anular a eleição de Presidente e determinar que outra se realize, nos termos do voto do relator.


Nesse contexto, a Lei Complementar n.º 73/1993 – Lei Orgânica da Advocacia -Geral da União, em seus arts. 2º, II, b e art. 11, inciso III, dispõe, respectivamente:

Art. 2º A Advocacia-Geral da União compreende:

II – órgãos de execução

b) a Consultoria da União, as Consultorias Jurídicas dos Ministérios, da Secretaria-Geral e das demais Secretarias da presidência da república e do Estado-Maior das Forças Armadas;

Art. 11. Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:

III – fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos a ser uniformemente seguida em suas áreas de atuação e coordenação quando não houver orientação normativa do Advogado-Geral da União;

Da leitura das normas acima reproduzidas, torna-se possível concluir que a Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, como órgão setorial da Advocacia-Geral da União, tem a atribuição de, exclusivamente, exercer assessoramento jurídico da sua Pasta.

Feitos esses esclarecimento, convém agora analisar os deveres dos Advogados da União, com previsão na já mencionada Lei Complementar e na Lei n.º 8.112/90, que assim prescreve:

. Lei Complementar n.º 93/1993:

Art. 29. É defeso aos membros efetivos da Advocacia-Geral da União exercer suas funções em processo judicial ou administrativo:

I – em que sejam parte;

II – em que hajam atuado como advogado de qualquer das partes;

III – em que seja interessado parente consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o0 segundo grau, bem como cônjuge ou companheiro;

IV – nas hipóteses da legislação processual.

Art. 30. Os membros efetivos da Advocacia-Geral da União devem dar-se por impedidos:

I – quando hajam proferido parecer favorável à pretensão deduzida em juízo pela parte adversa;

II – nas hipóteses da legislação processual.

. Lei n.º 8.112/90:

Art. 116. São deveres do servidor:

I – exercer com zelo e dedicação as atribuições do cargo;

II – ser leal às instituições a que servir;

Art. 117. Ao servidor é proibido:

IX – valer-se co cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública;

. Lei n.º 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil:

Art. 134. É defeso ao juiz exercer as suas funções no processo contencioso ou voluntário:

I – de que for parte;

II – quando for órgão de direção ou de administração de pessoa jurídica, parte na causa.

Art. 135. Reputa-se fundada a suspeição de parcialidade do juiz, quando:

V – interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes.

À primeira vista, poder-se-ia alegar a suspeição ou impedimento de todos Advogados da União no exame da presente matéria. Este, contudo, não é o melhor entendimento. As normas infraconstitucionais, como trivialmente sabido, devem ser interpretadas à luz do texto constitucional que, como visto, reserva à Advocacia-Geral da União a função de exercer, exclusivamente, o assessoramento jurídico do Poder Executivo. Aplicam-se aqui os princípios que norteiam a interpretação constitucional, dentre os quais se destacam: o da máxima efetividade e o da razoabilidade.

O primeiro impõe que à norma constitucional, sujeita à atividade hermenêutica, deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe conceda, sendo vedada a interpretação que lhe suprima ou diminua a finalidade. Já o segundo indica que a validade dos atos emanados do poder público é aferida com fundamento em três máximas: adequação, necessidade e proporcionalidade. A adequação designa a correlação lógica entre motivos, meios e fins, de maneira que, tendo em vista determinados motivos, devem ser providos meios, para a consecução de certos fins. A necessidade ou exigibilidade denota a intervenção mínima, isto é, inexistência de meios menos gravoso para a obtenção do fim pretendido. Já a proporcionalidade denomina a ponderação entre o encargo imposto e o benefício trazido2.


Nesse contexto, o constituinte originário, ao conferir à Advocacia-Geral da União a exclusividade do assessoramento jurídico, bem como incluí-la no rol das “funções essenciais à justiça”, não previu qualquer exceção capaz de afastar a sua atuação, de sorte que não seria razoável que a Instituição deixasse de examinar a constitucionalidade e regularidade dos projetos de atos normativos e consultas de seu interesse.

Em reforço à tese até aqui desenvolvida, não se pode olvidar que, quando o constituinte originário exigiu a citação prévia do Advogado-Geral da União nas causas em que o Supremo Tribunal Federal vier apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, para defender o texto ou ato impugnado, não fez qualquer restrição em relação à sua atuação. Assim, ainda que a eventual impugnação seja de norma referente à Instituição, a sua participação se faz necessária3.

Mas não é só. Em última análise, se fosse admitida o afastamento dos Advogados da União para exame de matéria dessa natureza, para que estranhos à carreira a realizassem, além de ferir de morte o art. 133 da Constituição Federal, estar-se-ia dando ensejo ao desvio de função, prática que destoa dos princípios da legalidade e moralidade, que norteiam a atuação da Administração, de tal modo que os atos por eles praticados estariam eivados do vício de nulidade.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não destoa desse entendimento, consoante se pode verificar da leitura da ementa abaixo transcrita:

E M E N T A: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) – ASSESSOR JURÍDICO – CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO – FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO – USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS – PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO – MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. – O desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em concurso público de provas e títulos. (ADI 881 MC/ES, Rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJ 25.04.97.)

Como se pode observar, a exclusividade das atribuições reservadas pelo texto constitucional à Advocacia-Geral da União, para assessoramento jurídico do Poder Executivo, impõe que todas as consultas jurídicas sejam por ela examinadas, inclusive as referentes à própria Instituição.

II – Questão preliminar: Honorários e Subsídio.

Antes de se adentrar no exame do direito dos membros da Advocacia-Geral da União aos honorários de sucumbência, afigura-se indispensável a análise de uma questão preliminar, qual seja, a sua compatibilidade com o regime de subsídio.

O vocábulo subsídio foi inserido na Constituição Federal pela Emenda da Reforma Administrativa (Emenda Constitucional n.º 19/98), que introduziu o § 4º no art. 39, in verbis:

§ 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI.

A referida Emenda também alterou o art. 135 da Constituição Federal, que passou a vigorar com a seguinte redação:

Art. 135. Os servidores integrantes das carreiras disciplinadas nas Seções II e III deste Capítulo serão remunerados na forma do art. 39, § 4º.

Como se vê, com o advento da Emenda Constitucional nº 19/98, a carreira da Advocacia-Geral da União passou a ter uma nova disciplina remuneratória, que veio a se materializar com o advento da Medida Provisória nº 305, de 29.06.2006, convertida na Lei n.º 11.358, de 19 de outubro de 2006 .

O subsídio, pois, caracteriza-se como nova modalidade de retribuição pecuniária paga a certos agentes públicos, em parcela única, sendo vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória. Esse rigor, entretanto, é relativizado por outras normas constitucionais, que não foram atingidas pela Emenda, como é o caso, por exemplo, do art. 39, § 3º.

Outro não é o entendimento da eminente Maria Sylvia Zanella Di Pietro4 que, ao examinar a questão, assinala:

No entanto, embora o dispositivo fale em parcela única, a intenção do legislador fica parcialmente frustrada em decorrência de outros dispositivos da própria Constituição, que não foram atingidos pela Emenda. Com efeito, mantém-se, no art. 39, § 3º, a norma que manda aplicar aos ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX. Com isto, o servidor que ocupe cargo público (o que exclui os que exercem mandato eletivo e os que ocupam emprego público, já abrangidos pelo art. 7º) fará jus a: décimo terceiro salário, adicional noturno, salário-família, remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo a 50% à do normal, adicional de férias.


Como se pode observar, a regra do art. 39, § 4º, da Constituição Federal não é absoluta. Por outro lado, sobreleva anotar que o seu alcance se limita aos valores pagos pela administração pública. Os honorários advocatícios de sucumbência, diferentemente das vantagens ali mencionadas, são verbas de natureza particular, eis que são pagos pela parte vencida ao advogado da parte vencedora, ou seja, não saem dos cofres públicos. Nessa linha, são os ensinamentos de Ivan Barbosa Rigolin5:

V – Ao que parece viceja, cá e lá, o entendimento de que os honorários de sucumbência constituem algo como “benefício aos servidores públicos”, pagos pelo poder Público, e talvez aí resida toda a origem do impasse que pode estar acontecendo.

Honorários advocatícios de sucumbência jamais foram benefício a servidor público, porque não são pagos com dinheiro público, não saem dos cofres públicos, mas do bolso dos derrotados em ações judiciais contra o poder Público. Não têm origem em recursos públicos, mas particulares – e muitos particulares. Quem os pagou já o sentiu.

Como se isso não bastasse, deve-se destacar que, se a intenção do constituinte fosse a de proibir o advogado público, o que se admite apenas por hipótese, teria a consagrado expressamente, com o fez em outra passagem do texto constitucional, como é o caso do art. 128, II, a da Constituição Federal, in verbis:

Art. 128. O Ministério Público abrange:

II – as seguintes vedações:

a) receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais;

Ora, não foi esse o tratamento dispensado à Advocacia-Geral da União, não havendo qualquer restrição a respeito. A Lei Complementar n.º 73/1993, a seu turno, não traz qualquer proibição dessa natureza.

Registre-se, por relevante, que o texto original da Lei Complementar n.º 73/93 aprovado pelo Congresso Nacional e encaminhado à sanção presidencial, previa em seu art. 65 a vedação ao recebimento dos honorários6. Contudo, a aludida norma foi vetada pelo Presidente da República por interesse público, a fim de garantir a premiação do êxito, nos seguintes termos:

Quanto ao pro labore, percebido pelos Procuradores da Fazenda Nacional, por força da lei 7711 de 22 de dezembro de 1988, limita-se à sucumbência dos devedores vencidos nas execuções fiscais (honorários advocatícios). Desses honorários, 50 % destinam-se à implementação e modernização das procuradorias da Fazenda Nacional (informatização, custeio de taxas e custos de execuções fiscais, despesas de diligências, pro labore de peritos técnicos, avaliador e contadores judiciais, além de despesas de penhora, remoção e depósito de bens). Esse sistema de incentivo tem funcionado com múltiplo êxito para os cofres da União, sendo o principal fator de crescimento da arrecadação, apesar do decrescente números de Procuradores da Fazenda nacional em todo País7.

Resta, portanto, muito claro que o regime de subsídio não constitui óbice ao pagamento dos honorários de sucumbência aos membros da Advocacia-Geral da União, cuja titularidade restará demonstrada a seguir.

III – Lei n.º 8.906/94 – Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil.

A título de contextualização, cumpre realizar um breve histórico sobre a evolução legislativa dos honorários de sucumbência. De início, a Lei n.º 4.215/63, em seu art. 998, os previu. Em seguida, o Código de Processo Civil – Lei n.º 6.355/1973, no art. 209, também os consagrou. Nesse período, entretanto, tais honorários, a princípio, eram da titularidade da parte e não do advogado, bem como tinham natureza eminentemente indenizatória.

Em 1994, sobreveio a Lei n.º 8.906 – Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil – EOAB, que trouxe profunda alterações à matéria, modificando sobremaneira o regime até então vigente. Os honorários deixaram de ser meramente indenizatórios, para assumir status de remuneração. Nesse contexto, esclarecedores os comentários de Yussef Said Cahali10:

A Lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia e Ordem dos Advogados do Brasil), embora contendo dispositivos notoriamente polêmicos, teve o mérito contudo de enunciar claramente a quem pertencem os honorários advocatícios da sucumbência. Assim, ao estabelecer, em seu art. 23, que os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor”, o novel legislador buscou superar a aparente antinomia existente entre o artigo 20 do Código de Processo Civil e o artigo 99 do anterior Estatuto da Ordem dos Advogados (Lei nº 4.215, de 27 de abril de 1963), geradora de um inconciliável dissídio doutrinário e jurisprudencial.

