Uma das convidadas pelo SINPROFAZ para palestrar ao longo do projeto PFN e Gênero: Sensibilização, Conscientização e Diálogos foi Valéria Scarance. Promotora de Justiça, ela é professora doutora da PUC SP e coordenadora do Núcleo de Gênero do Ministério Público de São Paulo. Durante a exposição, Valéria Scarance tratou do tema da violência contra as mulheres, a qual, não obstante a evolução legislativa e a maior conscientização social, “ainda é uma séria doença do nosso país”, afirmou. Iniciada a apresentação, a professora abordou a questão da desigualdade de gênero e lembrou que “somente em 2002 alcançamos a igualdade perante as leis, pois só então desapareceram da legislação expressões como pátrio poder e chefia da sociedade conjugal”.
Valéria Scarance apresentou inovações legislativas que, aprovadas nos últimos vinte anos, vêm colaborando com a prevenção, a punição e o combate aos crimes contra a mulher. Entre as normas mencionadas, esteve a Lei 13.718/2018 que, além de outras providências, tipificou os crimes de importunação sexual e de divulgação de cena de estupro e tornou pública incondicionada a natureza da ação penal dos crimes contra a liberdade sexual e dos crimes sexuais contra vulnerável. “Existia um vácuo legislativo em relação a algumas condutas. Não tínhamos, por exemplo, um crime específico para a situação de assédio nas ruas, porque o assédio sexual se referia apenas ao ambiente de trabalho. Surgiu, então, o crime de importunação sexual”, explicou a promotora de Justiça.
Apesar dos novos marcos legislativos, o Brasil, segundo Valéria Scarance, segue sendo um país perigoso para a mulher: em 2016, a cada hora, 503 mulheres sofreram algum tipo de agressão física – um total de 4,4 milhões de vítimas. Quase um terço das brasileiras, portanto, relataram ter sofrido, naquele ano, algum dos tipos de violência previstos na Lei Maria da Penha. Levando em conta os dados, de acordo com a palestrante, “há dois tipos de mulheres: as que já identificaram as violências que sofrem ao longo da vida e as que ainda não enxergaram. Isso porque a violência não é só física. Há inúmeras formas presentes em todas as estruturas”. Para Valéria Scarance, a violência contra a mulher está naturalizada e invisibilizada nas mentes dos indivíduos, assim como o machismo.
A expositora deu destaque ao contexto da pandemia e à influência do isolamento social sobre os números da violência: o primeiro semestre de 2020 revelou queda de quase 10% na quantidade de boletins de ocorrência registrados, o que, conforme Valéria Scarance, é explicado pelo aumento do controle dos parceiros sobre as mulheres e, consequentemente, pela maior dificuldade delas em acessar as delegacias. Na contramão, houve elevação do número de medidas protetivas concedidas, assim como da quantidade de chamadas para o 190 – apenas nos primeiros seis meses do ano, a polícia militar recebeu mais de 147 mil denúncias. Com base no cenário é possível afirmar que o aumento da violência foi uma das consequências da crise sanitária provocada pelo novo coronavírus.
Segundo Valéria Scarance, “ser mulher é uma construção social” e a imposição, pela sociedade, do papel que as mulheres devem ocupar é justamente a base da violência no país: “Cerca de 50% dos feminicídios acontecem porque a mulher rompeu o relacionamento e 30%, por puro machismo, porque o homem se sentiu desrespeitado por alguma conduta dela”. A mídia, para a promotora, tem papel importante na “formação do olhar sobre a mulher” e na promoção indireta da violência que, conforme Valéria Scarance, “é democrática: atinge mulheres de todas as idades e classes sociais e de todos os níveis de instrução”.
Assista à palestra completa! Acesse agora o YouTube do SINPROFAZ: bit.ly/ValeriaScarance