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Reforma Tributária: Uma breve análise da PEC nº 233/2008

André Emmanuel Batista Barreto Campello
Procurador da Fazenda Nacional
Lotação: Procuradoria da Fazenda Nacional no Estado do Maranhão

RESUMO: O presente artigo buscou analisar o Projeto de Emenda à Constituição nº 233/2008, que pretende alterar o Sistema Tributário Nacional. Almeja-se, de forma sistematizada, realizar estudo acerca da estrutura da PEC e suas principais inovações. Por meio do estudo do conteúdo da PEC nº 233/2008, à luz da doutrina e jurisprudência pátria, teceu-se análise acerca dos seus principais tópicos: o novo ICMS federal, o Imposto sobre Valor Agregado federal (IVA-F), e as alterações na forma de repartição de receitas, com a criação de novos fundos constitucionais. No estudo desta proposta de alteração da Carta Magna, foi realizado estudo acerca das alterações das regras determinantes das competências tributárias, suas conseqüências jurídicas, questionando-se, inclusive, acerca da existência de agressão ao pacto federativo. Pelo emprego de método dedutivo, tendo como premissa maior a nossa carta magna e como menor as propostas de inovações constitucionais, aplicou-se interpretação integrativa, a fim de demonstrar a constitucionalidade da PEC nº 233/2008. Por fim, conclui-se pela adequação destas inovações constitucionais, em face da necessidade de racionalização do Sistema Tributário Nacional

PALAVRAS-CHAVE: Reforma Tributária. PEC nº 233/2008. ICMS. IVA-F.

SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO; 2 A ESSÊNCIA DA REFORMA TRIBUTÁRIA: a criação de novas competências tributárias para instituição do novo ICMS; 2.1 O ICMS FEDERAL: INTRODUÇÃO; 2.2 O novo ICMS federal (art. 155-A, da PEC nº 233/08); 2.2 O novo ICMS federal (art. 155-A, da PEC nº 233/08); 2.2.1 PRINCIPAIS CARACTERISTICAS DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA PARA INSTITUIR O ICMS FEDERAL; 2.2.1.1 LEI COMPLEMENTAR FEDERAL DESCREVERÁ OS ELEMENTOS NUCLEARES DESTE TRIBUTO; 2.2.1.2 REGULAMENTAÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR QUE CRIA O ICMS; 2.2.1.3 AGRESSÕES À COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA: SANÇÕES; 2.2.1.4 ALÍQUOTAS; 2.2.1.5 LIMITAÇÕES AO PODER DE TRIBUTAR; 2.2.1.6 NÃO-CUMULATIVIDADE E SELETIVIDADE; 2.2.1.7 PRODUTO DA ARRECADAÇÃO DO NOVO ICMS E A CÂMARA DE COMPENSAÇÃO;2.2.1.8 FIM DO ICMS ESTADUAL; 3 O IVA FEDERAL: PRINCIPAIS CARACTERISTICA DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA; 4 ALTERAÇÕES NA REPARTIÇÃO DAS RECEITAS TRIBUTÁRIAS; 4.1 IMPOSTOS RESIDUAIS DA UNÃO; 4.2 FUNDO DE EQUALIZAÇÃO DE RECEITAS E FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL; 4.3 NOVAS ATRIBUIÇÕES DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO; 5 OUTRAS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA PEC Nº 233/2008; 5.1 INTERVENÇÃO FEDERAL; 5.2 MEDIDAS PROVISÓRIAS; 5.3 utilização da receita do novo ICMS como garantia; 5.4 CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS; 5.5 ALTERAÇÃO DA COMPETÊNCIA JURISDICIONAL DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA; 5.6 EXECUÇÃO EX OFFICIO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS NO ÂMBITO DA JUSTIÇA DO TRABALHO; 5.7 MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE; 6 CONCLUSÃO; 7 REFERÊNCIAS

1 INTRODUÇÃO

O Presidente da República, no exercício das suas competências constitucionais (art. 60, II e art. 84, III, da CF), enviou ao Congresso Nacional, por meio da mensagem nº 81/2008, Projeto de Emenda à Constituição Federal (PEC nº 233, apresentada em 28.02.2008), alterando o Sistema Tributário Nacional.

A análise de qualquer projeto de criação de normas constitucionais é sempre um trabalho baseado no estudo da “lei que virá”, de lege ferenda.

Pode-se afirmar que tal análise passa por três etapas distintas: analisa-se o direito existente, vislumbra-se a proposta de alteração e busca-se inferir quais as conseqüências destas modificações legislativas.

Sem sombras de dúvida exige-se do operador do Direito a utilização plena dos métodos interpretativos lógicos e sistemáticos, a fim de se verificar como as normas se introduzirão no ordenamento, em face das demais normas já existentes, e como estas novas disposições deverão ser interpretadas, sem que se produzam absurdos.

Esta advertência fica mais evidente quando se verifica que, na interpretação das disposições constitucionais, não é possível a realização da mesma a ponto de subverter a própria existência da Constituição, sob pena de obtenção de absurdo resultado, já que o legislador reformador constitucional (poder constituído) jamais poderia implodir a própria Constituição (resultado do exercício do poder constituinte)1.

Neste sentido os ensinamentos de BARROSO, ao analisar o princípio da unidade da constituição, como princípio orientador para o intérprete da nossa Carta Magna:

O papel do princípio da unidade é o de reconhecer as contradições e tensões – reais ou imaginárias – que existam entre normas constitucionais e delimitar a força vinculante e o alcance de cada uma delas. Cabe-lhe, portanto, o papel de harmonização ou “otimização” das normas, na medida em que se tem de produzir um equilíbrio, sem jamais negar por completo a eficácia de qualquer delas.2

Portanto, ao se analisar os dispositivos existentes na PEC nº 233/2008, que procura alterar o Sistema Tributário Nacional, alerta-se que o presente autor não busca extrair conclusões que desconstruam a nossa Carta Magna, ao contrário, busca harmonizar as proposições de lege ferenda ao sistema constitucional atualmente vigente. Ou seja, neste texto busca-se interpretar os dispositivos da PEC nº 233/2008, conforme a Constituição Federal, isto é:

A supremacia das normas constitucionais no ordenamento jurídico e a presunção de constitucionalidade das leis e atos normativos editados pelo poder público competente exigem que, na função hermenêutica de interpretação do ordenamento jurídico, seja sempre concedida preferência ao sentido da norma que seja adequado à Constituição Federal. Assim sendo, no caso de normas com várias significações possíveis, deverá ser encontrada a significação que apresente conformidade com as normas constitucionais, evitando sua declaração de inconstitucionalidade e conseqüente retirada do ordenamento jurídico.3

Evidente que tal artigo não pretende esgotar o tema, mas tão somente torná-lo de mais fácil compreensão ao operador do direito, concatenando os temas correlatos, que estão dispersos pela PEC, e sistematizando-os, a fim de melhor esclarecê-los ao leitor.

2 A ESSÊNCIA DA REFORMA TRIBUTÁRIA: A CRIAÇÃO DE NOVAS COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS PARA INSTITUIÇÃO DO NOVO ICMS

2.1 O ICMS FEDERAL: INTRODUÇÃO

Se fosse possível resumir a reforma tributária a ser implementada pela aprovação da PEC nº 233/2008, ela poderia ser sintetizada da seguinte forma: trata-se de uma profunda alteração das competências tributárias, em que haverá repercussão, também da repartição das receitas tributárias.

Por esta razão, para se realizar reforma tributária de tal porte era necessária a utilização da emenda constitucional, tendo em vista a necessidade de alteração destas competências tributárias.


Como sabido, a competência tributária é definida como:

O poder de criar tributos é repartido entre os vários entes políticos, de modo que cada um tem competência para impor prestações tributárias, dentro da esfera que lhe é assinalada pela Constituição. Temos assim, que Competência Tributária, ou seja, a aptidão para criar tributos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Todos tem dentro de certos limites, o poder de criar determinados tributos e definir o seu alcance, obedecidos os critérios de partilha estabelecidos pela Constituição4

O núcleo desta reforma reside, sem dúvidas, na criação do novo ICMS federal e na instituição do Imposto sobre o Valor Agregado Federal (que surgirá para substituir diversos tributos), e também nas novas formas de repartir as receitas decorrentes da arrecadação de tributos.

A Constituição Federal de 1988, originariamente, atribuiu a competência tributária para instituição do ICMS aos Estados Membros:

Em 1987 advém a Assembléia Nacional Constituinte, e nela planta-se com extraordinário vigor os anseios dos estados de “independência e autonomia financeiras” nas estiras da descentralização do poder Central.