Uma das grandes inovações trazidas pelo referido diploma legal, indubitavelmente, foi a de reservar ao advogado, em seu Capítulo VI, a titularidade dos honorários de sucumbência. A propósito, não é desnecessário afirmar que os honorários têm natureza alimentar, consoante a jurisprudência dos Tribunais Superiores. Vale, por todos, transcrever ementa do Supremo Tribunal Federal nesse sentido:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE INOVAÇÃO DE FUNDAMENTO EM AGRAVO REGIMENTAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA ALIMENTAR. AGRAVO IMPROVIDO. I – É incabível a inovação de fundamento em agravo regimental, porquanto a matéria arguida não foi objeto de recurso extraordinário. II – O acórdão recorrido encontra-se em harmonia com a jurisprudência da Corte no sentido de que os honorários advocatícios têm natureza alimentar. III – Agravo regimental improvido. (AI 732358, Rel. Min. Ricardo Lewandoswski, Primeira Turma, DJ 21.08.2009. Destacou-se)


Posteriormente, foi publicada a Lei n.º 9.527/97 que, dentre outras providências, asseverou que as normas previstas no Capítulo V do Título I da Lei n.º 8.906/94 não se aplicam à Administração Pública direta da União, bem como às autarquias, às fundações instituídas pelo Poder público, às empresas públicas e às sociedades de economia mista, consoante se pode verificar da leitura do seu art. 4º, in verbis:

Art. 4º As disposições constantes do Capítulo V, Título I, da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, não se aplicam à Administração Pública direta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como às autarquias, às fundações instituídas pelo Poder Público, às empresas públicas e às sociedades de economia mista.

Em razão da sucessão de leis no tempo tratando da mesma matéria, deve-se destacar que não merecer prosperar o argumento segundo o qual, em razão do disposto no art. 20 do Código de Processo Civil, os honorários de sucumbência pertenceriam à parte e não ao advogado, eis que a Lei n.º 8.906/94, por ser posterior, a revogou tacitamente. Essa é a inteligência do art. 2º, I, do Decreto-Lei n.º 4.65711, de 4 de setembro de 1942 – Lei de introdução às normas do Direito Brasileiro.

Outro não é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. HONORÁRIOS. INTERPRETAÇÃO ANTERIOR À LEI N. 8.906/94.TITULARIDADE DA PARTE VENCEDORA.

1. Verifica-se que o acórdão recorrido analisou todas as questões atinentes à lide, só que de forma contrária aos interesses da parte. Logo, não padece de vícios de omissão, contradição ou obscuridade, a justificar sua anulação por esta Corte. Tese de violação do art. 535 do CPC afastada.

2. A jurisprudência desta Corte Superior é pacífica no sentido de que antes do advento da Lei 8.906/94 (Estatuto da Ordem dosAdvogados do Brasil), a titularidade das verbas recebidas a título de honorários de sucumbência era da parte vencedora e, não, do seu respectivo advogado.

3. Recurso especial provido. (REsp 859944/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJE 19.08.2009)

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. DÉBITO DE NATUREZA ALIMENTÍCIA. ACÓRDÃO DECIDIDO POR FUNDAMENTOS DE ÍNDOLE CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE NA VIA RECURSAL ELEITA. TITULARIDADE, EM PRINCÍPIO, DO ADVOGADO DA PARTE VENCEDORA, PERMITIDA CONVENÇÃO EM SENTIDO CONTRÁRIO. POSSIBILIDADE DA EXPEDIÇÃO DE PRECATÓRIO DISTINTO PARA A VERBA DE SUCUMBÊNCIA. DIREITO AUTÔNOMO DO ADVOGADO.

1. A questão em torno da natureza da verba recebida a título de honorários de sucumbência — se possui ou não caráter alimentício — foi decidida pela Corte de origem por fundamentos de índole eminentemente constitucional, insuscetíveis de apreciação em sede de recurso especial.

2. A análise de matéria constitucional, em sede de recurso especial, é alheia à competência atribuída a esta Superior Corte de Justiça, a teor do disposto no art. 105, III, da Constituição Federal.

3. A Lei 8.906/94 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), ao contrário da legislação anterior que disciplinava a matéria, modificou a titularidade das verbas recebidas a título de honorários de sucumbência, passando-as da parte vencedora para o seu respectivo advogado.

4. Até prova em contrário, os honorários sucumbenciais são devidos ao advogado da parte vencedora, “tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor”, independentemente da juntada de cópia do contrato de prestação de serviços advocatícios.

5. Recurso especial parcialmente provido. (Resp 659293/SP, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJ 24.04.2006)

A questão foi também examinada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.194-4, que teve como objeto, dentre outras normas, o parágrafo único do art. 21 e o parágrafo 3º do art. 24, ambas da Lei n.º 8.906/94. Na oportunidade, por maioria, assinalou-se que o recebimento dos honorários de sucumbência é disponível, de sorte a permitir o ajuste contratual entre o advogado e o cliente sobre as referidas verbas. Calha, por relevante, transcrever passagens do voto do Ministro Maurício Corrêa nesse sentido:

22. Toda argumentação da requerente cai por terra ante o disposto nos artigos 22 e 23 do Estatuto da Advocacia, que, encerrando a discussão acerca da titularidade da verba em face da redação do artigo 20 do CPC, assegurou expressamente que o advogado tem direito aos honorários de sucumbência. Em que pese a constitucionalidade de tais preceitos ter sido objeto também desta ação direta, a questão não pôde ser apreciada em virtude da ilegitimidade ativa da requerente por impertinência temática. Pertencendo a verba honorária ao advogado, não se há de falar em recomposição do conteúdo econômico-patrimonial da parte, criação de obstáculo para o acesso à justiça e, muito menos, em ofensa a direito adquirido da litigante.

23. Ainda que se entenda que os honorários se destinavam a ressarcir a parte vencedora pela despesas havidas com a contratação de profissional de advocacia e nessa perspectiva pertencesse ao litigante, segundo uma das exegeses admitidas do artigo 20 do CPC, restaria clara sua revogação pelos artigos 22 e 23 do superveniente estatuto da OAB (LICC, artigo 2º, § 1º)

Uma vez assentado o direito dos advogados aos honorários de sucumbência, convém agora examinar se eles também se estendem aos membros da Advocacia-Geral da União. Frise-se, por oportuno, que as alterações promovidas pela Lei n.º 9.527/97, mencionadas alhures, referem-se tão somente ao Capítulo V do Título I da Lei n.º 8.906/94, vale dizer, aplicam-se apenas aos advogados empregados. Nessa linha, convém reproduzir as informações prestadas pelo Senado Federal ao Supremo Tribunal Federal, na ADI n.º 3.396 que analisa a constitucionalidade do art. 4º da Lei n.º 9.527/97:


Apesar de submetidos a um mesmo estatuto, no caso, o Estatuto da Advocacia, criado pela Lei n.º 8.906, de 1994, os advogados que ocupam cargo público em órgãos da Administração Direta, Autarquias e Fundações instituídas pelo Poder Público, sujeitam-se a um regime especial de trabalho. Trata-se do Regime Jurídico Único previsto na Lei n.º 8.112, de 1990, e nesta condição estão submetidos a um regime de direitos e deveres específicos, o qual não se confunde com o regime das empresas privadas, este aplicável às empresas públicas e sociedades de economia mista, que normalmente se submetem aos dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.

Paralelamente a isso, não se pode esquecer que a exegese das leis é orientada pelo processo sistemático, porquanto as leis não são conglomerados de normas desconexas entre si. Ao revés, apresentam-se de modo coordenado, em feixes orgânicos, procurando formar unidade de sentido. Os seus elementos mantêm vínculo de inter-relação e interdependência12. Dessarte, os arts. 22 a 26 da Lei n.º 8.906/94, presentes no Capítulo VI, que versam sobre os honorários advocatícios, devem ser interpretados à luz do disposto no art. 3º, § 1º, do mesmo Diploma Legal, in verbis:

Art. 3º O exercício da atividade de advocacia no território brasileiro e a denominação de advogado são privativos dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),

§ 1º Exercem atividade de advocacia, sujeitando-se ao regime desta lei, além do regime próprio a que se subordinem, os integrantes da Advocacia-Geral da União, da Procuradoria da Fazenda Nacional, da Defensoria Pública e das Procuradorias e Consultorias Jurídicas dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas entidades de administração indireta e fundacional. (Destacou-se)

Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência.

§ 1º O advogado, quando indicado para patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço, tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado.

§ 2º Na falta de estipulação ou de acordo, os honorários são fixados por arbitramento judicial, em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão, não podendo ser inferiores aos estabelecidos na tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB.

§ 3º Salvo estipulação em contrário, um terço dos honorários é devido no início do serviço, outro terço até a decisão de primeira instância e o restante no final.

§ 4º Se o advogado fizer juntar aos autos o seu contrato de honorários antes de expedir-se o mandado de levantamento ou precatório, o juiz deve determinar que lhe sejam pagos diretamente, por dedução da quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este provar que já os pagou.

§ 5º O disposto neste artigo não se aplica quando se tratar de mandato outorgado por advogado para defesa em processo oriundo de ato ou omissão praticada no exercício da profissão.

Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.

Sublinhe-se que as normas inseridas no Capítulo VI do Estatuto da Advocacia, em nenhum momento, restringem sua aplicação aos membros da Advocacia-Geral da União. Na atividade hermenêutica, como é cediço, não cabe ao intérprete definir o que o legislador não definiu, nem mesmo acrescer ao texto legal condição nela não existente. Assim, não há razão para se restringir o alcance das normas acima mencionadas.

Como se vê, em homenagem ao método sistemático de interpretação, ressoa inequívoco o direito dos Advogados da União, Procuradores da Fazenda Nacional e Procuradores Federais aos honorários advocatícios de sucumbência nas causas em que a Fazenda Pública se sagre vencedora.

IV – Do Parecer GQ – 24.

Sem embargo das considerações até aqui lançadas, cumpre assinalar que a questão já foi examinada pela Advocacia-Geral da União, por meio do PARECER nº GQ – 24, vinculante, que adotou para os fins do art. 40 e 41 da Lei Complementar nº 73/93, o Anexo PARECER Nº AGU/WM-08-94. Na oportunidade, restou assentado que os arts. 22 a 25 da lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994, não se aplicam aos membros da Instituição, veja-se:

EMENTA: A disciplina do horário de trabalho e da remuneração ínsita à Lei n. 8.906, de 4 de julho de 1994, é específica do advogado, na condição de profissional liberal e empregado, sem incidência na situação funcional dos servidores públicos federais, exercentes de cargos a que sejam pertinentes atribuições jurídicas.

(…)

4. É induvidoso que os servidores dos órgãos da Administração Federal direta, das autarquias e das fundações públicas federais,a cujos cargos correspondam as atividades de advocacia, se submetem ao regime instituído pela Lei 8.906 (cfr. O § 1º do art. 3º), mas são regidos pelas normas estipendiárias e pertinentes às cargas horárias e específicas dos servidores públicos federais.

9. Há que se realçar a prevalência de comando ínsito à Lei Complementar n. 73, de 1993, estratificado no sentido de que a remuneração dos membros da Advocacia-Geral da União se fixa em “lei própria”, condição que se não considera atendida com as normas concernentes ao Estatuto da Advocacia, em comento.

