Carla Cristina Garcia foi uma das convidadas do projeto PFN e Gênero: Sensibilização, Conscientização e Diálogos. A antropóloga ministra aulas de Psicologia Social e Ciências Sociais na PUC SP e orienta pesquisas na área de gênero. Pós-doutorada pelo Instituto José Maria Mora (México/DF), Carla Cristina Garcia é autora de diversos livros, entre os quais a obra Ovelhas na névoa: um estudo sobre as mulheres e a loucura, sorteada, na oportunidade do evento, pelo Grupo de Saúde Mental PFN SP. Ao público do webinar, a professora palestrou sobre A Saúde Mental das Mulheres: loucas ou sobrecarregadas? A exposição foi acompanhada e comentada pela diretora do SINPROFAZ Valéria Ferreira e pela filiada Beatriz Pereira, idealizadoras da série de eventos realizados ao longo de março.
Ao iniciar a palestra, Carla Cristina Garcia ressaltou a relevância de projetos como o PFN e Gênero. Para a professora, os debates promovidos significaram a continuação do trabalho de mulheres que, tanto na filosofia quanto no mundo prático, discutiram questões como “os preconceitos sociais que colocaram as mulheres do lado daquilo que, ao longo dos séculos, viemos a chamar de loucura e, os homens, do lado do que viemos a chamar de razão”. De acordo com Carla Cristina Garcia, o feminismo ocidental tem 300 anos de história. Ele nasceu com a Revolução Francesa e em função daquilo que o movimento não concedeu às mulheres: liberdade, igualdade e fraternidade. Segundo a professora, à época, tinha-se claro que não era possível pensar em mulheres e homens de forma isonômica.
A partir do século XVIII, conforme ensinou Carla Cristina Garcia, definiu-se o lugar das revolucionárias na sociedade. “As dissidentes tinham dois destinos básicos: a guilhotina ou o manicômio.” Já no século XIX, a psiquiatria ampliou a noção da desrazão feminina: estudos apontavam que as mulheres eram mais propensas à “histeria”, cuja origem estava, supostamente, no útero. “Era como se o corpo feminino fosse a casa de todos os males, os quais não tinham qualquer relação com a sociedade hiper repressiva.” Segundo a antropóloga, acreditava-se que, pelo fraco discernimento que possuía, a mulher não era capaz de julgar alguém. Assim, por natureza, não deveria ter qualquer relação com a vida jurídica e política do país: “O espaço público da democracia era e continua sendo masculino”.
De acordo com a palestrante, a “margem” que a mulher possui, na vida social, para exercer o pensamento e a autonomia é muito mais estreita que a do homem. Segundo Carla Cristina Garcia, “andamos praticamente sobre uma linha de equilibrista. Qualquer conduta que ultrapasse os papéis designados pela sociedade classista, racista e machista coloca imediatamente a mulher no lugar da desarrazoada, da desequilibrada”. Essa margem, conforme a professora, se estreita ainda mais se a mulher é negra e pobre. Além disso, diferentemente dos homens, as mulheres não têm espaço para “explodir”, para expressar raiva ou agressividade, o que as obriga a “implodir”: há muito mais mulheres sofrendo de depressão e tomando ansiolíticos do que homens, apontou a palestrante.
Ao findar a exposição, a professora abordou o tema da condição da mulher na pandemia. Para Carla Cristina Garcia, a “dupla jornada” feminina e a sobrecarga da mulher são questões que se naturalizaram no mundo todo. Com o princípio da industrialização na cidade de São Paulo, segundo a antropóloga, as mulheres passaram a compor a maior parte do proletariado nas tecelagens. Ainda que ocupassem esses postos no mundo privado do trabalho, continuavam responsáveis, de forma exclusiva, pelas tarefas tipicamente domésticas. “Essa realidade tem apenas 300 anos, isto é, nem sempre foi assim”, concluiu a palestrante, que completou: “A ‘dupla presença’, em casa e no trabalho, é o motivo do nosso absoluto cansaço físico e mental. A pandemia escancarou esse fato”.
Para assistir à palestra completa, acesse bit.ly/CarlaCristinaGarcia.