Opera-se, então, a construção do maior conglomerador tributário de que se tem notícia na história do país, com a adesão de deputados “expertos” em tributação. As constituintes modernas, que seguem a rupturas inconstitucionais, são radicais. As que seguem “acordos de transição” são compromissórias, embora em ambas existam sempre o “elemento radical” e a “componente compromissória”. Sobre a nossa Constituinte – compromissória aqui e radical acolá – convergiram pressões altíssimas de todas as partes. Dentre os grupos de pressão há que destacar o dos Estados-Membros em matéria tributária, capitaneada pela tecnoburocracia das secretarias de fazenda dos estados. E surge o ICMS, outra vez à revela das serenas concepções dos juristas nacionais, senhores das experiências européias e já caldeados pela vivência de 23 anos de existência do ICM. Suas proposições não foram aceitas. Prevaleceu o querer dos estados. A idéia era, à moda dos IVAs europeus, fazer o ICM englobar o ISS municipal ao menos nas incidências ligadas aos serviços industriais e comerciais. O ISS municipal restou mantido. Em compensação, os três impostos únicos federais sobre (a) energia elétrica, (b) combustíveis e lubrificantes líquidos e gasosos e (c) minerais do país passaram a integrar o fato gerador do ICM, ao argumento de que são tais bens “mercadorias” que circulam. Certo, são mercadorias, mesmo a energia elétrica equiparada a “coisa móvel” pelo Direito Penal para tipificar o delito de furto. Ocorre que são mercadorias muito especiais, com aspectos específicos que talvez não devessem se submeter à disciplina genérica do ICMS. Além de englobar os impostos únicos federais da Carta de 1967, o ICM acrescentou-se dos serviços de (a) transporte e (b) comunicações em geral, ainda que municipais, antes tributados pela União, tornado-se ICM + 2 serviços = ICMS. A rigor, o ICMS é um conglomerado de seis impostos, se computando o antigo ICM, a que se pretende dar um tratamento fiscal uniforme a partir do princípio da não cumulatividade, ao suposto de incidências sobre um ciclo completo de negócios (plurifasia impositiva).5

O que existe atualmente é um tributo, que engloba pelo menos cinco hipóteses de incidência diferentes6, cuja competência tributária é atribuída a cada um dos 27 Estados e ao Distrito Federal. Cada um destes entes da Federação pode criar, no exercício da sua competência tributária privativa7, uma legislação própria (obedecendo a algumas balizas federais), e estas 27 legislações (já que cada Estado institui seu próprio ICMS) repercutem em fatos geradores ocorridos fora dos seus próprios territórios, interferindo no comércio jurídico nacional.8

O ponto de partida do presente estudo da PEC nº 233/2008, portanto, será a criação do novo ICMS federal, cuja competência legislativa passou a ser atribuída à União e cuja regulamentação e gestão se dará por meio de órgãos colegiados compostos por representantes da União e dos Estados (e DF).

Em outras palavras, o novo ICMS passa a ter uma regulamentação federal, já que a PEC nº 233/08 acrescenta à competência tributária da União, a atribuição para, por meio de lei complementar, instituir o novo ICMS federal.

Desde já, afirma-se que não há agressão ao pacto federativo (cláusula pétrea: art. 60, §4, I, da CF), tendo em vista que o que se busca não é suprimir competências tributárias para agredir a autonomia9 dos Estados membros (arts. 18 e 25 da CF).

A intenção da reforma é tão-somente racionalizar a tributação, sobretudo em relação ao ICMS (art. 155, II, da CF), o qual, apesar de ser um tributo cuja atribuição legislativa para instituí-lo (poder de tributar) foi conferida aos Estados (e ao DF: art. 147 da CF), em verdade, o mesmo possui características de tributo “federal”10, já que o seu fato gerador é a circulação de mercadoria de bens (e de determinados serviços) dentro do território nacional, não havendo razão para existência de diferentes regimes de tributação, em cada ente regional da nossa República.

Tal desiderato é manifestado, inclusive, pela exposição de motivos nº 16 que acompanhava o anteprojeto desta PEC, enviada ao Chefe do Poder Executivo federal, em 26 de fevereiro de 2008, pelo Ministro do Estado da Fazenda:

No tocante ao imposto de competência estadual sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS), tem-se, atualmente, um quadro de grande complexidade da legislação. Cada um dos Estados mantém a sua própria regulamentação, formando um complexo de 27 (vinte e sete) diferentes legislações a serem observadas pelos contribuintes. Agrava esse cenário a grande diversidade de alíquotas e de benefícios fiscais, o que caracteriza o quadro denominado de “guerra fiscal”. Para solucionar essa situação, a proposta prevê a inclusão do art. 155-A na Constituição, estabelecendo um novo ICMS em substituição ao atual, que é regido pelo art. 155, II, da Constituição, o qual resta revogado. A principal alteração no modelo é que o novo ICMS contempla uma competência conjunta para o imposto, sendo mitigada a competência individual de cada Estado para normatização do tributo. Assim, esse imposto passa a ser instituído por uma lei complementar, conformando uma lei única nacional, e não mais por 27 leis das unidades federadas.”11

2.2 O NOVO ICMS FEDERAL (ART. 155-A, DA PEC Nº 233/08)

2.2.1 PRINCIPAIS CARACTERISTICAS DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA PARA INSTITUIR O ICMS FEDERAL

A PEC nº 233/08 acresce, à nossa Carta Magna, o art. 155-A, artigo único de uma nova Seção intitulada “o imposto de competência dos Estados e do Distrito Federal”.

Por meio desta proposta, atribui-se aos Estados e ao DF, conjuntamente, a receita do produto da arrecadação do imposto incidente sobre “operações relativas à circulação de mercadorias e sobre a prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.”

Tal tributo também incidirá sobre “as importações de bem, mercadoria ou serviço, por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a finalidade” e “o valor total da operação ou prestação, quando as mercadorias forem fornecidas ou os serviços forem prestados de forma conexa, adicionada ou conjunta, com serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios”. (art. 155-A, §1º, III, “a’ e “b”).

Cria-se uma nova competência tributária para a União, a qual deverá ser exercida por meio de lei complementar12, utilizando-se o fato gerador do antigo ICMS (art. 155, II, da CF), atribuindo-se aos Estados e ao DF o produto da arrecadação deste tributo.


Em outras palavras, pode-se afirmar que a alteração da competência tributária proposta pela PEC nº 233/2008 acarreta, implicitamente, no fato de que os Estados e o DF receberão delegação, pela própria Constituição Federal, para fiscalizar e arrecadar este novo ICMS federal13. Ao se utilizar a expressão “implicitamente” o que se pretende dizer é que, nesta PEC não há a previsão expressa desta delegação (como ocorre, por exemplo, com o ITR, em relação aos Municípios, por exemplo, no art. 153, §5º, III, da CF), mas dela pode se inferir, já que não se pretende que os Estados e o DF desmontem suas estruturas fiscalizadoras (do ICMS) e também pelo fato de que em inúmeras passagens se vislumbra a possibilidade desta dupla atuação por estes entes da federação. Note-se que haverá inclusive um período de transição (art. 3º e art. 12, II, da PEC nº 233/2008).

Quando se fala que a o art.155-A atribui aos Estados tão-somente a receita do produto da arrecadação, diz-se isto porque a competência legislativa plena para a instituição do tributo (art. 6º do CTN) foi conferida à União, que deverá exercê-la por meio de lei complementar.

A iniciativa legislativa14 para deflagrar o processo legislativo da lei complementar15 que disporá sobre o novo ICMS é atribuída, exclusivamente, na forma do art. 61, §3º, (contido na PEC nº 233/2008), aos seguintes órgãos:

“I – a um terço dos membros do Senado Federal, desde que haja representantes de todas as Regiões do país;

II – a um terço dos Governadores de Estado e Distrito Federal ou das Assembléias Legislativas, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros, desde que estejam representadas, em ambos os casos, todas as Regiões do País;

III – ao Presidente da República.”

As explicações para esta restrição em relação à competência para iniciativa legislativa é dada pela exposição de motivos nº 16, que acompanhava o anteprojeto desta PEC, enviada ao Chefe do Poder Executivo federal, em 26 de fevereiro de 2008, pelo Ministro do Estado da Fazenda:

Dada a peculiaridade dessa lei complementar, que vai além da norma geral, fazendo as vezes de lei instituidora do imposto para cada Estado e o Distrito Federal, são propostas, no § 3o do art. 61 da Constituição, regras especiais para a iniciativa dessa norma, que ficará a cargo do Presidente da República ou de um terço dos Senadores, dos Governadores ou das Assembléias Legislativas, sendo que nessas hipóteses deverão estar representadas todas as Regiões do País. Tal configuração tem o objetivo de prover maior estabilidade à legislação do imposto, que, com isso, estará sujeita a um menor volume de propostas de alteração.16

Isto posto, necessário agora vislumbrar pontos específicos do novo ICMS, os quais, para fins didáticos, são expostos em tópicos, a fim de melhor compreensão das propostas de inovação constitucional:

2.2.1.1 LEI COMPLEMENTAR FEDERAL DESCREVERÁ OS ELEMENTOS NUCLEARES DESTE TRIBUTO

O §6º, do art. 155-A, da PEC nº 233/08, prescreve que competirá à lei complementar nacional definir os seguintes aspectos nucleares deste novo tributo:

“I – definir fatos geradores e contribuintes;

II – definir a base de cálculo, de modo que o próprio imposto a integre;

III – fixar, inclusive para efeito de sua cobrança e definição do estabelecimento responsável, o local das operações e prestações;

IV – disciplinar o regime de compensação do imposto;

V – assegurar o aproveitamento do crédito do imposto;

VI – dispor sobre substituição tributária;

VII – dispor sobre regimes especiais ou simplificados de tributação, inclusive para atendimento ao disposto no art. 146, III, “d”;

VIII – disciplinar o processo administrativo fiscal;

IX – dispor sobre as competências e o funcionamento do órgão de que trata o §7º, definindo o regime de aprovação das matérias;

X – dispor sobre as sanções aplicáveis aos Estados e ao Distrito Federal e seus agentes, por descumprimento das normas que disciplinam o exercício da competência do imposto, especialmente do disposto nos §§ 3º a 5º;

XI – dispor sobre o processo administrativo de apuração do descumprimento das normas que disciplinam o exercício da competência do imposto pelos Estados e Distrito Federal e seus agentes, bem como definir órgão que deverá processar e efetuar o julgamento administrativo.”

Os elementos nucleares da norma tributária (art. 97 do CTN) deverão vir contidos, pela PEC, na lei complementar nacional, que criará um ICMS único a viger em toda a Federação.

A hipótese de incidência, a definição da base de cálculo, os elementos referentes à qualificação do contribuinte, bem como as hipóteses para extinção do crédito tributário e a padronização do procedimento administrativo tributário, serão todos objeto de disposição desta lei. Procura-se conferir um tratamento uniforme, para uma matéria que está fragmentada entre os Estados da Federação.

2.2.1.2 REGULAMENTAÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR QUE CRIA O ICMS

As atribuições para promover a regulamentação deste tributo (art. 99 do CTN), sem poderes de inovação, serão conferidas a órgão colegiado composto por agentes públicos dos Estados e Distrito Federal, presidido por representante da União (sem direito à voto), que terão atribuições para dispor sobre: parcelamento; hipóteses de anistia, remissão, moratória e transação; fixar prazos para recolhimento do tributo; bem como critérios e procedimentos fiscalizatórios que ultrapassem o território de cada Estado da federação (art. 155-A, §7º).