13. A mantença das regras a que são submetidos especificamente os advogados, servidores federais estatutários, decorrente se sua compatibilização coma lei nova, se justifica pelo fato de esse pessoal encontrar-se inserido no contexto do funcionalismo federal, regido por normas editadas unilateralmente pelo Estado, a fim de estabelecer o regramento da relação jurídica que se constitui entre ele e o servidor, de modo a que o Poder Público disponha de um sistema administrativo capaz de atender à sua finalidade, consistente em proporcionar à coletividade maior utilidade pública, essência das realizações da Administração. Face a esse desiderato, é atribuída ao Estado a faculdade de estabelecer e alterar, de forma unilateral, as regalias originárias do funcionalismo, adequando-as às suas peculiaridades e necessidades, inclusive as orçamentárias, mas sem inobservar os comandos constitucionais. Tanto assim é essa especificidade que o art. 61 da Carta insere na competência privativa do Presidemte da República a iniciativa de leis que cuidem sobre aspectos de regime jurídico do servidor público deferal, incluída a remuneração.

14. Essa linha de raciocínio aproveita à inaplicabilidade do regramento dos adicionais de sucumbência aos mesmo servidores: as características dessas normas (arts. 22 a 25 da Lei n. 8.906) indicam o alcance, tão-só, das atividades de advocacia desenvolvidas pelos profissionais liberais e advogados empregados, no que couber. Induzem a essa lição inclusive o aspecto de que os honorários, incluído os de sucumbência, pertencem ao advogado, que pode, de forma autônoma, executar a sentença, nesse particular (art. 23), direito que se não compatibiliza com a isonomia de vencimentos preconizada nos arts. 39, § 1º, e 135 da Constituição. Em relação a esse honorários a que façam jus os advogados empregados, há também disciplina específica no art. 21 do mesmo Diploma Legal, inexistindo a dos servidores estatutários do Estado, cujas peculiaridades também reclamariam normas especiais.

15. O Estatuto da Advocacia se estende aos servidores da área jurídica federal. Porém, por imperativo seu, impõe-se a observância do “regime próprio a que se subordinam” (art. 3º, § 1º), que, via de regra, não prevê esse adicional retributivo. Para contemplar esse pessoal, haveria de ser regulado em lei, em vista do princípio da legalidade esculpido no art. 37 da Constituição.

III

16. O exposto admite se acolha o resultado interpretativo de que os advogados submetidos ao regime jurídico instituído pela Lei n. 8.112, de 1990, continuam sujeitos ao disciplinamento vigente à época da edição do novo Estatuto da Advocacia, no que respeita à carga horária e à remuneração, porquanto não foram alcançados, no particular, pela lei nova.


A referida manifestação fundamenta-se, basicamente, no disposto no parágrafo único do art. 26 da Lei Complementar n.º 73/93, que exige lei própria para fixação do vencimento e remuneração dos membros das carreiras da Advocacia-Geral da União.

O grande problema é que esse argumento poderá trazer graves consequências, especialmente se o utilizarmos para o exame de importantes leis afetas à Advocacia-Geral da União, publicadas nos últimos anos, senão vejamos:

a) O subsídio dos cargos das carreiras da Advocacia-Geral da União foi instituído pela Medida Provisória n.º 305, de 2006, convertida na Lei n.º 11.358, de 19 de outubro de 2006. Sucede, todavia, que os referidos atos normativos não se enquadram no conceito de “lei própria”, eis que disciplinam, a um só tempo, as carreiras de Procurador da Fazenda Nacional, Advogado da União, Procurador Federal, Defensor Público, de Procurador do Banco Central do Brasil, Policial Federal e da reestruturação dos cargos da Carreira de Policial Rodoviário Federal. Em razão disso, indaga-se: estaria a Lei n.º 11.358 violando o disposto no parágrafo único do art. 26 da Lei Complementar n.º 73/93 e, por via reflexa, o art. 131 da Constituição Federal?

b) De igual modo, o último aumento remuneratório das carreiras da Advocacia-Geral da União deu-se, por meio da Medida Provisória n.º 440, de 2008, convertida na Lei n.º 11.890, de 24 de dezembro de 2008. Todavia, assim como o exemplo anterior, as referidas normas não se enquadram no conceito de “lei própria”, uma vez que abrangem inúmeras carreias do Poder Executivo Federal, tratando não só de remuneração, bem como de reestruturação. Pergunta-se: estaria a Lei n.º 11.890, de 24 de dezembro de 2008 contrariando o parágrafo único do art. 26 da Lei Complementar n.º 73/93 e, por via reflexa, o art. 131 da Constituição Federal?

c) Se o parágrafo único do art. 26 da Lei Complementar n.º 73/93 exige que o vencimento e a remuneração das carreiras sejam tratados em “lei própria”, estariam os Advogados Públicos Federais isentos do pagamento da contribuição anual à OAB, prevista no art. 46 da Lei n.º 8.906/1994, porquanto se trata de matéria que, em última análise, encontra-se umbilicalmente relacionada à remuneração e vencimentos dos membros da carreira?

Por outro lado, deve-se destacar que, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.652-6, que examinou a constitucionalidade do parágrafo único do art. 1413 do Código de Processo Civil, o Ministro Relator Maurício Corrêa assinalou, em seu voto, que os advogado públicos sujeitam-se às prerrogativas, direitos e deveres do advogado, estando submetidos à disciplina própria da profissão, nos seguintes termos:

2. Com efeito, seria mesmo um absurdo concluir que o legislador tenha pretendido excluir de ressalva os advogados sujeitos a outros regimes jurídicos, além daquele instituído pelo Estatuto da OAB, como ocorre, por exemplo, com os profissionais da advocacia que a exercem na condição de servidores públicos. Embora submetidos à legislação específica que regula tal exercício, também devem observância ao regime próprio do ente público contratante. Nem por isso, entretanto, deixam de gozar das prerrogativas, direitos e deveres dos advogados, estando sujeitos à disciplina própria da profissão, artigos 3º, § 1º; e 18.

Ora, se os honorários de sucumbência não pertencem aos membros da Advocacia-Geral da União, em razão dos argumentos aduzidos no Parecer GQ – 24, a quem são devidos? À União? Com base em que fundamento legal? A propósito, desconhece-se, s.m.j., qualquer lei que autorize a União a receber tais verbas. Não é preciso gastar rios de tinta para perceber que essa realidade viola, no mínimo, o princípio da legalidade administrativa, previsto no caput do art. 37 da Constituição Federal.

Outro ponto que deve ser levantado é o de que o referido Parecer vinculante foi elaborado sob uma realidade jurídica distinta dos dias atuais, de sorte a não mais tratar a contento as questões afetas à matéria, notadamente se levarmos em consideração que, posteriormente, à sua publicação, consoante já mencionado, sobreveio a Lei n.º 9.527/97 que, dentre outras providências, afastou a incidência das normas presentes no Capítulo V do título I à Adminsitração Pública direta da União, às autarquias, às fundações públicas instituídas pelo Poder Público, às empresas públicas e às sociedades de economia mista, esvaziando, assim, parte do seu conteúdo.

Além disso, foi publicada a Medida Provisória n.º 305, de 2006, convertida na Lei n.º 11.358, de 19 de outubro de 2006, que criou o subsídio dos cargos da carreira da Advocacia-Geral da União, conforme relatado no item 42, a, desta manifestação.

Por derradeiro, mas não menos importante, assinale-se, a título de informação, que os membros de boa parte das Procuradorias dos estados14 e dos municípios recebem honorários de sucumbência.

Por todo o exposto, sugere-se, com fundamento no art. 4º, X, da Lei Complementar n.º 73/93, que o Parecer GQ – 24 seja revisado pela Advocacia-Geral da União.

Conclusão

Ao término dessa exposição, torna-se possível sintetizar algumas das suas proposições mais importantes:

  • as atribuições de assessoramento jurídico ao Poder Executivo Federal são exclusivas da Advocacia-Geral da União. Ainda que as consultas tenham por objeto causas de interesse afetas à própria Instituição, seus membros não poderão se eximir de examiná-las, sob o fundamento de eventual suspeição ou impedimento;
  • Os honorários advocatícios de sucumbência são compatíveis com regime de subsídio;
  • A Lei n.º 8.906/94 confere aos membros da Advocacia-Geral da União o direito aos honorários de sucumbência;
  • Todavia, o Parecer GQ – 24, aprovado pelo Presidente da República, adota entendimento diametralmente oposto, no sentido de que os arts. 22 a 25 da Lei n.º 8.906/94 não se aplicam às carreiras da Advocacia-Geral da União, haja vista que a matéria deveria ser tratada em “lei própria”, em observância ao disposto no parágrafo único do art. 26 da lei Complementar n.º 73/93;
  • A fundamentação utilizada no referido Parecer, s.m.j., dificulta a defesa da constitucionalidade de leis que versam sobre matérias de considerável importância para Instituição. Assim sendo e levando-se em consideração o advento de novas normas sobre a matéria, assim com os questionamentos e informações mencionados alhures, recomenda-se, com fundamento no art. 4, X, da Lei Complementar n.º 73/93, a sua revisão.

Referências bibliográficas.

BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

CAHALI, Yussef Said. Direito Autônomo do Advogado aos Honorários da Sucumbência – Repertório IOB de Jurisprudência – 1ª quinzena de outubro de 1994 – nº 19/94.


MORAES, Guilherme Peña de. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 16ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2003.

RIGOLIN, Ivan Barbosa. Honorários Advocatícios e Pode Público. Boletim de Direito Administrativo: BDA. São Paulo: NDJ, Ano XXII, n.º 3, março de 2006.

Guedes, Jefferson Guarús; Hauschild, Mauro Luciano (Coordenação).Nos limites da história: a construção da Advocacia-Geral da União: livro comemorativo aos 15 anos. Brasília: UNIP, UNAF, 2009.

Sítios Eletrônicos pesquisados:

http://www.stf.jus.br.

http://www.stj.jus.br.

http://www.casacivil.planalto.gov.br.


Notas

  1. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2008. 2ª Ed. P. 1143.
  2. Guilherme Peña de Moraes. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. Pág. 122/123.
  3. Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:
    § 3º Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará previamente, o Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado.
  4. Direito Administrativo. São Paulo: Editora Atlas, 2003. 16ª ed. P.450.
  5. In BDA – Boletim de Direito Administrativo – Março/2006. P. 276.
  6. Art. 65 (VETADO). A lei especial objeto do art. 26 desta Lei Complementar deve disciplinar a remuneração dos integrantes dos órgãos previstos no art. 2º., dos titulares de seus cargos efetivos e de confiança, bem como a dos dirigentes, vedando-lhes a participação na arrecadação de tributos, contribuições sociais e multas, o recebimento de honorários de sucumbência e a percepção de valor pro labore.
  7. Passagem extraída da obra: “Nos Limites da história: a contrução da Advocacia-Geral da União: livro comemorativo aos 15 anos/ Coordenação de Jefferson Garús Guedes e Mauro Luciano Hauschild. Brasília: 2009. Pgs. 75/76.
  8. Art. 99. Se o advogado fizer juntar aos autos, até antes de cumprir-se o mandado de lavramento ou precatório, o seu contrato de honorários, o juiz determinará lhe sejam estes pagos diretamente, por dedução de quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este prover que já os pagou.
    § 1º Tratando-se de honorários fixados na condenação, tem o advogado direito autônomo para executar a sentença nessa parte podendo requerer que o precatório, quando este for necessário, seja, expedido em seu favor.
    § 2º Salvo aquiescência do advogado, o acordo feito pelo seu cliente e a parte contrária não lhe prejudica os honorários, quer os convencionais, quer os concedidos pela sentença.
  9. Art. 20 A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Essa verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria.
  10. Direito Autônomo do Advogado aos Honorários da Sucumbência – Repertório IOB de Jurisprudência – 1ª quinzena de outubro de 1994 – nº 19/94, pp. 376/378.
  11. Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.
    § 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
  12. Uadi Lammêgo Bulos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo, Editora Saraiva, 2008. 2ª Edição. P. 335.
  13. 13 Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participaram do processo:
    Parágrafo único. Ressalvados os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, a violação do disposto no inciso V deste artigo constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição, podendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa; não sendo paga no prazo estabelecido, contado do trânsito em julgado da decisão final da causa, a multa será inscrita sempre como dívida ativa da União ou do Estado.”
    No exame da referida ADI, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade de votos, julgou procedente o pedido formulado na inicial da ação para, sem redução de texto, emprestar à expressão “ressalvados os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB”, interpretação conforme a carta, a abranger advogados do setor privado e do setor público.
  14. É o caso dos estados do Espírito Santo, de São Paulo e Minas Gerais. Poderia estender a lista, mas para não tornar a leitura cansativa, limito-me a tais exemplos.

Autor

Paulo Fernando Feijó Torres Junior

Advogado da União em Brasília (DF).

NBR 6023:2002 ABNT: JUNIOR, Paulo Fernando Feijó Torres. Titularidade dos membros da Advocacia-Geral da União aos honorários advocatícios de sucumbência. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3106, 2 jan. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20765>. Acesso em: 16 jan. 2012.


SINPROFAZ debate interesses dos PFNs com Procuradora-Geral

O SINPROFAZ esteve reunido com a Procuradora-Geral da Fazenda Nacional, Dra. Adriana Queiroz, para tratar de assuntos urgentes e relevantes da carreira.


Desconstruindo o mito da não-incidência do imposto de renda sobre verbas de natureza indenizatória

Autor: Augusto Cesar de Carvalho Leal, Especialista em Direito Público pela Universidade de Brasília – UnB. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE

Veículo: Revista da PGFN, ano 1 número 1, jan/jun. 2011

RESUMO – O objetivo deste trabalho acadêmico é a desconstrução do mito da não-incidência do Imposto de Renda sobre toda e qualquer verba de natureza indenizatória, a partir da demonstração de que tais verbas sujeitam-se a dois regimes jurídicos distintos, o da indenização-reposição e o da indenização-compensação, sendo que, neste último, ocorre claro acréscimo patrimonial, condição necessária e suficiente para a realização do critério material da regra-matriz de incidência daquele tributo. Palavras-chave: Imposto de Renda. Acréscimo Patrimonial. Verbas indenizatórias. Indenização-Reposição. Indenização-Compensação.

INTRODUÇÃO

Evidenciam-se nebulosas a doutrina e a jurisprudência pátrias no que concerne à incidência de imposto de renda sobre verbas de natureza indenizatória.

Nesse diapasão, em geral, seja em sede doutrinária, seja em sede jurisprudencial, apresentam-se pouco consistentes, sob o prisma da coerência científica, os resultados do cotejo entre o critério material da regra-matriz de incidência do imposto de renda e cada uma das infinitas possibilidades de verbas de natureza indenizatória, cada qual com peculiar matiz fático-jurídico.

O que se nota, inicialmente, é a generalizada e irrefletida resistência ao reconhecimento da incidência do imposto de renda sempre que se repute gozar uma específica verba de natureza indenizatória.

Assim, para significativa parte da doutrina e da jurisprudência, basta que uma verba ostente o status de indenizatória para que, na prática, seja, de maneira superficial, colocada sob um manto sagrado completamente intransponível aos efeitos jurídicos da regra-matriz de incidência do imposto de renda, não obstante uma análise jurídica mais profunda demonstre, cabalmente, que pode ou não incidir imposto de renda em parcelas com caráter de indenização.

Elucidando ainda mais o problema estabelecido, é extremamente comum entre os tribunais e os doutrinadores brasileiros a redução da investigação acerca da incidência ou não do imposto de renda à conclusão acerca da natureza indenizatória ou não de uma dada verba.

Ganha corpo, nessa esteira, o lugar-comum de que verbas indenizatórias não sofrem tributação pelo imposto de renda.

Com isso, o critério para a decisão hermenêutica de incidência ou não do imposto de renda passa a ser a natureza indenizatória ou remuneratória da parcela, e não a ocorrência de acréscimo patrimonial, aspecto material da regra-matriz de incidência daquele tributo.

Essa premissa encontra-se tão fortalecida na prática forense contemporânea, e mesmo em parte do meio acadêmico, que, nesses círculos, o processo interpretativo relativo à existência da obrigação tributária concernente ao imposto de renda ignora a verificação da ocorrência do fato gerador do imposto (acréscimo patrimonial) para se limitar à verificação, como condição sine qua non para a tributação, da eventual qualidade nãoindenizatória da parcela.

Eis a emergencial necessidade de sistematização que motiva o presente estudo sobre a incidência do imposto de renda sobre verbas indenizatórias, realizado com o escopo de contribuir para a diminuição da perniciosa confusão na análise da matéria, provocada pela superficialidade com que o tema é frequentemente tratado.

Consigne-se que a falta de profundidade com que, não raramente, o imposto de renda, em seus diversos aspectos, é tratado não passou despercebida pelo Professor Paulo de Barros Carvalho, que afirmou:

quanto ao imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, talvez pela complexidade do seu regime de incidência, ou pelo número às vezes até extravagante dos enunciados prescritivos que integram sua estrutura, a verdade é que a exação tem espantado os especialistas, afastando-os de um contato mais direto e radical com tão nobre forma de imposição tributária1.

É esse mito da não-incidência do imposto de renda sobre toda e qualquer verba indenizatória que o presente estudo busca, sob uma perspectiva teórica, desconstruir.

Isso será feito a partir da demonstração de que o regime jurídicotributário das indenizações não é uno, havendo, na verdade, dois regimes legais diversos a que podem se submeter as parcelas indenizatórias conforme a natureza do ato ilícito a elas subjacente.

Mais especificamente, pretende-se esclarecer que, a depender da caracterização do ato ilícito como danos emergentes, lucros cessantes ou danos morais, a correlata parcela indenizatória enquadrar-se-á em um dos dois regimes jurídico-tributários distintos existentes, que serão apresentados ao longo deste trabalho.

Tais regimes são o da indenização-reposição e o da indenizaçãocompensação, cada um acarretando conseqüências diversas na esfera da tributação pelo imposto de renda.

Enquanto as verbas indenizatórias que se enquadram no primeiro regime não sofrem a incidência do imposto de renda, por não acarretarem acréscimo patrimonial, as abrangidas pelo segundo regime são tributadas, na medida em que aumentam o patrimônio material daquele que aufere a indenização.

Espera-se que este estudo colabore com a desmistificação do pensamento de que a caracterização de uma verba como indenizatória, por si só, afasta a incidência do imposto de renda.

Mais do que isso: deseja-se promover, no seu lugar, uma atitude hermenêutica de preocupação com a investigação da ocorrência ou não de acréscimo patrimonial, fato gerador do imposto de renda, como verdadeiro fator decisivo para a tributação, que, portanto, pode vir a ocorrer ainda que sobre verbas indenizatórias, desde que essas se enquadrem no conceito, neste trabalho desenvolvido, de indenização-compensação.

1 DO ACRÉSCIMO PATRIMON IAL COMO CRITÉRIO MATERIAL DA REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA

É assente na doutrina que o fato jurídico tributário pode ser representado por um verbo e seu complemento, que se encontram dispostos no critério material da regra-matriz de incidência tributária. No caso do imposto de renda, pode-se afirmar que o critério material do tributo, à luz do seu arquétipo constitucional, consiste em “auferir renda”.

Para elucidar o que significa “auferir renda”, para fins da tributação em análise, no direito brasileiro, importantíssima a contribuição do Professor Paulo de Barros Carvalho, para quem:

Acerca do conceito de “renda”, três são as correntes doutrinárias predominantes:

  1. ´teoria da fonte´, para a qual ´renda´ é o produto de uma fonte estável, susceptível de preservar sua reprodução periódica, exigindo que haja riqueza nova (produto) derivada de fonte produtiva durável, devendo esta subsistir ao ato de produção;
  2. ‘teoria legalista’, que considera ‘renda’ um conceito normativo, a ser estipulado pela lei: renda é aquilo que a lei estabelecer que é; e
  3. ‘teoria do acréscimo patrimonial’, onde ‘renda’ é todo ingresso líquido, em bens materiais, imateriais ou serviços avaliáveis em dinheiro, periódico, transitório ou acidental, de caráter oneroso ou gratuito, que importe um incremento líquido do patrimônio de determinado indivíduo, em certo período de tempo. Prevalece, no direito brasileiro, a terceira das teorias referidas, segundo a qual o que interessa é o aumento do patrimônio líquido, sendo considerado como lucro tributável exatamente o acréscimo líquido verificado no patrimônio da empresa, durante período determinado, independentemente da origem das diferentes parcelas. É o que se depreende do art. 43 do Código Tributário Nacional.2

E prossegue o eminente doutrinador:

Nessa linha de raciocínio, a hipótese de incidência da norma de tributação da ‘renda’ consiste na aquisição de aumento patrimonial, verificável pela variação de entradas e saídas num determinado lapso de tempo. É imprescindível, para a verificação de incrementos patrimoniais, a fixação de intervalo temporal para a sua identificação, dado o caráter dinâmico ínsito à idéia de renda. Nesse sentido, Rubens Gomes de Sousa escreveu ser insuficiente o processo de medição de riqueza pela extensão do patrimônio, sendo necessário distinguir o capital do rendimento pela atribuição, ao primeiro, de um caráter estático, e ao segundo, de um caráter dinâmico, ligando-se à noção de renda um elemento temporal. ‘Capital seria, portanto, o montante do patrimônio encarado num momento qualquer de tempo, ao passo que renda seria o acréscimo do capital entre dois momentos determinados3.


Posiciona-se no mesmo sentido José Artur Lima Gonçalves ao sustentar que:

o conteúdo semântico do vocábulo ‘renda’, nos termos prescritos pelo Sistema Constitucional Tributário Brasileiro, compreende o saldo positivo resultante do confronto entre certas entradas e certas saídas, ocorridas ao longe de um dado período. É, em outras palavras, acréscimo patrimonial4.

De fato, a regra-matriz de incidência do imposto de renda é veiculada pelo art. 43 do Código Tributário Nacional, nos seguintes termos:

Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

  1. de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
  2. de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.

§ 1º A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)

§ 2º Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001) (grifo nosso).

Por sua vez, Mary Elbe Queiroz leciona que:

o imposto de renda incide sobre as rendas e proventos de qualquer natureza que constituam acréscimos patrimoniais, riquezas novas, para o beneficiário (os excedentes às despesas e custos necessários para auferir os rendimentos e à manutenção da fonte produtora e da sua família), sobre os quais ele haja adquirido e detenha a respectiva posse ou propriedade e estejam à sua livre disposição econômica ou juridicamente 5.