Na verdade, trata-se do CONFAZ, que passará a ter poderes para promover a regulamentação do ICMS federal.


O regulamento do novo CONFAZ, bem como suas atribuições e procedimentos de deliberação, deverão vir previstos na lei complementar que criar o ICMS, na forma do art. 155-A, §6º, IX.

2.2.1.3 AGRESSÕES À COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA: SANÇÕES

O §8º, do art. 155-A da PEC nº 233/08, cria, também sanções por eventual agressão às competências tributárias inseridas no texto constitucional, permitido-se que, se agredidas tais disposições, seja possível a aplicação de penalidades, na forma da lei complementar, tanto ao ente político violador (Estados e DF), com sujeição deste a multas, retenção dos recursos oriundos das transferências constitucionais e seqüestro de receitas; quanto ao agente público que a perpetrou, que poderá se sujeitar às seguintes sanções: multas, suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário (o que nos poderia levar a crer que se pretende que tal prática seja compreendida como um ato de improbidade administrativa).

A União poderá reter as transferências constitucionais aos Estados, ou ao DF, nas hipóteses de agressão às competências tributárias estabelecidas em relação ao novo ICMS (art. 155-A, §8º, I c/c art. art. 160, §2º, com a redação conferida pela PEC nº 233/2008).

A lei complementar que instituir o novo ICMS também deverá dispor sobre as sanções aplicáveis aos Estados e ao Distrito Federal e seus agentes, por descumprimento das normas que disciplinam o exercício da competência deste tributo (art. 155-A, §6º, X) e também estabelecerá o processo administrativo de apuração do descumprimento das normas que disciplinam o exercício da competência do imposto pelos Estados e Distrito Federal e seus agentes, bem como definir órgão que deverá processar e efetuar o julgamento administrativo (art. 155-A, §6º, XI)

2.2.1.4 ALÍQUOTAS

As alíquotas17 deste tributo federal serão fixadas pelo Senado Federal, por meio de Resolução (art. 155-A, §2º, I, da PEC nº 233/08), o qual também terá atribuição para, por meio da mesma espécie legislativa, definir “a alíquota padrão aplicável a todas as hipóteses não sujeitas a outra alíquota”, bem como o “enquadramento de mercadorias e serviços nas alíquotas diferentes da alíquota padrão” (art. 155-A, §2º, II, da PEC nº 233/08).

A lei complementar nacional, que instituir o novo ICMS, definirá sobre quais mercadorias (e serviços) os Estados (e o DF) poderão, por meio de lei própria, alterar as alíquotas do ICMS federal incidente sobre aqueles bens (e serviços), indicando também os limites e as condições para o exercício desta competência (art. 155-A, §2º, V, da PEC nº 233/2008). Nestas hipóteses o Senado Federal não poderá fixar tais alíquotas por meio de Resolução.

2.2.1.5 LIMITAÇÕES AO PODER DE TRIBUTAR

As alíquotas poderão ser reduzidas ou restabelecidas por atos do órgão colegiado, o que por si só constitui uma exceção à legalidade (art. 150, I, CF), como previsto no art. 155-A, §7º, da PEC nº 233/2008.

Será possível a criação de isenções, por meio de convênios interestaduais, na forma do §4º, I, do art. 155-A c/c art 150, §6º, da CF. Todas as demais isenções deverão estar prevista na lei complementar que cria tal tributo.

Ademais é importante frisar as importantes imunidades tributárias18 que excluem a incidência deste tributo, elencadas no §1º, IV, do art. 155-A, da CF:

a) as exportações de mercadorias ou serviços, garantida a manutenção e o aproveitamento do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores;

b) o ouro, nas hipóteses definidas no art. 153, § 5o;

c) as prestações de serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita.

Não se aplica, ao novo ICMS federal, o princípio da anterioridade (art. 150, III, “b”, da CF), nem a “noventena” (prevista no art. 150, III, “c”, da CF), até o prazo de dois anos a contar da sua exigência, por força do disposto no art. 4º, da PEC nº 233/08. Se norma tributária, no prazo de dois anos, vier a aumentar o referido tributo, ela só produzirá efeitos 30 dias após a sua publicação, nos termos do parágrafo único, do art. 4º, da PEC nº 233/08.

2.2.1.6 NÃO-CUMULATIVIDADE E SELETIVIDADE

O novo ICMS federal será não-cumulativo19 (na forma da lei complementar) e, nas operações em que estejam sujeitas a “alíquota zero, isenção, não-incidência e imunidade”, não haverá surgimento de crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes (salvo se a lei complementar dispuser em contrário) (art. 155-A, §1º, I e II). Em outras palavras, o legislador constitucional tenta evitar futuros litígios decorrentes da natureza não-cumulativa deste tributo. O novo ICMS poderá ser seletivo, isto é suas alíquotas (fixadas por Resolução do Senado Federal, na forma do art. 115-A, §2º, I, da PEC nº 233/2008) poderão variar em face da quantidade e do tipo de consumo (art. 155-A, §2º, IV).

2.2.1.7 PRODUTO DA ARRECADAÇÃO DO NOVO ICMS E A CÂMARA DE COMPENSAÇÃO

Nos termos do art. 155-A, §1º, III, “a”, c/c art. 155-A, §3º, I contido na PEC nº 233/2008, o produto da arrecadação do imposto, nas operações interestaduais, competirá ao Estado de destino da mercadoria, salvo em relação à parcela equivalente a 2% sobre a base de cálculo do imposto, que será atribuída ao Estado de origem (art. 155, §3º, II, da CF). Nas operações em que o valor do tributo seja irrisório, a totalidade deste pertencerá ao Estado de origem (art. 155, §3º, II, “a”).

Observe-se que nas operações com petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica, o imposto pertencerá integralmente ao Estado de destino (art. 155, §3º, II, “b”).

Pelo texto da PEC nº 233/2008, fica criada também uma câmara de compensação (entre os estados federados) com a finalidade de obrigar o Estado de origem a transferir, ao Estado de destino, o montante global do imposto. A esta câmara de compensação, também poderá ser atribuída parcela do produto da arrecadação deste imposto com a única finalidade de liquidar as obrigações do estado relativas a operações e prestações interestaduais (art. 155-A, §3º, III, da PEC nº 233/2008).

2.2.1.8 FIM DO ICMS ESTADUAL

O antigo ICMS vigorará até o 7º ano subseqüente à promulgação desta PEC. No curso deste prazo haverá uma uniformização das alíquotas dos ICMS estaduais, com a padronização também de normas referentes à constituição de créditos fiscais, bem como lei complementar poderá dispor, nas operações interestaduais, sobre a destinação do produto da arrecadação do tributo. (art. 3º, da PEC nº 233/2008)

3 O IVA FEDERAL: PRINCIPAIS CARACTERISTICA DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

A PEC nº 233/2008 acrescentou, ao rol de competências tributárias privativas20 da União, o poder para que este ente da Federação institua imposto sobre “operações com bens e prestações de serviços, ainda que as operações e prestações se iniciem no exterior” (art. 153, VIII, da PEC nº 233/08).


O próprio legislador constitucional reformador nos apresenta indicativo para compreensão do que seria prestação de serviços: “considera-se prestação de serviço toda e qualquer operação que não constitua circulação ou transmissão de bens”, ou seja, poderá ser prestação de serviços tudo aquilo não constituir circulação de bens, ou que não esteja sob a incidência do novo ICMS federal (art. 155-A, a ser acrescentado pela PEC nº 233/2008).

Tal tributo também incidirá sobre as importações (art. 153, §6º, III, previsto na PEC nº 233/08) e integrará sua própria base de cálculo (art. 153, §6º, V, previsto na PEC nº 233/08).

É interessante assinalar que tal tributo não se sujeita ao princípio da anterioridade, por força da nova redação conferida pela PEC nº 233/2008, ao §1º, do art. 150, da CF, mas tão somente à noventena (art. 150, III, “c”, da CF).

Tal imposto não deverá incidir (ou seja, trata-se de uma hipótese de imunidade) sobre a exportação de operações com bens ou prestações de serviços, sendo garantida “a manutenção e o aproveitamento do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores” (art. 153, §6º, IV)

O IVA federal será não-cumulativo (na forma da lei) e, nas operações em que estejam sujeitas a “alíquota zero, isenção, não-incidência e imunidade”, não haverá surgimento de crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes (salvo se lei dispuser em contrário) (art. 153, §6º, I e II, contidos na PEC nº 233/2008). Em outras palavras, o legislador constitucional tenta evitar futuros litígios decorrentes da natureza não-cumulativa deste tributo.

Tal tributo terá por finalidade substituir a COFINS (art. 195, I, “b”, da CF), a CIDE (art. 177, §4º, da CF), o salário-educação (art. 212, §5º, da CF) e a contribuição para o PIS (art. 239, da CF), cujos respectivos dispositivos foram alterados, por força do disposto nos art. 8º e art. 13, bem como da nova redação dada ao “caput” do art. 239, da PEC nº 233/2008.