Percebe-se, portanto, que o principal traço distintivo para se identificar se há ou não a incidência do imposto sobre a renda é o acréscimo patrimonial, porquanto o Brasil adotou o conceito de renda-acréscimo6.

Assim, configura fato tributável pelo imposto de renda o acréscimo no patrimônio, a riqueza nova.

2 DO ACRÉSCIMO PATRIMONIAL COMO AUMENTO DE RIQUEZA

Claro está que a materialidade do imposto de renda encontra-se vinculada à ocorrência de um acréscimo patrimonial.

Para que se construam, desde já, alicerces firmes para a posterior conclusão no sentido de que pode haver incidência de imposto de renda sobre verbas indenizatórias, cumpre que se esclareça que o acréscimo patrimonial relevante para fins de tributação é, necessariamente, aumento de riqueza, elevação quantitativa do patrimônio estritamente econômico, material, não havendo que se falar, aqui, em expressões como “patrimônio jurídico” ou “patrimônio moral”.

Assim, antecipe-se que não se revela tecnicamente precisa, à luz da sistematização ora feita, não obstante se conheça a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto, a tese da não-incidência de imposto de renda sobre a indenização por danos morais, sob o argumento de que a indenização por danos morais apenas recompõe o dano causado ao “patrimônio moral”.

Ora, para fins de tributação pelo imposto de renda, o acréscimo patrimonial relevante é aquele que ocorre no patrimônio material, o aumento de riqueza, justamente por configurar-se fato revelador de capacidade contributiva.

Sob esse prisma, anteriormente à ocorrência do dano moral, a sua vítima detinha um patrimônio X. Após a ocorrência do dano moral, desconsideradas outras atividades econômicas, continuará tendo um patrimônio X. Isto é, não houve decréscimo do patrimônio – no sentido econômico, material -, nenhuma riqueza tendo sido subtraída diretamente em virtude do dano moral.

Com a percepção de uma indenização por dano moral de valor Y, entretanto, o patrimônio, antes de valor X, passará a ser quantificado em X + Y, o que denota o acréscimo patrimonial, critério material da regramatriz de incidência do imposto de renda.

Não sem motivo Silvio Rodrigues esclarece que muito se discutiu, no âmbito do Direito Civil, se o dano puramente moral poderia ser indenizado justamente porque ele não tem repercussão de caráter patrimonial7.

Logo, devem ser repelidos argumentos no sentido de que toda indenização escaparia do campo de incidência do imposto de renda, na medida em que sempre representariam a reposição de uma subtração patrimonial, ao menos do “patrimônio jurídico”, ou do “patrimônio moral”.

É com esse intuito que se desenvolve a inequívoca perspectiva de que a análise da existência ou não de acréscimo patrimonial relevante para fins de imposto de renda sempre decorrerá da análise da comparação econômica quantitativa entre dois momentos distintos do patrimônio estritamente material do contribuinte, do cotejo da sua riqueza em duas diferentes datas.

Corroborando, nesse ponto, o que se afirma, confira-se que Leandro Paulsen conclui, após analisar argumentos de Marçal Justen Filho e de João Dácio Rolim, que “o acréscimo patrimonial significa riqueza nova, de modo que corresponde ao que sobeja de todos os investimentos e despesas efetuados para a obtenção do ingresso, o que tem repercussão na apuração da base de cálculo do imposto”8.

Nem poderia ser diferente, já que a tributação somente incide sobre fatos eminentemente econômicos, reveladores de riqueza, de capacidade contributiva, pelo que inapropriado cogitar que o acréscimo patrimonial, critério material do imposto de renda, estender-se-ia ao monitoramento do que ocorre no patrimônio meramente jurídico ou moral.

Na linha desse pensamento, preciosa a lição de Paulo de Barros Carvalho:

Ao recordar, no plano da realidade social, daqueles fatos que julga de porte adequado para fazer nascer a obrigação tributária, o político sai à procura de acontecimentos que sabe haverão de ser medidos segundo parâmetros econômicos, uma vez que o vínculo jurídico a eles atrelado deve ter como objeto uma prestação pecuniária. Há necessidade premente de ater-se o legislador à procura de fatos que demonstrem signos de riqueza, pois somente assim poderá distribuir a carga tributária de modo uniforme e com satisfatória atinência ao princípio da igualdade. Tenho presente que, de uma ocorrência insusceptível de avaliação patrimonial, jamais se conseguirá extrair cifras monetárias que traduzam, de alguma forma, valor em dinheiro. Colhe a substância apropriada para satisfazer os anseios do Estado, que consiste na captação de parcelas do patrimônio de seus súditos, sempre que estes participarem de fatos daquela natureza. Da providência contida na escolha de eventos presuntivos de fortuna econômica decorre a possibilidade de o legislador, subsequentemente, distribuir a carga tributária de maneira eqüitativa, estabelecendo, proporcionalmente às dimensões do acontecimento, o grau de contribuição do que deles participam.9

A propósito, mesmo no âmbito do Direito Civil o conceito de patrimônio é concebido à luz de uma visão estritamente econômica, material, como bem lembra o festejado civilista Francisco Amaral:

patrimônio, provavelmente de patris munium, é o complexo de relações jurídicas economicamente apreciáveis de uma pessoa. Reúne os seus direitos e obrigações, formando uma unidade jurídica, uma universalidade de direito. Apresenta três elementos característicos: a unidade do conjunto de direito e de obrigações, sua natureza e pecuniária, e sua atribuição a um titular. Compreende os créditos e os débitos de uma pessoa. No primeiro caso, temos o ativo, conjunto de direitos que formam o patrimônio (direitos reais, direitos pessoais e direitos intelectuais); no segundo, temos o passivo, o conjunto de obrigações (dívidas). Para a doutrina moderna, porém, o passivo não integra o patrimônio; é apenas uma carga, um ônus sobre ele. Dele não participam os direitos personalíssimos (vida, liberdade, honra etc.), os direitos de família puros, as ações de estado e os direitos públicos que não têm valor econômico, variando o seu valor conforme a possibilidade de realizar-se a condição10.

Segundo Orlando Gomes, “toda pessoa tem direitos e obrigações pecuniariamente apreciáveis. Ao complexo desses direitos e obrigações denomina-se patrimônio”11.

À luz desta vertente, correspondente à teoria clássica, cada pessoa titulariza apenas um patrimônio e tal instituto está adstrito aos direitos e obrigações economicamente apreciáveis.


Verifica-se, destarte, que o patrimônio, no âmbito do Direito Civil, é o conjunto de direitos e obrigações com valor econômico direto, imediato.

Está excluída, portanto, da idéia de patrimônio stricto sensu a violação a direitos que, por não terem um inerente valor econômico, não representem, por si sós, riqueza.

É por isso que não procede, à guisa de exemplo, a afirmação de que a indenização por danos morais e outras análogas recompõem o patrimônio.

Isso porque, no momento do dano moral, não há qualquer repercussão no patrimônio stricto sensu, na medida em que este é composto apenas por direitos de expressão econômica direta e imediata, dele não fazendo parte, como visto, os direitos personalíssimos, como a imagem e a honra de uma pessoa.

De fato, num segundo momento, qual seja, no momento da indenização, em que se pretende compensar, por meio de uma quantia em dinheiro, o abalo moral sofrido, há repercussão no patrimônio stricto sensu.

Presencia-se, então, o fenômeno da patrimonialidade intermédia de que trata Francisco Amaral, típica daquelas relações jurídicas que resultam da lesão de direito personalíssimo e que exprimem o direito à respectiva indenização.

De qualquer forma, isso apenas comprova o que se afirma: tal indenização representa acréscimo de riqueza, e não mera reposição, porquanto o dano moral nenhuma repercussão, muito menos subtração, causou no patrimônio stricto sensu.

3 DA INDENIZAÇÃO-REPOSIÇÃO E DA INDENIZAÇÃO-COMPENSAÇÃO

O ponto fulcral do presente estudo encontra-se na percepção de que a natureza jurídica das indenizações não é una. A compreensão da existência de duas espécies de indenização, a indenização-reposição e a indenização-compensação, com conseqüências jurídicas diversas, é de instrumental importância para que se visualize quão equivocadamente vem sendo proclamada, na doutrina e na jurisprudência, a não-incidência de imposto sobre toda e qualquer verba indenizatória.

Para tanto, faz-se necessário definir indenização e dano.

Para Silvio Rodrigues12, indenizar significa ressarcir um prejuízo, um dano experimentado pela vítima.

É essa noção de indenização enquanto ressarcimento de um dano que, analisada sem maior reflexão, leva ao equivocado entendimento de que toda indenização apenas restabelece o patrimônio, pelo que não seria tributada pelo imposto de renda.

Ocorre que não se deve perder de vista que o dano ressarcido pela indenização pode ser, efetivamente, um dano material que cause decréscimo do patrimônio (dano emergente), ou pode ser um dano material que não cause subtração patrimonial, mas, apenas, a perda da oportunidade de aumentá-lo (lucros cessantes), ou, mesmo, pode ser um dano a um direito personalíssimo, sem qualquer repercussão no patrimônio (danos morais).

Quanto aos danos morais, já se disse que Silvio Rodrigues, dentre inúmeros outros, é contundente no sentido de que “não têm repercussão de caráter patrimonial”13. Assim, como o mesmo jurista esclarece, o dinheiro que se paga à vítima, a título de danos morais, não repõe o valor subtraído do patrimônio pelo dano, pois o dano moral nenhuma repercussão patrimonial, econômica, tem.

Para o civilista Silvio Rodrigues, no sentido da doutrina de excelência, o dinheiro que se paga à vítima, a título de danos morais, “provocará na vítima uma sensação de prazer, de desafogo, que visa compensar a dor, provocada pelo ato ilícito.”14 Isso decorre da completa impossibilidade de se repor à vítima a sua perda moral. Assim, tenta-se compensar – ante a impossibilidade de se repor – o prejuízo moral sofrido, tenta-se atenuá-lo, por meio de entrega de riqueza à vítima.

No que concerne aos danos materiais, muito contribui Washington de Barros Monteiro ao esclarecer que tais danos

se enquadram em duas classes, positivos e negativos. Consistem os primeiros numa real diminuição no patrimônio do credor e os segundos, na privação de um ganho que o credor tinha o direito de esperar. Os antigos comentadores do direito romano designavam esses danos pelas conhecidas expressões damnum emergens e lucrum cessans. Dano emergente é o déficit no patrimônio do credor, a concreta redução por este sofrida em sua fortuna (quantum mihi abfuit). Lucro cessante é o que ele razoavelmente deixou de auferir, em virtude do inadimplemento do devedor (quantum lucrari potui).15

Aduz-se de forma cristalina, portanto, que, no âmbito dos danos materiais, somente os danos emergentes causam efetiva subtração do patrimônio, pelo que sua indenização, de fato, tem natureza de mero restabelecimento patrimonial, de mera reposição da riqueza retirada ilicitamente da vítima. Os lucros cessantes, de forma diametralmente oposta, não causam efetiva subtração do patrimônio, pelo que sua indenização não tem natureza de mero restabelecimento patrimonial, pois não repõe uma riqueza préexistente retirada ilicitamente da vítima.

Que fique claro: a indenização por lucros cessantes apenas compensa a perda da oportunidade de que a vítima viesse a obter novas riquezas.

É o que Sérgio Cavalieri Filho nos ensina:

[…] pode-se dizer que, se o objeto do dano é um bem ou interesse já existente, estaremos em face do dano emergente; tratando-se de bem ou interesse futuro, ainda não pertencente ao lesado, estaremos diante de lucro cessante.