Esta intenção é manifestada, inclusive, na exposição de motivos nº 16 que acompanhara o anteprojeto desta PEC, enviada ao Chefe do Poder Executivo federal, em 26 de fevereiro de 2008, pelo Ministro do Estado da Fazenda:

No caso da União, propõe-se uma grande simplificação, através da consolidação de tributos com incidências semelhantes. Neste sentido, propõe-se a unificação de um conjunto de tributos indiretos incidentes no processo de produção e comercialização de bens e serviços, a saber: a contribuição para o financiamento da seguridade social (Cofins), a contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e a contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível (CIDE-Combustível).
Tal unificação seria realizada através da criação de um imposto sobre operações com bens e prestações de serviços – que, nas discussões sobre a reforma tributária vem sendo denominado de imposto sobre o valor adicionado federal (IVA-F) –, consubstanciada na inclusão do inciso VIII e dos parágrafos 6o e 7o no art. 153 da Constituição, bem como pela revogação dos dispositivos constitucionais que instituem a Cofins (art. 195, I, “b” e IV, e § 12 deste artigo), a CIDE-Combustíveis (art. 177, § 4o) e a contribuição para o PIS (modificações no art. 239).
Além da simplificação resultante da redução do número de tributos, esta unificação tem como objetivo reduzir a incidência cumulativa ainda existente no sistema de tributos indiretos do País. Esta redução da cumulatividade resultaria da eliminação de um tributo que impõe às cadeias produtivas um ônus com características semelhante ao da incidência cumulativa, a CIDE-Combustíveis, e da correção de distorções existentes na estrutura da Cofins e da contribuição para o PIS, as quais, pelo regime atual, têm parte da incidência pelo regime não-cumulativo e parte pelo regime cumulativo.
Vale destacar que, na regulamentação do IVA-F, será possível desonerar completamente os investimentos, através da concessão de crédito integral e imediato para a aquisição de bens destinados ao ativo permanente. Também será possível assegurar a apropriação de créditos fiscais, atualmente obstados, relativo a bens e serviços que não são diretamente incorporados ao produto final – usualmente chamados de “bens de uso e consumo” –, eliminando assim mais uma importante fonte de cumulatividade r

emanescente nos tributos indiretos federais.21

O produto da arrecadação do imposto sobre a renda (art. 153, III, da CF), do imposto IPI (art. 153, IV, da CF) e do IVA (art. 153, VIII) será repartido nos seguintes termos (art. 159, com a redação atribuída pela PEC nº 233/08):

  1. 38,2% será destinado ao financiamento da seguridade social;
  2. 6,7% será destinado ao financiamento do abono do PIS e o seguro-desemprego (nova redação do art. 239, dada pela PEC nº 233/08)
  3. lei complementar estabelecerá o percentual a ser utilizado para: (c.1) “o pagamento de subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, gás natural e seus derivados e derivados de petróleo, o financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás, e o financiamento de programas de infra-estrutura de transportes”; (c.2) “o financiamento da educação básica”.

O percentual 21,5% do IVA-F integrará o somatório das rendas para constituição o Fundo de Participação dos Estados (art. 159, II, “a”, com a redação dada pela PEC nº 233/08), enquanto que 22,5% deste tributo integrará o Fundo de Participação do

Município (art. 159, II, “b”, com a redação dada pela PEC nº 233/08).

Parcela (1,8%) deste tributo também será destinada para a constituição do Fundo de Equalização (art. 159, II, “d”), previsto no art. 5º da PEC nº 233/2008.

4 ALTERAÇÕES NA REPARTIÇÃO DAS RECEITAS TRIBUTÁRIAS

Anteriormente ao CTN/66 (Lei nº 5172/66) vigorava no Brasil um Sistema Tributário tripartite que, em base essencialmente política, consistia na coexistência de três sistemas tributários autônomos (federal, estadual e municipal), cada qual com seus impostos privativos, cujo produto da arrecadação pertencia em sua totalidade à pessoa política competente para instituí-lo.

A Comissão da Reforma Tributária de 1965, ao elaborar o anteprojeto de que resultou a Emenda Constitucional nº 18/65, teve por escopo a criação de um Sistema Tributário uno e nacional, em que se consideram conjugados os sistemas individuais de cada nível de governo, como partes integrantes de um todo.22


A quase unanimidade dos autores considera o tema Repartição das Receitas Tributárias como inserido no campo de Estudo do Direito Tributário, entretanto, para HARADA,

a repartição das receitas tributárias nenhuma relação tem com os contribuintes; interessa apenas às entidades políticas tributantes; insere-se no campo da atividade financeira do estado, objeto de estudo pelo Direito Financeiro.23

Neste mesmo sentido COÊLHO:

De observar que esta questão da repartição de receitas fiscais ou, noutro giro, das participações das pessoas políticas no produto da arrecadação das outras, não tem, absolutamente nenhum nexo com o Direito Tributário. Em verdade são relações intergovernamentais, que de modo algum dizem respeito aos contribuintes. A inclusão da seção ou, por outro lado, do assunto por ela versado, no Capítulo do Sistema tributário, constitui evidente equívoco.24

Já é tradição nas Cartas Políticas brasileiras que, logo após a outorga das competências tributárias aos entes da federação (competência tributárias privativas), haja a fixação do mecanismo de repartição das receitas tributárias, isto é, a definição dos critérios de participação de um ente da federação na arrecadação dos tributos de outros entes.Nas palavras de HARADA:

Esse critério vias, antes de mais nada, assegurar recursos financeiros suficientes e adequados às entidades regionais (estados-membros) e locais (Municípios) para o desempenho de suas atribuições constitucionais.25

Neste sentido:

[…] é uma das técnicas aptas a garantir a autonomia das ordens políticas parciais na forma federativa de Estado, uma vez que não é possível falar-se em autonomia política se inexiste a autonomia financeira.26

Outra técnica para assegurar a autonomia financeira dos entes da Federação é a distribuição das competências tributárias. Pode-se deduzir que ambas as técnicas são adotadas pela CF/88.

A PEC nº 233/2008 altera significativamente os critérios de repartição de receitas tributárias, a fim de, inclusive, evitar a guerra fiscal (com a criação de fundo para implementar o desenvolvimento regional), bem como perdas de arrecadação dos Estados em face da Reforma Tributária proposta, sobretudo com o advento do novo ICMS.

4.1 IMPOSTOS RESIDUAIS DA UNÃO

Nas palavras de ÁVILA, a competência tributária residual poderia ser assim vislumbrada:

A Constituição Brasileira prevê competência para a instituição de determinados tributos que só poderão ser instituídos mediante a edição de lei complementar: […] impostos não previstos na competência ordinária da União Federal, a serem instituídos no exercício da sua competência residual (art. 154, I). Essa exigência de lei complementar decorre do caráter extraordinário desses tributos.27

Na redação conferida ao art. 157 da CF, o percentual de 20% do produto da arrecadação dos impostos derivados do exercício da competência tributária residual da União (art. 154, I, da CF) são destinados aos Estados e ao DF.

Pela PEC nº 233/2008, o produto da arrecadação destes impostos, decorrentes do exercício desta competência tributária, deverão integrar os Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios, nos termos da redação dada ao art. 159, II, da CF, por este Projeto.

4.2 FUNDO DE EQUALIZAÇÃO DE RECEITAS E FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL

O Fundo de Equalização de Receitas (FER), a ser instituído por meio de lei complementar, tem por objetivo compensar a eventual redução de arrecadação dos Estados e do Distrito Federal em decorrência de alterações introduzidas por esta Emenda, em relação ao advento do novo ICMS (art. 155-A), na forma do art. 5º da PEC nº 233/08.

Para composição deste fundo, na forma do art. 159, II, “d”(pela PEC nº 233/08), será destinado 1,8% do produto da arrecadação do montante global do imposto sobre a renda (art. 153, III), do IPI (art. 153, IV), do IGF (art. 153, VII) e do IVA federal (art. 153, VIII), bem como dos impostos residuais da competência tributária da União (art.154, I).

O Poder Executivo da União deverá enviar ao Congresso nacional, em até 180 dias, da data da promulgação da Emenda resultante da aprovação da PEC nº 233/2008, o projeto de lei complementar com a finalidade de instituir tal Fundo de Equalização (art. 5º, §6º, da PEC nº 233/08.

Até que esta lei complementar entre em vigor, “os recursos do Fundo de Equalização de Receitas serão distribuídos aos Estados e ao Distrito Federal proporcionalmente ao valor das respectivas exportações de produtos industrializados, sendo que a nenhuma unidade federada poderá ser destinada parcela superior a vinte por cento do total.” (art. 5º, §7º, da PEC nº 233/2008).

Os Estados (e o DF) somente terão direito à percepção dos recursos deste fundo se implementarem as medidas “concernentes à emissão eletrônica de documentos fiscais, à escrituração fiscal e contábil, por via de sistema público de escrituração digital” (previstas no art. 37, XXII, da CF), nos prazos definidos na lei complementar que cria o Fundo de Equalização de Receitas (FER) (art. 5º, §5º, da PEC nº 233/2008).

Para enfrentamento das desigualdades regionais, a PEC nº 233/2008, pretende instituir um Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR, art. 161, IV), o qual terá os seus recursos oriundos de percentual (4,8%) do total da arrecadação de tributos federais (art. 159, II, “c”, acrescentado pela PEC nº 233/2008).

Parte do montante arrecadado (5%) poderá ser utilizado em regiões menos desenvolvidas do Sul e do Sudeste, sendo que, no mínimo, 60% do montante do Fundo deverá ser utilizado para o financiamento de atividades produtivas, havendo até a possibilidade de parte do montante ser repassado para fundos estaduais de desenvolvimento (art. 161, IV, com a redação dada pela PEC nº 233/2008)

4.3 NOVAS ATRIBUIÇÕES DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

O art. 161 da Constituição, por meio da PEC nº 233/08, passará a conferir novas atribuições ao Tribunal de Consta da União, o qual terá a missão de estabelecer normas para a entrega dos recursos para o Fundo de Participação dos Estados, para o Fundo de Participação dos Municípios28 e para o Fundo de Equalização de Receitas, bem como estabelecerá a normatização para aplicação e distribuição de recursos para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (art. 7º da PEC nº 233/2008):


“Art. 161. omissis

I – estabelecer os critérios de repartição das receitas para fins do disposto no art. 158, parágrafo único, I;

II – estabelecer normas sobre a entrega dos recursos de que trata o art. 159, II, “a”, “b” e “d”, especialmente sobre seus critérios de rateio, objetivando promover o equilíbrio sócioeconômico entre Estados e entre Municípios;

III – omissis;

IV – estabelecer normas para a aplicação e distribuição dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional, os quais observarão a seguinte destinação:

a) no mínimo sessenta por cento do total dos recursos para aplicação em programas de financiamento ao setor produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste;

b) aplicação em programas voltados ao desenvolvimento econômico e social das áreas menos desenvolvidas do País;

c) transferências a fundos de desenvolvimento dos Estados e do Distrito Federal, para aplicação em investimentos em infra-estrutura e incentivos ao setor produtivo, além de outras finalidades estabelecidas na lei complementar.