Consiste, portanto, o lucro cessante na perda do ganho esperável, na frustração da expectativa de lucro, na diminuição potencial do patrimônio da vítima. Pode decorrer não só da paralisação da atividade lucrativa ou produtiva da vítima, como por exemplo, a cessação dos rendimentos que já vinha obtendo da sua profissão, como, também, da frustração daquilo que era razoavelmente esperado16 (grifo nosso).

Constata-se, sob esse enfoque, que o lucro cessante é também a diminuição potencial do patrimônio, isto é, a subtração de uma expectativa de ganho e, por isso mesmo, de algo que ainda não se incorporou ao patrimônio. Se é potencial, por óbvio, é porque de minoração do patrimônio não se trata.

Por isso, a indenização por danos morais e por lucros cessantes enquadram-se como indenização-compensação, em contraposição à indenização por danos emergentes, que se enquadram como indenizaçãoreposição.

Com efeito, a indenização-reposição representa uma entrega de riqueza à vítima de um dano quantitativamente correspondente a uma riqueza pré-existente, que tenha sido imediatamente retirada de seu patrimônio em decorrência do ato danoso.

Representa indenização-reposição, a título ilustrativo, aquele montante pago à vítima de um abalroamento exatamente correspondente à diminuição do valor do seu carro decorrente do dano. Como se faz intuitivo, os danos emergentes sempre são indenizados por meio de indenização-reposição.

Por outro lado, a indenização-compensação representa uma entrega de riqueza à vítima de um dano quantitativamente não correspondente a uma riqueza pré-existente, que tenha sido imediatamente retirada de seu patrimônio em decorrência do ato danoso.

A indenização-compensação apenas compensa um sofrimento causado por um dano moral (do qual, como minuciosamente demonstrado, não decorre nenhuma subtração de riqueza pré-existente) ou compensa os lucros cessantes, isto é, o que se perdeu a oportunidade de ganhar em razão do dano sofrido (o qual não causou qualquer subtração da riqueza préexistente, pois os lucros cessantes correspondem a uma mera expectativa de ganho, e não a valores já incorporados no patrimônio à época do ato danoso).

Como inexorável conseqüência lógica da desenvolvida distinção entre espécies de indenização, temos que a incidência do imposto de renda sobre verbas de natureza indenizatória não pode, sob pena de afronta ao arquétipo constitucional do aludido tributo, ser tratada de maneira generalizada, indiscriminada, afastando-se a tributação sempre que esteja sob os holofotes hermenêuticos uma indenização.

4 DA INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE A INDENIZAÇÃOCOMPENSAÇÃO E DA NÃO-INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE A INDENIZAÇÃO-REPOSIÇÃO

Em razão das premissas até aqui solidamente construídas, não se faz necessário avançar ainda mais longe para se visualizar que somente a indenização-reposição repõe, efetivamente, uma perda patrimonial, escapando do campo de incidência do imposto de renda.


Por conseguinte, a indenização-compensação, que indeniza um dano que não ocasionou à vítima a diminuição da riqueza pré-existente, mas mero abalo moral ou perda da oportunidade de obter novos ganhos (mera expectativa, não representando valores já incorporados, à época, ao patrimônio da vítima), exsurge como indubitável acréscimo patrimonial.

Assim, a indenização-compensação (por danos morais ou por lucros cessantes), à luz da melhor técnica, realiza, sim, o critério material da regramatriz de incidência do imposto de renda.

Para fortalecer essa idéia, imagine-se, à guisa de exemplo, a situação de um trabalhador autônomo que, por conduta ilícita de outrem, fica impedido de exercer o seu ofício por alguns dias. O que ele receberia a título de remuneração, caso tivesse trabalhado normalmente, seria, naturalmente, tributado pelo imposto de renda.

Parece intuitivo, nessa ilustração, que a mera circunstância dele perceber essas quantias de forma diferida, atrasada, como lucros cessantes, não retira a sua condição de acréscimo patrimonial, e, por isso mesmo, não as transmuda em verbas não-tributadas ou isentas.

Importante advertir que poderia fomentar nefastas práticas de fraude contra a ordem tributária cultivar-se o entendimento de que o recebimento, a título de indenização por lucros cessantes, de uma verba, que, não fosse o ato ilícito, seria evidentemente remuneratória, é capaz de excluir essa mesma verba da tributação pelo imposto de renda.

Poder-se-ia vislumbrar, com grande facilidade, a proliferação de simulações de atos ilícitos e de respectivas indenizações por lucros cessantes com o escopo de evitar a tributação pelo imposto de renda de verbas originalmente remuneratórias.

Ressalte-se que, embora significativa parte da doutrina ainda careça de maior aprofundamento técnico-científico na análise do imposto de renda, como bem destacou o Professor Paulo de Barros Carvalho, a tese aqui exposta encontra eco doutrinário. Nessa esteira, Leandro Paulsen informa que:

há doutrina consistente no sentido de que não se deveria confundir o patrimônio moral – irrelevante para fins de tributação – com o patrimônio econômico – revelador de capacidade contributiva – e destacando que nem tudo o que se costuma denominar de indenização, mesmo material, efetivamente corresponde a simples recomposição de perdas.17

Já se colacionou, no presente trabalho, o art. 43 do Código Tributário Nacional, veículo formal da regra-matriz de incidência do Imposto de Renda, do qual se assimila que é tributado o acréscimo patrimonial sobre o qual se possui disponibilidade jurídica. É bom ressaltar que não existem locuções e adjacências no conceito legal: a norma não preceitua que seria tributável apenas o acréscimo patrimonial que não seja indenizatório.

Com esse enfoque, colhe-se, mais uma vez, a doutrina de Mary Elbe Queiroz:

Impende considerar que os valores que constituem mera recomposição patrimonial, como as indenizações ou os valores expressamente previstos na lei como isentos, não são computados na apuração da respectiva base de cálculo. As indenizações deverão ser consideradas quando revelarem acréscimo patrimonial e não se encontrarem expressamente abrangidas por norma isencional18(grifo nosso).

Tanto é verdade que o montante advindo de pagamento de indenização pode estar, se acarretar acréscimo patrimonial, no espectro possível de tributação pelo imposto de renda que foi necessária a edição de lei específica contemplando diversas verbas tidas como indenizatórias que se resolveu, por opção política, tornar isentas. É o que ocorreu com a Lei 7.713/88.

A não-tributação de verbas indenizatórias pelo imposto de renda depende, com isso, de que elas não representem acréscimo patrimonial (hipótese de não-incidência pura e simples) ou de que, caso gerem riqueza nova, estejam abrangidas por isenção legal.

Outrossim, apesar da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça ainda estar contaminada com a visão pouco refletida e generalizante irradiada por parcela significativa da doutrina, a fértil semente dos fundamentos expostos no presente estudo já foi lançada jurisprudencialmente pelo Ministro Teori Albino Zavascki em precedente importantíssimo como divisor de águas para uma imersão daquele tribunal superior numa maior profundidade técnico-científica no trato da matéria.

Nesse sentido, alguns elucidativos acórdãos da 1ª Turma e da 1ª Seção do STJ, de sua relatoria, no sentido de que, mesmo que uma verba tenha natureza indenizatória, sofrerá a incidência do imposto de renda se resultar acréscimo patrimonial:

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR ROMPIMENTO DO CONTRATO DE TRABALHO NO PERÍODO DE ESTABILIDADE PROVISÓRIA. NATUREZA. REGIME TRIBUTÁRIO DAS INDENIZAÇÕES. PRECEDENTES.

  1. O imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador, nos termos do art. 43 e seus parágrafos do CTN, os “acréscimos patrimoniais”, assim entendidos os acréscimos ao patrimônio material do contribuinte.
  2. O pagamento de indenização pode ou não acarretar acréscimo patrimonial, dependendo da natureza do bem jurídico a que se refere.
    Quando se indeniza dano efetivamente verificado no patrimônio material (= dano emergente), o pagamento em dinheiro simplesmente reconstitui a perda patrimonial ocorrida em virtude da lesão, e, portanto, não acarreta qualquer aumento no patrimônio. Todavia, ocorre acréscimo patrimonial quando a indenização (a) ultrapassar o valor do dano material verificado (= dano emergente), ou (b) se destinar a compensar o ganho que deixou de ser auferido (= lucro cessante), ou (c) se referir a dano causado a bem do patrimônio imaterial (= dano que não importou redução do patrimônio material).
  3. O direito a estabilidade temporária no emprego é bem do patrimônio imaterial do empregado. Assim, a indenização paga em decorrência do rompimento imotivado do contrato de trabalho, em valor correspondente ao dos salários do período de estabilidade, acarreta acréscimo ao patrimônio material, constituindo, por isso mesmo, fato gerador do imposto de renda. Todavia, tal pagamento não se dá por liberalidade do empregador, mas por imposição da ordem jurídica. Trata-se, assim, de indenização abrigada pela norma de isenção do inciso XX do art. 39 do RIR/99 (Decreto 3.000, de 31.03.99), cujo valor, por isso, não está sujeito à tributação do imposto de renda. Precedente da 1ª Turma: EDcl no Ag 861.889/SP.
  4. Recurso especial a que se nega provimento.

(grifo nosso – REsp 886.563/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/05/2008, DJe 02/06/2008)

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR ROMPIMENTO DO CONTRATO DE TRABALHO. CUMPRIMENTO DE CONVENÇÃO OU ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ISENÇÃO.

  1. O imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador, nos termos do art. 43 e seus parágrafos do CTN, os “acréscimos patrimoniais”, assim entendidos os acréscimos ao patrimônio material do contribuinte.
  2. O pagamento de indenização por rompimento de vínculo funcional ou trabalhista, embora represente acréscimo patrimonial, está contemplado pela isenção do art. 6º, V, da Lei 7.713/88 (“Ficam isentos do imposto de renda (…) a indenização e o aviso prévio pagos por despedida ou rescisão de contrato de trabalho, até o limite garantido por lei […]).
    […]
  3. O direito a estabilidade temporária no emprego é bem do patrimônio imaterial do empregado. Assim, a indenização paga em decorrência do rompimento imotivado do contrato de trabalho, em valor correspondente ao dos salários do período de estabilidade, acarreta acréscimo ao patrimônio material, constituindo, por isso mesmo, fato gerador do imposto de renda. Todavia, tal pagamento não se dá por liberalidade do empregador, mas por imposição da ordem jurídica. Trata-se, assim, de indenização prevista em lei e, como tal, abarcada pela norma de isenção do imposto de renda. Precedente: REsp 870.350/SP, 1ª Turma, DJ de 13.12.2007.
  4. O pagamento feito pelo empregador a seu empregado, a título de adicional de 1/3 sobre férias tem natureza salarial, conforme previsto nos arts. 7º, XVII, da Constituição e 148 da CLT, sujeitando-se, como tal, à incidência de imposto de renda. Todavia, o pagamento a título de férias vencidas e não gozadas, bem como de férias proporcionais, convertidas em pecúnia, inclusive os respectivos acréscimos de 1/3, quando decorrente de rescisão do contrato de trabalho, está beneficiado por isenção (art. 39, XX do RIR, aprovado pelo Decreto 3.000/99 e art. 6º, V, da Lei 7.713/88).
    Precedentes: REsp 782.646/PR, AgRg no Ag 672.779/SP e REsp 671.583/SE.

  1. Agravo regimental a que se nega provimento.

(grifos nossos – AgRg no Ag 1008794/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/06/2008, DJe 01/07/2008)

Em síntese: o imposto de renda não incide na indenização-reposição, uma vez que, nela, não há, de fato, que se falar em acréscimo patrimonial, pois apenas se recompõe a riqueza que foi subtraída do patrimônio material em razão do dano emergente.

Por outro lado, bastante claro que incide imposto de renda sobre a indenização-compensação, pois, nessa, há nítido aumento de riqueza, porquanto o patrimônio material não havia sido diminuído pelos lucros cessantes (apenas se deixou de ganhar, mas não se diminuiu a riqueza que existia) ou pelos danos morais (mero abalo moral, sem reflexo econômico-financeiro).

5 O DEBATE, NO ÂMBITO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, ACERCA DA INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE OS JURO S DE MORA COMO EXEMPLO DA FALTA DE CLAREZA JURISPRUDENCIAL SOBRE A DISTINÇÃO DE REGIMES DA INDENIZAÇÃO-REPOSIÇÃO E DA INDENIZAÇÃO- COMPENSAÇÃO

Muito se discute, no seio do Superior Tribunal de Justiça, se incide ou não imposto de renda sobre juros de mora. Interessante destacar que, em exemplo rico da crítica que se faz acerca do freqüente afastamento, generalizado e irrefletido, das verbas indenizatórias da tributação pelo imposto de renda, o ápice da discussão travada naquele tribunal superior está na natureza indenizatória ou não dos juros de mora.

Observa-se, assim, que os precedentes que têm como premissa a natureza jurídica indenizatória dos juros de mora afastam, só por isso, a incidência do imposto de renda, sem maiores perquirições sobre a ocorrência ou não de acréscimo patrimonial.

Por outro lado, os precedentes que sustentam a incidência do imposto de renda sobre os juros de mora apresentam como razão de ser da referida decisão a ausência, no contexto dos autos, de natureza indenizatória dos juros moratórios.

Ora, o que salta aos olhos é que a discussão central para a decisão sobre a incidência ou não do imposto de renda é ser ou não indenizatória a verba em debate, como se a materialidade do tributo dissesse respeito à natureza não-indenizatória da parcela, e não à ocorrência de acréscimo patrimonial.

Relega-se a último plano, destarte, estranhamente ignorada, a investigação da ocorrência ou não de acréscimo patrimonial, verdadeira materialidade que se extrai do arquétipo constitucional do imposto de renda, que independe da natureza indenizatória do pagamento alcançado pelo campo de incidência do tributo.

Assim, prevalece na egrégia 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que, por algum tempo, foi, nesse ponto, acompanhada pela 2ª Turma da mesma Corte Superior, o entendimento de que a natureza dos juros moratórios depende da natureza do principal: se o principal tiver natureza remuneratória, os juros de mora terão a mesma natureza e, por isso, sofrerão a incidência do imposto de renda; se, todavia, o principal tiver natureza indenizatória, igualmente indenizatória será a natureza dos juros moratórios, e, por isso, e somente por isso, não sofrerão a tributação pelo imposto de renda.

À guisa de ilustração, colaciona-se o seguinte aresto:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. IMPOSTO DE RENDA. MAGISTRADO. AUXÍLIO-MORADIA. ART. 25 DA MP 1.858-9/1999. NATUREZA INDENIZATÓRIA. NÃO-INCIDÊNCIA. REDUTOR SALARIAL. CARÁTER REMUNERATÓRIO. INCIDÊNCIA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. ACESSÓRIOS SEGUEM A SORTE DO PRINCIPAL.

    1. Indenização é a prestação em dinheiro, substitutiva da prestação específica, destinada a reparar ou recompensar o dano causado a um bem jurídico, quando não é possível ou não é adequada a restauração in natura do bem jurídico atingido. Não tem natureza indenizatória, portanto, o pagamento – ainda que imposto por condenação trabalhista – correspondente a uma prestação que, originalmente (= independentemente da ocorrência de lesão), era devida em dinheiro. O que há, em tal caso, é simples adimplemento, embora a destempo e por execução forçada, da própria prestação in natura (REsp 674.392/SC, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 6.6.2005).
    2. As verbas trabalhistas recebidas em cumprimento de decisão judicial, a título de redutor salarial, mantiveram sua natureza original de prestação remuneratória, razão pela qual sobre elas deve incidir o
    3. Conforme dispõe o art. 25 da Medida Provisória 1.858-9/1999, os valores pagos a funcionários públicos a título de auxílio-moradia não constituem acréscimo patrimonial, possuindo natureza indenizatória, razão pela qual não podem ser objeto de incidência do Imposto de Renda.
    4. Os juros de mora e a correção monetária são frutos acessórios da utilização da importância principal, assim, seguem a sorte desta. Se a obrigação principal for tributável, também o serão a correção monetária e os juros de mora sobre ela incidente. Do mesmo modo, caso o principal tenha natureza indenizatória, não estará sujeito ao Imposto de Renda, bem como os juros moratórios e a atualização monetária dele decorrentes também não estarão.
    5. Recurso especial parcialmente provido.
      1. Os valores recebidos pelo contribuinte a título de juros de mora, na vigência do Código Civil de 2002, têm natureza jurídica indenizatória. Nessa condição, portanto, sobre eles não incide imposto de renda, consoante a jurisprudência sedimentada no STJ. 2. Recurso especial improvido.
      1. o critério material do imposto de renda é realizado pelo acréscimo patrimonial;
      2. o conceito de acréscimo patrimonial é exclusivamente econômico, estando atrelado a um aumento real de riqueza, tendo-se em mente que a tributação sempre incide sobre fatos reveladores de capacidade contributiva;
      3. o conceito de indenização está ligado à reposição ou compensação por um dano, que pode ser de natureza material ou moral;
      4. apenas os danos materiais provocam efetiva diminuição de riqueza, uma vez que os danos morais, por si sós, representam abalo do chamado “patrimônio moral” do sujeito de direito, mas, não, de seu patrimônio material, econômico, o relevante para fins de tributação;
      5. os danos materiais assumem o caráter de danos emergentes, que consubstanciam efetivo decréscimo do patrimônio material existente anteriormente ao dano, ou o caráter de lucros cessantes, que não acarretam decréscimo do patrimônio existente no momento que precede o dano, mas a perda da oportunidade de vir a obter um aumento de riqueza;
      6. nesse contexto, as indenizações dividem-se em indenizaçãoreposição, que efetivamente restabelece o patrimônio material que havia sido diminuído por um dano emergente, e indenização-compensação, que não restabelece o patrimônio material, uma vez que o dano indenizado não ocasionou a diminuição da riqueza antes existente, tendo como finalidade, em verdade, compensar a riqueza que se deixou de ganhar em decorrência do dano (lucros cessantes) ou o abalo moral sofrido (danos morais);
      7. em razão disso, o imposto de renda apenas não incide na indenização-reposição, porquanto, nela, não há, de fato, que se falar em acréscimo patrimonial, pois apenas se recompõe a riqueza que foi subtraída do patrimônio material em razão do dano emergente;
      8. por outro lado, bastante claro que incide imposto de renda sobre a indenização-compensação, uma vez que, nela, há nítido aumento de riqueza, pois o patrimônio material não havia sido diminuído pelos lucros cessantes (apenas se deixou de ganhar, mas não se diminuiu a riqueza que existia) ou pelos danos morais (mero abalo moral, sem reflexo econômico-financeiro);
      9. os juros moratórios, se entendidos como verba indenizatória, configuram indenização-compensação, pelo que sempre incidirá o imposto de renda;

      1. o debate jurisprudencial travado no Superior Tribunal de Justiça, entretanto, elege a definição da natureza indenizatória ou remuneratória dos juros de mora como a questão decisiva para a controvérsia, sem sequer levar em consideração a possibilidade de ocorrência de acréscimo patrimonial ainda que tal verba seja tida como indenizatória;
      2. por esse motivo, o estudo-de-caso da jurisprudência daquele tribunal superior concernente ao imposto de renda sobre juros de mora serve como emblemático exemplo do mito da não-incidência desse imposto sobre toda e qualquer verba indenizatória, o que reforça a fragilidade científica dos julgamentos predominantes no Poder Judiciário brasileiro acerca da tributação ou não de verbas que, a despeito de serem qualificadas como indenizatórias, podem acarretar obtenção de riqueza nova;
      3. destarte, com o escopo de promover maior consistência científica – e conseqüente respeito ao ordenamento jurídico tributário – na doutrina e na jurisprudência brasileira sobre o tema, fazse necessária a desconstrução do mito da não-incidência do imposto de renda sobre toda e qualquer verba indenizatória, substituindo-o pela preocupação com a qualificação da verba como indenização-reposição ou indenização-compensação, admitindo-se, no último caso, ao contrário do primeiro, a plena validade da tributação pelo imposto de renda.

(grifo nosso – REsp 615.625/MT, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/10/2006, DJ 07/11/2006 p. 234)

A 2ª Turma, embora já tenha, como dito, seguido tal entendimento, vem adotando tese ainda mais radical, no sentido de que os juros de mora, após o Código Civil de 2002, sempre têm natureza indenizatória, o que, por si só, independentemente da análise concreta acerca da ocorrência ou não de acréscimo patrimonial, justificaria a não-incidência do imposto de renda.

Esclareça-se a tese em comento com a verificação do seguinte precedente:

TRIBUTÁRIO – RECURSO ESPECIAL – ART. 43 DO CTN – IMPOSTO DE RENDA – JUROS MORATÓRIOS – CC, ART. 404: NATUREZA JURÍDICA INDENIZATÓRIA – NÃOINCIDÊNCIA.

(grifos nossos – REsp 1037452/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/05/2008, DJe 10/06/2008)

Após o conhecimento dos ilustrativos precedentes, reitere-se: o Superior Tribunal de Justiça, em inúmeras situações, dentre as quais a da incidência de imposto de renda sobre juros moratórios, vem negando a ocorrência da materialidade do tributo em questão a partir da exclusiva premissa de que a verba tem natureza indenizatória. Vem aplicando, portanto, o, com a devida vênia, inadequado entendimento de que toda indenização apenas recompõe o patrimônio.

Como se demonstrou ao longo do presente estudo, tal premissa não é verdadeira, sob o prisma técnico-científico.

Cabe ir além da genérica assertiva de que uma dada verba possui natureza indenizatória para se indagar sobre de que espécie de indenização estamos diante.

Isto é, não basta, para se decidir sobre a incidência ou não de imposto de renda sobre uma verba, concluir sobre o seu status de indenização, devese concluir se a verba em questão representa indenização-reposição ou indenização-compensação. Isso porque, como proclamado à exaustão, somente a indenização-reposição não acarreta acréscimo patrimonial, e, portanto, escapa do âmbito de incidência do imposto de renda.

Assim, ainda que o Superior Tribunal de Justiça, de fato, se pacificasse sobre a natureza indenizatória dos juros de mora, deveria, com o escopo de consolidar uma jurisprudência tecnicamente coerente, enquadrá-los como indenização-reposição ou indenização-compensação. Somente reputandoos indenização-reposição é que se mostra apropriado seja rechaçada a cobrança do imposto de renda sobre os juros de mora.

Ocorre que a indenização-reposição é aquela própria dos danos emergentes, que causam a subtração de riqueza pré-existente, e, por isso, apenas recompõem a riqueza que foi retirada, restabelecendo o patrimônio. Todavia, esse não é o caso dos juros moratórios.