§ 1o O Tribunal de Contas da União efetuará o cálculo das quotas referentes aos fundos a que alude o inciso II.

§ 2o Na aplicação dos recursos de que trata o inciso IV do caput deste artigo, será observado tratamento diferenciado e favorecido ao semi-árido da Região Nordeste.

§ 3o No caso das Regiões que contem com organismos regionais, a que se refere o art. 43,

§ 1o, II, os recursos destinados nos termos do inciso IV, “a” e “b”, do caput deste artigo serão aplicados segundo as diretrizes estabelecidas pelos respectivos organismos regionais.

§ 4o Os recursos recebidos pelos Estados e pelo Distrito Federal nos termos do inciso IV, “c”, do caput não serão considerados na apuração da base de cálculo das vinculações constitucionais.”

5 OUTRAS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA PEC Nº 233/2008

5.1 INTERVENÇÃO FEDERAL

Nas palavras de SLAIBI FILHO, a intervenção seria:

[…] a medida excepcional, decorrente da forma de Estado Federal, através da qual o nível federativo mais elevado assume temporariamente as funções executivas, legislativas e administrativas, total ou parcialmente, do ente federativo imediatamente inferior, visando defender o sistema federativo através do eficiente funcionamento dos órgãos públicos nos seus limites constitucionais e legais de competência.

O objetivo da intervenção é,assim, a assunção dos serviços do ente federativo inferior, de forma excepcional e temporária, de acordo com as estritas hipóteses previstas na Constituição.”29

A PEC nº 233 acrescenta nova alínea ao art. 34, V, ao estabelecer que a União poderá intervir nos Estados quando estes retiverem parcela do novo ICMS (v.g. art. 155-A, III, contido na PEC nº 233/2008) devida a outro ente da Federação da mesma natureza.

Nesta hipótese, para iniciar o procedimento interventivo, seria necessária a solicitação do Poder Executivo do Estado prejudicado pela retenção ilícita dos repasses (art. 36, V, contido na PEC nº 233/2008).

5.2 MEDIDAS PROVISÓRIAS

As medidas provisórias, são espécies legislativas, previstas no art. 59, V, da CF, assim analisadas por MORAES:

Apesar dos abusos efetivados com o decreto-lei, a prática demonstrou a necessidade de um ato normativo excepcional e célere, para situações de relevância e urgência. Pretendendo regularizar esta situação e buscando tornar possível e eficaz a prestação legislativa do Estado, o legislador constituinte de 1988 previu as chamadas medidas provisórias, espelhando-se no modelo italiano.

Desde antes da EC nº 32/2001 (com a introdução do §2º, ao art. 62, da CF), o Supremo Tribunal Federal já admitia a possibilidade de Medida provisória dispor sobre tributos30, inexistindo, portanto, qualquer, limite material ao exercício da competência tributária por meio desta espécie legislativa, salvo nos casos de tributos que, para sua criação (ou alteração), fosse exigida lei complementar.

Ressalte-se que o art. 62, §2º, da CF, admite a instituição (ou majoração) de imposto por meio de medida provisória, estando a eficácia destes tributos, no exercício financeiro seguinte, condicionada à conversão em lei (publicação desta) da referida espécie legislativa (MP), no mesmo exercício financeiro de sua edição.31

Pela redação proposta nesta Reforma Tributária, não se aplica à instituição ou à majoração do IVA-F (art. 153, VIII, contido na PEC nº 233/2008), por meio de Medida Provisória, a necessidade de sua prévia conversão em lei, como requisito para a sua produção de efeitos (§2º, art. 62, com a redação apresentada pela PEC nº 233/2008).

5.3 UTILIZAÇÃO DA RECEITA DO NOVO ICMS COMO GARANTIA

Desde o advento da EC nº 03/2003, admitiu-se a possibilidade de vinculação, pelos Estados, Municípios e DF, de suas receitas geradas pelos seus impostos e dos seus repasses constitucionais (arts. 155 e 156, e arts. 157, 158 e 159, I, a e b, e II, da CF) para a prestação de garantia ou contragarantia à União e para pagamento de débitos para com esta (art. 167, §4º, da CF).


Pela PEC nº 233/2008, atribui-se nova redação ao §4º, do art. 167 da CF, pela PEC nº 233/08, é permitido, também, aos Estados e ao DF, a vinculação de receitas próprias geradas pelo novo ICMS como garantia ou contragarantia à União, para pagamento de seus débitos para com esta.

5.4 CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS

As contribuições sociais possuem natureza jurídica de tributos:

“As contribuições passaram a ser consideradas tributos por força da EC nº 01/69, que estabeleceu, ao lado da competência da União para instituir impostos, sua competência para instituir contribuições de intervenção no domínio econômico, de interesse da previdência social e do interesse de categorias profissionais, conforme se vê do art. 21, §2º, I, da CF/67 com a redação da EC nº 01/69, situado dentro do Capítulo V – Do sistema Tributário Nacional. Com a EC nº 08/77, porém, embora a previsão da competência da União para instituir contribuições tenhas permanecido dentro do capítulo atinente ao Sistema Tributário Nacional, houve o acréscimo do inciso X ao art. 43, que cuidava da competência legislativa da Unia, passando a constar, separadamente, a competência legislativa para dispor sobre tributos, arrecadação e distribuição de rendas (inciso I) e para dispor sobre contribuições sociais (inciso X). Tal foi suficiente para quie o STF entendesse que o Constituinte havia entendido não serem, as contribuições, tributos. A Constituição de 1988, por fim, deu-lhes tratamento dentro do Sistema Tributário Nacional e, escoimando qualquer dúvida, estabeleceu que lhes seriam aplicadas limitações constitucionais ao poder de tributar, bem como as normas gerais em matéria tributária.”32

Com a extinção da COFINS e da CSLL (art. 13, I, “d”, da PEC nº 233/08), subsiste tão-somente a competência tributária para a União instituir a contribuição social cobrada ao empregador, à empresa e à entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício. (art. 195, I, da CF, com a nova redação dada pela PEC nº 233/2008)

Em verdade, a CSLL (instituída pela Lei nº 7.689/89) será absorvida pelo Imposto de Renda (Pessoa Jurídica), por força do acréscimo do III, ao §2º, do art. 153 da CF, bem como por alteração da legislação infraconstitucional:

Outra importante simplificação que está sendo proposta é a incorporação da contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) ao imposto de renda das pessoas jurídicas (IRPJ), dois tributos que têm a mesma base: o lucro das empresas. Para tanto propõe-se a revogação da alínea “c” do inciso I do art. 195, da Constituição, sendo que os ajustes decorrentes da incorporação poderão ser feitos através da legislação infra-constitucional que rege o imposto de renda. Faz-se necessário, no entanto, um ajuste nas normas constitucionais relativas ao imposto de renda, de modo a permitir que possam ser cobrados adicionais do IRPJ diferenciados por setor econômico, a exemplo do que hoje já é permitido para a CSLL. Tal ajuste é feito através da inclusão o inciso III no § 2o do art. 153 da Constituição.33

Fica mantida a contribuição social paga pelo trabalhador (art. 195, II, da CF), mas revoga-se o inciso IV, do art. 195 da CF (art6. 13, I, “d”, da PEC nº 233/08), que admitia a instituição de contribuições sociais a serem cobradas do importador de bens ou serviços do exterior (e equiparados), já que o art. 153, §6º, III, referente ao IVA federal, admite este evento como possibilidade para definição da sua hipótese de incidência.

Não houve alteração, em relação à competência tributária, para a instituição de contribuição social incidente sobre concursos de prognóstico (art. 195, III, da CF).

Ressalte-se, por fim, que, pela alteração na redação conferida ao §12, do art. 195, pela PEC nº 233/2008, nos termos fixados lei, a agroindústria, o produtor rural pessoa física ou jurídica, o consórcio simplificado de produtores rurais, a cooperativa de produção rural e a associação desportiva podem ficar sujeitos a contribuição sobre a receita, o faturamento ou o resultado de seus negócios, em substituição à contribuição de que trata o inciso I, do “caput” do art. 195 (sobre empregador ou empresa, com base nos rendimentos pagos a qualquer título), hipótese na qual não se aplica o disposto no art. 149, § 2o, da CF (não-incidência das CIDEs e das contribuições sócias sobre as receitas decorrentes das exportações)

5.5 ALTERAÇÃO DA COMPETÊNCIA JURISDICIONAL DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Para MORAES, tal órgão jurisdicional poderia ser assim compreendido:

Assim como podemos afirmar que o STF é o guardião da Constituição, também podemos fazê-lo no sentido de ser o STJ o guardião do ordenamento jurídico federal.34

As atribuições do Superior tribunal de Justiça podem ser classificadas em originária e recursal. Nesta última, pode-se identificar a competência recursal originária e a especial, que agora nos interessa.

A competência jurisdicional para processar e julgar o recurso especial é atribuída ao STJ. O recurso especial seria aquele que :teria por escopo “garantir a efetividade e a uniformidade de interpretação do direito objetivo em âmbito nacional”, sendo admissível daquela “decisão de que já não caiba mais recurso ordinário e que tenha contrariado ou negado vigência a tratado ou a lei federal.”.35

Pela PEC nº 233/2008, passará a competir, ao STJ, processar e julgar o recurso especial das causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais (art. 107 da CF), Tribunais de Justiça (art. 125 da CF) e Tribunais de Justiça do Distrito Federal e Territórios (art. 92, VII, da CF) que almeje a revisão da decisão que contrarie lei complementar que institua o novo ICMS ou a sua regulamentação, ou que lhe negue vigência ou lhes confira interpretação divergente da que lhes tenha atribuído outro tribunal (alínea “d”, do Inciso III, do art. 105, acrescentada pela PEC nº 233/2005).

Eis as razões apresentadas na exposição de motivo nº 16, pelo Ministro da Fazenda, ao Presidente da República, para esta alteração da competência do Superior Tribunal de Justiça:

Mais uma vez, em função da peculiaridade do modelo proposto, com suas regras nacionais sendo aplicáveis diretamente pelos Estados e julgadas nas respectivas justiças estaduais, prevê-se alteração no art. 105 da Constituição, conferindo-se ao Superior Tribunal de Justiça a competência para o tratamento das divergências entre os Tribunais estaduais na aplicação da lei complementar e da regulamentação do novo ICMS.36

5.6 EXECUÇÃO EX OFFICIO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS NO ÂMBITO DA JUSTIÇA DO TRABALHO

A Justiça do Trabalho, após o advento da EC nº 20/98, passou a deter competência jurisdicional para promover a execução de contribuições socais decorrentes das sentenças que proferir, como ensina TEIXEIRA FILHO:


“Durante largo período, muito se discutiu, nos foros da doutrina e da jurisprudência, sobre a competência da justiça do trabalho para promover execuções relativas a contribuições previdenciárias e ao Imposto de Renda.

Encontrava-se no auge essa controvérsia quando adveio a emenda constitucional n. 20, de 12 de dezembro de 1998 (DOU de 16 do mesmo mês), que introduziu o §3º no art. 114 da Constituição Federal, com esta redação: “Compete ainda à Justiça do Trabalho executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir”.

A contar daí, a Justiça do trabalho ficou dotada de competência para executar as contribuições devidas à Previdência Social. Essa competência, todavia é reflexa ou derivada, uma vez que pressupõe a existência de sentença ou acórdão condenatório proferido pela Justiça do Trabalho. Assim, sem uma lide trabalhista preexistente, não se pode cogitar da competência desta Justiça Especializada para executar contribuições previdenciárias, ainda que estas possuam origem em um contrato de trabalho.”37

Tal competência foi mantida pela EC nº 45/2004, ao acrescentar o inciso VIII, ao art. 114, da Constituição Federal38.

Pela PEC nº 233/2008, os órgãos da Justiça do Trabalho continuam a possuir competência para executar, de ofício, inclusive, as contribuições sociais previstas no art. 195, I (a cargo do empregador, incidente sobre a folha de salários e rendimentos pagos a qualquer título) e II (a cargo dos trabalhadores, incidentes sobre a sua remuneração), bem como seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças prolatadas por estes órgãos jurisdicionais. (nova redação ao inciso VIII, art. 114, contido na PEC nº 233/2008).

5.7 MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE

A própria lei (Lei Complementar nº 123/2006) fornece o conceito de microempresa e empresa de pequeno porte:

Art. 3o Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte a sociedade empresária, a sociedade simples e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que:

I – no caso das microempresas, o empresário, a pessoa jurídica, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais);

II – no caso das empresas de pequeno porte, o empresário, a pessoa jurídica, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil reais).

Nos termos do art. 146, III, “d”, da CF (com a redação dada pela PEC nº 233/2008), as microempresas e empresas de pequeno porte também terão tratamento diferenciado e favorecido, nos termos de lei complementar, inclusive em relação ao novo ICMS (art. 155-A) e ao IVA-F (Art. 153, VIII).

6 CONCLUSÃO

Como apresentado na introdução, o presente artigo não busca exaurir o tema, mas tão-somente apontar ao leitor os principais pontos do projeto de Reforma Tributária previsto pela PEC nº 233/208, o qual, na sua essência, poderia ser resumido na idéia de alteração de competências tributárias, a fim de melhor sistematizar a estrutura fiscal brasileira.

A Reforma Tributária tem como cerne a alteração da competência tributária para a criação do ICMS e a instituição de poderes para que a União possa criar o IVA Federal, o qual absorveria, sobretudo, a PIS, a COFINS e a CIDE.

A importância desta reforma fica evidente quando se depara com alguns números, apresentados por ALVARENGA39:

  1. no ano de 2000, o ICMS representou mais de 20% da receita tributária do valor global arrecadado por todos os entes da federação;
  2. 70% da arrecadação tributária de toda a federação brasileira derivava, em 2000, apenas dos seguintes tributos ICMS, contribuições para a Previdência Social (lei nº 8212/91), Imposto sobre a Renda, COFINS e FGTS;
  3. No grupo dos dez maiores tributos, é evidente a elevado crescimento da incidência de tributos cumulativos no total da receita tributária da federação (COFINS: 10,9%; e PIS: 4,0%).

Tal situação foi, inclusive, reconhecida pelo próprio executivo federal, o qual, na sua Cartilha da Reforma Tributária40, na qual se vislumbra que os tributos, quando cumulativos (PIS/COFINS, CIDE, ICMS e ISS), implicariam um impacto sobre a economia de modo a transferir 1,9% do PIB para o poder público.

Na verdade, o que ocorre é que o sistema tributário brasileiro perdeu, à luz da teoria econômica, há um bom tempo, a característica da neutralidade, ou seja, que tributação está introduzindo profundas alterações nos mecanismos de funcionamento da economia de mercado e interferindo substancialmente na alocação dos capitais existentes.

Isto se corrobora com algumas conclusões extraídas da mesma Cartilha da Reforma Tributária, a seguir transcritas:

Além da cumulatividade, o custo dos investimentos é elevado devido ao longo prazo de recuperação dos créditos dos impostos pagos sobre os bens de capital. Uma empresa leva 48 meses para compensar o ICMS pago na compra de uma máquina (ao ritmo de 1/48 por mês) e 24 meses para compensar o PIS/Cofins.

O custo efetivo deste diferimento depende da situação financeira da empresa. Para uma empresa líquida corresponde ao que deixa de receber por não aplicar os recursos no mercado financeiro. Para uma empresa endividada, corresponde aos juros pagos sobre o crédito que tem de tomar para financiar o longo prazo de recuperação do imposto.41


Pelo exposto, fica evidente que o atual sistema tributário brasileiro possui sérias distorções, detectadas pelo próprio Executivo federal, as quais pretendem ser sanadas pela PEC nº 233/2008 e que o debate a ser travado no Congresso Nacional será essencial para se delinear a estrutura da reforma tributária, ou mesmo se ela virá ser efetivada.

Seja como for, alguns dos principais problemas da tributação na economia brasileira já foram diagnosticados e a PEC nº 233/2008 busca efetivamente alterar o atual sistema tributário brasileiro a fim de apresentar soluções para eles.

7 REFERÊNCIAS

ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO, Vicente. Direito tributário na Constituição e no STF. 7.ed., Rio de Janeiro: Impetus, 2004.

ALVARENGA, Cleuda Maria Alvarenga. Carga Tributária Brasileira: análise da evolução histórica. 10 e 11pp, http://www.univap.br/biblioteca/hp/Mono%202001%20Rev/07.pdf, acessado em 14.03.2008.

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2005.

ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário: de acordo com a emenda constitucional n° 42, de 19.12.03.São Paulo: Saraiva, 2004.

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 3ª ed., São Paulo: Saraiva, 1999.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 17ª ed. atual., São Paulo: Malheiros Ed., 2005.

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 12ª ed., ver. e atual., Belo Horizonte: Del Rey, 2006.

CARTILHA: Reforma Tributária
http://www.fazenda.gov.br/portugues/documentos/2008/fevereiro/Cartilha-Reforma-Tributaria.pdf, acessado em 11.03.2008

CASSONE, Vittorio. Direito Tributário. 12ª ed., São Paulo: Atlas, 2000.

CASTRO, Aldemário Araújo. Direito Tributário. Brasília: Fortium, 2005, p. 104.

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 6ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2002.

DALLEGRAVE NETO, José Affonso


Artigo: A nova lei da AGU e a Constituição Federal

Artigo dos PFNs Heráclio M. de Camargo Neto e José Roberto M. Couto, publicado hoje no Valor Econômico, esclarece que a discussão sobre a nova lei da AGU vai muito além da questão corporativa.


Premissas de Direito Econômico, conforme a Nova Lei do Cade

Segunda edição da obra do Procurador da Fazenda Sérgio Augusto foi lançada também em formato digital.


Fora Adams: imprensa repercutiu carta do SINPROFAZ à presidente Dilma

Carta assinada por SINPROFAZ e UNAFE pedindo que a presidente substitua o ministro da AGU teve divulgação em veículos de circulação nacional.


Os riscos das nomeações políticas

Resultado de estudo vai ao encontro da tese defendida pelo SINPROFAZ sobre a garantia de exclusividade dos cargos aos Advogados Públicos Federais, um dos pontos em debate no PLP 205/12.


Fora Adams: SINPROFAZ formaliza pedido a Presidente Dilma

Em carta assinada em conjunto com a UNAFE, Sindicato pede a substituição do Advogado-Geral da União. Documento foi protocolado na Presidência da República nesta quarta, 12/12.


PLP 205/12: SINPROFAZ protesta contra cancelamento de audiência pública

Sindicato estava presente na Comissão de Trabalho na manhã desta quarta-feira, 12/12, para demonstrar a indignação da carreira com o adiamento desse debate.


CARTA À NAÇÃO BRASILEIRA

A Diretoria do SINPROFAZ vem a público manifestar-se sobre as medidas anunciadas pela Cúpula da Advocacia-Geral da União, capitaneada pelo Ministro Adams, com o intuito de sanear os desvios denunciados pela Operação Porto Seguro.


Exclusividade de atribuições da Advocacia Pública reiterada por tribunal

A exclusividade do exercício da Advocacia Pública por concursados foi reafirmada em decisão unânime do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES).


SINPROFAZ reforça movimento Fora Adams em mobilização na AGU

Procuradores da Fazenda Nacional se uniram hoje, 29/11, às demais carreiras da AGU para protestar contra o atual momento político da instituição.