Explica-se: para os autores civilistas que reconhecem a natureza indenizatória dos juros de mora, esse teria, no que tange à obrigação de pagar, a função de indenizar o tempo que o credor passa, em razão do atraso do devedor, sem poder usufruir da quantia devida como principal.

Nessa direção, como consigna o Professor Washington de Barros Monteiro, “dividem-se os juros em compensatórios e moratórios. Correspondem os primeiros aos frutos do capital mutuado ou empregado. Os segundos representam indenização pelo atraso no cumprimento da obrigação”19. (grifos nossos)

Assim, se imaginarmos os juros moratórios como indenização, devese compreender que apenas o seu principal, se indenizatório for, é que poderá representar reposição patrimonial, repondo uma riqueza subtraída, pelo dano, do patrimônio do agora credor.

Deve-se perceber que os juros moratórios apenas surgem a partir da mora do devedor no pagamento do principal. Ora, os juros de mora consistem em riqueza que nunca antes fez parte do patrimônio do credor.

Importante que se repita: caso o principal seja uma indenizaçãoreposição, este, sim, irá devolver ao patrimônio do credor uma riqueza que lhe foi subtraída pelo dano causado pelo devedor.

Os juros de mora não: seja o seu principal verba de natureza remuneratória ou indenizatória, o fato é que os juros de mora acarretam entrega de riqueza nova ao credor, riqueza que não corresponde a qualquer valor pré-existente do seu patrimônio.

É por isso que, na hipótese dos juros de mora serem compreendidos como indenização, independentemente da natureza do seu principal, não cabe, por uma questão de coerência técnico-científica, enquadrá-los como indenização-reposição, pois não apresentam as características próprias dos danos emergentes.

Para que não restem dúvidas, propõe-se um questionamento retórico: os juros de mora corresponderiam, quantitativamente, a que riqueza pré-existente do patrimônio do credor? Responde-se: a nenhuma.

Assim, uma eventual natureza indenizatória dos juros de mora somente seria plausível concebendo-os como uma indenização-compensação, dada a sua proximidade conceitual com os lucros cessantes, já que os juros de mora teriam por desiderato compensar o credor pelo decurso do tempo em que não pôde usufruir do valor principal, investindo-o, por exemplo, e obtendo renda nova.

Sob essa ótica, em razão da frustração da expectativa do credor de utilizar, num dado período, o dinheiro a ele devido (valor principal) como melhor lhe aprouvesse, e até obter novas riquezas, por meio do seu investimento, é que se vislumbra a natureza indenizatória dos juros de mora.

Portanto, os juros de mora, concebidos como indenização, guardam estrita similitude com a indenização por lucros cessantes, já que aqueles não recompõem uma riqueza pré-existente subtraída em razão da mora, mas, sim, como os últimos, compensam a perda da oportunidade do credor de usar o dinheiro, naquele período, como bem entendesse, investindo-o e, até, vindo a obter novas riquezas.

O magistério de Orlando Gomes consiste em importante contribuição para esse entendimento, porquanto qualifica os juros de mora como uma presunção de indenização mínima, baseada em uma estimativa daquilo que o capital renderia caso estivesse em poder do credor:

Nas dívidas pecuniárias, as perdas e danos abrangem os juros moratórios, custas honorários de advogado, pena convencional e atualização monetária. É intuitiva a razão dessa especificidade. A privação do capital em conseqüência do retardamento na sua entrega ocasiona prejuízo que se apura facilmente pela estimativa de quando renderia, em média, se já estivesse em poder do credor” 20 (grifo nosso).

Com esteio nesse pensamento, infere-se que os juros moratórios têm o caráter de lucros cessantes, representando algo que o credor deixou de ganhar. É o que se presume que seria o rendimento mínimo do credor se dispusesse do capital.


O pensamento de Sérgio Cavalieri Filho robustece ainda mais a conexão entre os juros de mora e a definição de lucro cessante. Lembremos, conforme já tratado neste estudo, que, para ele, o lucro cessante é a perda do ganho esperável, o que corresponde, na exata medida, ao que Orlando Gomes vislumbrou nos juros de mora: a privação de um ganho esperável.

Por todo o exposto é que se conclui, de forma contundente, que se os juros moratórios indenização forem, independentemente da natureza do seu principal, sempre se enquadrarão como indenização-compensação, tais quais os lucros cessantes, pelo que, também sempre, incidirá imposto de renda sobre eles.

Logo, os juros moratórios vistos como indenização, independentemente do principal, somente corroboram a ocorrência de acréscimo patrimonial, materialidade constitucional do imposto de renda, não havendo que se falar em afastamento da tributação de tal imposto em razão de um genérico status de indenização.

Nesse diapasão, o estudo-de-caso da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça concernente ao imposto de renda sobre juros de mora serve como emblemático exemplo do mito da não-incidência desse imposto sobre toda e qualquer verba indenizatória, o que reforça a fragilidade científica dos julgamentos predominantes no Poder Judiciário brasileiro acerca da tributação ou não de verbas que, a despeito de serem qualificadas como indenizatórias, podem acarretar obtenção de riqueza nova.

6 CONCLUSÃO

Em busca de clareza e objetividade, consigna-se, de maneira sucinta, que as conclusões que se extraem do presente trabalho acadêmico são as de que:

Notas

1 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, linguagem e método. São Paulo: Noeses, 2008. p. 593. 2 CARVALHO, op. cit., p. 599.
3 CARVALHO, Paulo de Barros. op. cit., p. 600.
4 GONÇALVES, José Artur Lima. Imposto sobre a renda: pressupostos constitucionais. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 179.
5 QUEIROZ, Mary Elbe. Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza. São Paulo: Manole, 2004. p. 89.
6 Entre as teorias que visam a explicar o conceito de renda, pode-se destacar a “[…] teoria da rendaacréscimo patrimonial, que vê a renda como todo ingresso, desde que passível de avaliação em moeda, independentemente de o ingresso ter sido consumido ou reinvestido, considerando na apuração da renda líquida a dedução dos gastos para obtenção dos ingressos e para manutenção da fonte. […] Segundo Hugo de Brito Machado, o CTN adotou o conceito de renda-acréscimo, pois, segundo esse professor, sem acréscimo não há renda nem proventos. Cf. QUEIROZ, Mary Elbe. Op. Cit., p. 69-70.
7 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1998. p.189.
8 PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos: federais, estaduais e municipais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 56.
9 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva. p. 181-182.
10 AMARAL, Francisco. Direito Civil: introdução. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 337.
11 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 184.
12 RODRIGUES, Silvio. op. cit., p.185.
13 RODRIGUES, op. cit., p.189.
14 RODRIGUES. op. cit., p.191.
15 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 341-342.
16 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 8 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 72.
17 PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos: federais, estaduais e municipais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 51.
18 QUEIROZ, Mary Elbe. Op. cit., p. 122.
19 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 345.
20 GOMES, Orlando. Obrigações. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 188.

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2008.01.00.040433-0

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Processos vinculados: 2008.34.00.022230-9

Última folha: 120

OBJETO:

Na sentença a União deve ser condenada ao pagamento das diferenças referentes ao 13 salário e férias bem à correção monetária de todo o período e à incidência de juros de mora; ambos, correção monetária e juros de mora devem incidir sobre o montante total a que faz jus cada um dos Procuradores da Fazenda Nacional beneficiados com a promoção atrasada.

Seja provido o recurso, a fim de reformar a citada decisão recorrida, pelas razões acima, para denegar a liminar requerida pelos ora agravados ou, subsidiariamente, serem limitados seus efeitos apenas aos substituídos domiciliados no Distrito Federal, nos termos do art. 2º-A, da Lei 9.494/97.


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Antecipação dos efeitos recursais, a fim de que a autoridade coatora, ora agravada, se abstenha de proceder qualquer espécie de desconto relativo às férias, de 30 dias, gozadas pelos 8rs. Procuradores da Fazenda Nacional no presente mês de janeiro de 2.008, garantindo o recebimento do subsidio de 1/13constitucional, respectivo na folha de fevereiro de 2.008, ou se já o procedeu, seja expedida nova folha (suplementar) garantindo o pagamento em questão, sob pena de desobediência e multa pecuniária.


2007.01.00.008.582-9

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Última folha:126

OBJETO:

requerer a antecipação da tutela recursal, deferindo liminarmente, inaudita altera pars, garantindo aos substitutos do agravante:

a) O direito de 60 dias de férias anuais, com respectivo pagamento do adicional deferias de 1/3 (um terço), com imediata marcação, sob pena de desobediência, ou eventual conversão em pecúnia em caso de impossibilidade da concessão.


Informe SINPROFAZ – 23/02/2011

FÉRIAS DE 60 DIAS – O SINPROFAZ ingressou na última semana com Ação Ordinária para garantir o direito a férias anuais de 60 dias para os Procuradores que se filiaram a partir de 20/12/2006. Os demais associados já fazem parte das ações anteriormente ajuizadas. O direito a férias de 60 dias foi instituído para compensar…


Informe SINPROFAZ – 15/02/2011

Contribuição sobre o 1/3 de Férias; Pagamento pela União da anuidade da OAB; Representação Refis da Crise


2008.34.00.003932-1

Arquivos:
Volume 1

IMPORTANTE: (OS NÚMEROS DE FLS. INDICADOS SÃO OS DO ARQUIVO DIGITAL. O VOLUME CORRESPONDE A UM DOS ARQUIVOS DIGITAIS QUE SÃO DIVIDIDOS EM VOLUMES)

Índice:

Identificação Fl. Vol.
Petição inicial 03 01
Decisão liminar 47 01

Última folha: 103

OBJETO: requer a concessão de medida liminar a fim de que a autoridade coatora, se abstenha de proceder qualquer espécie de desconto relativo às férias, de 30 dias, gozadas pelos Srs. Procuradores da Fazenda Nacional no presente mês de janeiro de 2.008, garantindo o recebimento do subsidio de 1/3 constitucional, respectivo na folha de fevereiro de 2.008, ou seja expedida nova folha (suplementar) garantindo o pagamento em questão, sob pena de desobediência e multa pecuniária.


2006.34.00.038197-6

Arquivos:
Volume 1
Volume 2

IMPORTANTE: (OS NÚMEROS DE FLS. INDICADOS SÃO OS DO ARQUIVO DIGITAL. O VOLUME CORRESPONDE A UM DOS ARQUIVOS DIGITAIS QUE SÃO DIVIDIDOS EM VOLUMES)

Índice:

Identificação Fl. Vol.
Petição inicial 04 01
Lista de Associados 39 01
Petição União 76 01
Decisão liminar 87 01
Embargos de Declaração Sinprofaz 101 01
Decisão Embargos 132 01
Sentença 224 01
Embargos de Declaração Sinprofaz 234 01
Embargos de Declaração União 262 01
Decisão Embargos 275 01
Apelação Sinprofaz 07 02
Contrarrazões União 34 02

Última folha: 298

OBJETO/PEDIDO:

a) O direito de 60 dias de férias anuais, com respectivo pagamento do adicional deferias de 1/3 (um terço);

b) Ou, a conversão em pecúnia do período de férias suprimido pela Lei 9.527/97. bem como o adicional de 1/3;

e) Confirmada a liminar, concedendo-se a segurança par determinar que os substituídos usufruam do direito de férias de 60 dias, acrescido do adicional constitucional, por ser medida de Justiça.