Deputado Alex Canziani é o relator do PLP 205/12

A escolha foi confirmada na última terça-feira, 20 de novembro, pelo presidente da Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público.


AGU diz ter economizado e arrecadado R$ 2,1 trilhões

A Advocacia-Geral da União divulgou, em outubro, relatório no qual diz ter arrecadado e economizado aos cofres públicos R$ 2,1 trilhões entre 2010 e 2012. A cifra é metade do PIB do Brasil registrado em 2011 (R$ 4,1 trilhões, segundo o IBGE). O documento aponta números de arrecadação e economia na seguinte ordem: Administração Direta…


Identidade funcional: direito de PFN para certificar as prerrogativas do cargo

Em ação ordinária, Sindicato requer que documento seja fornecido aos PFNs aprovados no concurso de 2007.


SINPROFAZ atua contra usurpação de funções da Advocacia Pública

Sindicato e Forvm ingressaram como amicus curiae em ADI da Anape com propósito de defender a exclusividade do exercício de atividades restritas aos advogados públicos.


Projeto de Lei Orgânica contraria perfil da AGU

Por Simone Fagá e Ruy Telles de Borborema Neto

A Advocacia-Geral da União foi criada pela Constituição Federal de 1998 sem precedentes na História brasileira, para desempenhar uma função essencial à Justiça caracterizada pela tutela do direito no âmbito da Administração Pública Federal. Entretanto, a escassa produção teórica sobre o tema e a pouca experiência prática, aliada à incipiente identidade institucional, tornaram a AGU, desde a sua instalação em 1993, refém de diversas e frequentemente contraditórias visões sobre o modelo de advocacia pública que se pretende ver consolidado.

Não é exagero afirmar que cada advogado-geral da União tentou conferir à Instituição não apenas nova feição, como era de se esperar, mas sim tentou lhe imprimir novo caráter, algumas vezes desvinculado das balizas constitucionais.

Nunca, todavia, uma visão suscitou tanta controvérsia como o que se apresenta no projeto de nova Lei Orgânica da AGU (Projeto de Lei Complementar 205/2012), encaminhado ao Congresso Nacional em 4 de setembro desde ano.

O assunto, à primeira vista, pode parecer meramente corporativista, tendo em vista os seus reflexos sobre as carreiras da advocacia pública federal. Todavia, interessa, e muito, ao cidadão brasileiro, na medida em que impacta diretamente na atuação da Instituição que representa a União judicial e extrajudicialmente, bem como realiza as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.

A AGU tem vocação constitucional como instituição, ou seja, órgão do Estado brasileiro que exerce função complementar em relação às funções essenciais do Estado. Em verdade, a AGU não desempenha apenas função essencial à Justiça, mas sim ao funcionamento dos três Poderes. Cabe ao advogado público federal conferir estabilidade jurídica às ações e iniciativas da União, aconselhando o Poder Executivo a agir em conformidade com as leis do país e defendendo os atos da União perante o Poder Judiciário. Por isso, a necessidade de se buscar um modelo de advocacia pública federal assentado nas normas e valores constitucionais que definem o Estado Democrático de Direito.

O projeto de lei orgânica em questão, ao trazer particulares de fora dos quadros da AGU para exercer as funções constitucionais asseguradas aos advogados públicos federais concursados, compromete a segurança de uma atuação imparcial, especialmente no consultivo. O professor Celso Antônio Bandeira de Mello, no “VI Encontro Nacional dos Advogados Públicos Federais (Enafe)”, realizado em outubro deste ano, alertou para esse risco de aparelhamento institucional: “É pressuposto que o administrador não possa ter nenhuma influência sobre quem emitiu parecer jurídico. Porque, é claro que se ele tem alguma influência sobre quem emitiu o parecer, ele buscou calço em quem não estava em condições lhe oferecer calço nenhum. Quem está em cargo de comissão no serviço público, mas não é estável, quem está designado para aquela função, evidentemente não tem as condições jurídicas indispensáveis para manifestar-se com isenção e equilíbrio. Isso explica porque certos maus administradores querem cercar-se de cargos em comissão para dar parecer.”

A atual lei orgânica (Lei Complementar 73/1993) de fato não prevê qualquer impedimento para a ocupação dos cargos comissionados existentes. Entretanto, era de se esperar que uma nova proposta de Lei Orgânica da Advocacia Pública Federal apresentasse um avanço institucional no sentido da exclusividade para o exercício da função de advogado público federal aos membros concursados, pois se trata de uma exigência que decorre do artigo 131 da Constituição Federal, que estabelece a aprovação em concurso público como requisito para ingresso nos quadros da Advocacia-Geral da União.

Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal sempre se posicionou firmemente contra a usurpação das atribuições privativas de advogados públicos federais, tendo assentado que o único cargo em comissão que pode ser ocupado por pessoas estranhas à carreira é o do próprio advogado-geral da União e seu substituto (Ações Diretas de Inconstitucionalidade 159, 881, 1.679, 2.581 e 2.682).

Na nova lei orgânica, há também dispositivo que compromete a autonomia do advogado público federal, tolhendo-o naquilo que há de mais precioso e necessário no exercício profissional da advocacia pública — a expressão do livre pensamento — tornando a hierarquia técnica e a sujeição funcional dos membros a regra que, se desobedecida, passa a caracterizar erro grosseiro e infração disciplinar.

Se a cidadania é fundamento do Estado brasileiro, é também fundamento da AGU. Se o Estado brasileiro constitui-se em Estado Democrático de Direito, a AGU não pode ser senão a advocacia do Estado Democrático de Direito. Essa é a AGU que a Constituição idealizou. Essa é a AGU da luta dos advogados públicos federais. Essa é a AGU defendida pela União dos Advogados Públicos Federais do Brasil.


Simone Fagá é diretora-geral da União dos Advogados Públicos Federias do Brasil (Unafe).

Ruy Telles de Borborema Neto é membro do Conselho Fiscal da União dos Advogados Públicos Federias do Brasil (Unafe).

Revista Consultor Jurídico, 9 de novembro de 2012


O ritmo do serviço público

Certa vez, um burocrata de carreira, daqueles que já se esqueceram por que prestaram concurso e simplesmente parasitam o serviço público como se este fosse um fim em si mesmo, explicou ao servidor mais novo, que tentava fazer as coisas acontecerem de forma célere e eficiente: “Meu caro, o serviço público tem um ritmo próprio”. Leia-se: “Vá com calma, pois no serviço público as coisas não caminham assim rápida e eficazmente”.

Entretanto, o serviço público é uma das mais altas funções dentro de uma sociedade democrática. E os servidores públicos implementam as políticas públicas, notadamente para aqueles que mais precisam da escola pública, do posto de saúde, da segurança pública. Logo, o ritmo do serviço público deve ser aquele de seus melhores servidores, não o dos piores.

Assim, a cultura do serviço público eficiente e tempestivo deve ser consolidada, a fim de expurgarmos os encostados e os apaniguados, que maculam o nome de todos os servidores, ao apresentarem perfil indolente, ultrapassado e leniente, do tempo em que o Estado brasileiro era apropriado por poucos para impedir o atendimento público das necessidades de muitos.

A sociedade brasileira já demonstrou nas urnas das recentes eleições municipais de 2012 que não aceita mais velha política da ineficiência e do compadrio.

E a ladainha enfadonha e mentirosa de que o Estado é ineficiente interessa apenas aqueles poucos que se acostumaram a amesquinhar o uso da máquina pública em detrimento da maioria.

Mas não aceitamos mais essa farsa, pois, para a nova etapa que se nos apresenta, os gestores públicos devem contar com os servidores públicos concursados para mudarmos a imagem fabricada ideologicamente de que nada pode funcionar bem na esfera pública.

Então, é chegada a hora da valorização e qualificação efetivas dos servidores públicos e da assunção de metas objetivas para melhorarmos a educação, a saúde, a segurança e as demais políticas públicas, dando o salto de qualidade que países parecidos com o Brasil deram há décadas, notadamente através da adoção de uma educação pública de excelência, a qual transbordará e contaminará positivamente todas as demais áreas.

Dessa forma, se e quando você ouvir de algum arremedo de gestor público a conversa descrita acima do “Sabe como é…”, saiba que esse gestor deve ser substituído imediatamente, porque por inépcia ou corrupção, não serve mais para o país que vimos construindo, pois essa mudança de cultura já está acontecendo.

A advocacia pública federal tem dado exemplos de sobra, porque, nada obstante a tentativa ostensiva de sucateamento material e institucional da Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, os resultados colhidos por servidores altamente qualificados têm sido muito bons para a sociedade brasileira.

Esse é um caso típico de como o Estado pode funcionar, apesar de alguns gestores, quando os seus servidores têm a qualificação e a resolução para fazer a sua parte.

A atitude proativa da Advocacia Pública Federal opõe resistência inclusive a projetos de lei anacrônicos, que caminham na contramão da profissionalização do serviço público, provavelmente formulados por gestores que não leram “Coronelismo, enxada e voto” de Victor Nunes Leal, que descreve o país antigo a ser suplantado.

Portanto, nivelemos por cima o ritmo do serviço público e denunciemos os gestores ineptos e arrivistas, pois esses não têm mais lugar no serviço público brasileiro, que vimos construindo desde a promulgação da Constituição de 1988, balizadora da atuação impessoal e eficiente da Administração Pública.

Em conclusão, não nos esqueçamos: o ritmo do serviço público deve satisfação à dinâmica sociedade brasileira e aos cidadãos do outro lado do balcão: o Povo, primordial razão de ser dos servidores públicos e do Estado.

Heráclio Mendes de Camargo Neto, procurador da Fazenda Nacional e diretor do SINPROFAZ.


Comissão de Trabalho vai realizar audiência sobre o PLP 205

A Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta, 31/10, requerimento para a realização de debate sobre o projeto que atualiza a LC 73/93.


AGU divulga resultados dos últimos três anos

A despeito das enormes conquistas alcançadas pela AGU e pela PGFN, os Procuradores da Fazenda Nacional não estão sendo valorizados.


Cejuris divulga produção acadêmica de PFNs

Procuradores da Fazenda são autores de livros sobre temas de interesse da carreira e da comunidade jurídica.


AGU convoca SINPROFAZ para tratar da Lei Orgânica

O vice-AGU, Fernando Albuquerque, propôs ao presidente do Sindicato, Allan Titonelli, o debate de sugestões de alterações no Congresso Nacional ao PLP 205/12.


Comissão de Trabalho já tem pedido para realização de audiência sobre PLP 205

Deputada Andréia Zito (PSDB-RJ) encaminhou requerimento à presidência do colegiado pedindo audiência pública para discutir o projeto da nova Lei Orgânica da AGU.


Advocacia de Estado: Cícero, Demóstenes e Macunaíma

Em artigo, diretoria do SINPROFAZ sintetiza os aspectos a serem combatidos no PLP nº 205/2012, os quais precisam ser enfrentados no Congresso Nacional. Para Sindicato, nova Lei Orgânica deveria resguardar atribuições constitucionais da AGU.


Continua repercussão na imprensa sobre efeitos do PLP 205

Mais dois editoriais tratando do PLP 205/12 foram publicados em jornais de grande circulação: O Globo e Folha de São Paulo. Correio Braziliense também abordou o tema em reportagem.


Procurador da República expõe teoria, história e métodos de trabalho em Direito Constitucional

Obra do Procurador da República Daniel Sarmento tem o propósito de facilitar ao leitor o acesso ao debate teórico mais denso no domínio constitucional.


Advocacia de Estado e de governo na consultoria jurídica

Por Julio de Melo Ribeiro

Recentemente, intensificou-se, entre os membros da Advocacia-Geral da União, o debate acerca da exclusividade do exercício das funções de consultoria e assessoramento jurídicos do Poder Executivo por advogados concursados. Discussão que mantém estreito vínculo com a polêmica da advocacia de Estado versus advocacia de governo. A par de alguns argumentos político-jurídicos suscitados pelos defensores de uma ou outra teses, algumas questões me parece importante destacar.

Dada a respeitabilidade tanto dos defensores da opinião de que a consultoria jurídica da administração pública é função privativa de advogados concursados quanto dos que defendem a tese oposta, tenho por necessária a seguinte premissa: a certeza de bons propósitos. Quem defende a mencionada exclusividade não o faz por interesses corporativistas, mas porque realmente acredita que advogados concursados estão menos sujeitos à corrupção e que isso é fundamental numa área tão sensível quanto historicamente problemática como a do controle de legalidade das políticas públicas (processos de licitação e acompanhamento de contratos e convênios aqui incluídos). Já os que se alinham no front oposto certamente não objetivam se locupletar dos possíveis desvios a que a consultoria privada dá ensejo, mas acreditam, de fato, que a liberdade de nomeação, pelos ministros de Estado, dos advogados incumbidos de lhes prestar assessor amento jurídico (ou dos chefes, pelo menos) é uma consequência imperiosa do regime democrático. Legitimidade democrática ou probidade na administração pública? Qual a escolha certa a fazer?

Esse é um falso dilema, ouso ajuizar. A tese de que os ministros de Estado devem ter ampla liberdade para escolher os advogados que o auxiliarão na implementação das políticas públicas democraticamente apresentadas ao eleitor, sob pena de se inviabilizar a concretização das escolhas populares, contém, a meu ver, um irremediável equívoco de premissa: a Advocacia-Geral da União não é órgão formulador de políticas públicas, sendo sua legitimidade fundada, não no voto popular, mas na Constituição.

A advocacia pública cumpre a importante função de formatar juridicamente as ações governamentais, exercendo o controle de juridicidade dos atos administrativos. Executa essa tarefa, no entanto, sem substituir o gestor público. Um advogado da União, na consultoria e assessoramento jurídicos do Poder Executivo, diz o que seja de direito, mas sem se dar o direito de questionar o mérito das escolhas políticas do governo. Ademais, mesmo nos casos em que a lei torna obrigatória a emissão prévia de um parecer jurídico, a decisão final, inclusive quanto à questão de direito, é do agente público legitimado pelas urnas. Pelo que a livre nomeação e exoneração de advogados por ministros de Estado não é um pressuposto do regime democrático. A não ser que se admita a intromissão do advogado na esfera de discricionariedade do governante, a Advocacia-Geral da União não precisa de “arejamento” político-partidário.

A legitimidade dos órgãos da advocacia pública, já se vê, não decola do voto popular, o mesmo se dando com o Ministério Público (órgão, inclusive, que está na origem histórica da Advocacia-Geral da União), a Defensoria Pública e o próprio Poder Judiciário. O compromisso de juízes, promotores de justiça, defensores e advogados públicos é com a Constituição, fonte do dever-poder desses agentes do Estado. Tais instituições retiram a legitimidade da Constituição, e exatamente por isso também não se afastam da ideia de democracia. É que a vontade permanente do povo, aquela expressada no momento constituinte do Estado brasileiro, foi a de criar um Poder (o Judiciário) e alguns aparelhos “essenciais à Justiça”, todos marcados pelo traço da independência técnica. Independência que, para esses órgãos, é tão fundamental quanto o voto popular o é para o Congresso Nacional. Independência, ainda uma vez, que viabiliza o p róprio Estado de Direito, na medida em que o desassombro institucional é que leva um juiz a declarar a inconstitucionalidade de uma lei votada por representantes eleitos pelo povo ou que conduz um advogado da União a emitir parecer jurídico contrário à vontade do governante legitimado nas urnas.

O fato é que o instituto jurídico do concurso público consiste num dos mais robustos pilares da independência técnica dos órgãos da advocacia pública. Em caso de conflito entre a vontade da lei e a do governante, o advogado, na atividade de consultoria e assessoramento jurídicos, deve sempre opinar pela prevalência da primeira, o que já demonstra a total incompatibilidade dessa função “essencial à Justiça” com a existência de cargos de livre nomeação e exoneração. Reforçando o juízo: a legitimidade democrática dos órgãos da advocacia pública se funda na Constituição e no exercício independente da tarefa de servir à ordem jurídica. Nesse cenário, a livre nomeação e exoneração de advogados por ministros de Estado, em vez de reverenciar o regime democrático, conspurca-o.

Enquanto isso, do outro lado da balança está o argumento de que advogados concursados estão menos sujeitos à corrupção. O juízo me parece adequado, pelo menos como regra geral. Explico: é claro que não se está a dizer que advogados públicos de carreira são melhores ou mais éticos do que os outros, nem que há uma presunção de má-fé dos políticos-nomeantes. Não é nada disso! O que se tem por indiscutível é que, exercendo um cargo de livre nomeação e exoneração, o compromisso maior do advogado passa a ser com as vontades do governante, quando a ordem jurídica é que deveria estar no topo das prioridades. Se, eventualmente, a vontade de quem governa for a de atropelar a Constituição e as leis (não falo aqui, por óbvio, do exercício da discricionariedade própria – e constitucionalmente legítima – dos gestores públicos), o advogado “comissionado”, que não se submeteu a concurso público e não tem a garantia da estabi lidade (como visto acima, instrumentos essenciais da independência técnica), está mais propenso a “fazer vista grossa” do que aquele que não põe o seu cargo em risco. É da natureza humana querer salvar o próprio pescoço (no caso, o emprego).

Ademais, se olharmos não muito longe na história do Brasil, o que veremos é um passado (em alguns lugares, ainda um presente) de patrimonialismo na administração pública. Historicamente, os cargos públicos foram distribuídos aos “amigos do rei” e nem sempre para a satisfação do interesse público. Logo, o salutar princípio constitucional do concurso público, mais do que concretização do anseio por igualdade, é, sim, tentativa de resposta a desvios de finalidade na atuação administrativa.

Todo o debate aqui analisado tem relação direta com a polêmica da advocacia de Estado versus advocacia de governo. Mais: a diferença entre advocacia de Estado e advocacia de governo está, exatamente, na forma pela qual são recrutados os advogados e no nível de independência deles. Nada a ver, portanto, com o objeto em si da atuação profissional. Os advogados públicos são chamados a defender uma ação permanente do Estado, uma política transitória do governo ou até a própria pessoa do governante, no regular exercício da função pública. Tudo pode consistir tanto numa advocacia de Estado quanto numa advocacia de governo.

Será advocacia de Estado se os advogados forem recrutados por modo impessoal e tiverem a independência suficiente para, em casos-limite, optar pelo respeito à Constituição e às leis. Será advocacia de governo se os advogados forem livremente nomeados e exonerados pelo governante, ficando deles inteiramente reféns. Faz parte da rotina de uma advocacia de Estado patrocinar as causas do governo (advocacia para o governo). O que a descaracteriza é o aparelhamento do órgão pelos governantes (advocacia pelo governo). Daí, mais uma vez, a importância fundamental do concurso público.

Como se vê, decidir pela exclusividade do exercício das funções de consultoria e assessoramento jurídicos do Poder Executivo por advogados concursados, ao mesmo tempo em que não implica arredar um só milímetro do princípio democrático, importa no fortalecimento de um dos mais relevantes valores republicanos: o da probidade na administração da coisa (res) pública. Dito isso, fica fácil saber qual a escolha certa. É aquela feita pela Constituição brasileira de 1988: uma advocacia de Estado, e não de governo. Uma advocacia, às vezes, até para o governo, mas nunca pelo governo.

Julio de Melo Ribeiro é advogado da União e especialista em Direito Constitucional.


Revista Consultor Jurídico, 13 de setembro de 2012


PLP 205: Sinprofaz reitera suas críticas após repercussão na imprensa

Advogado-Geral da União, ministro Luís Adams, convocou entrevista coletiva nesta quarta, 12/9, para rebater críticas ao projeto.


Projeto sobre Lei Orgânica da AGU repercute na imprensa

PLP 205/12 foi trazido para o centro o debate em editoriais, reportagens e comentários jornalísticos. Risco de aparelhamento político da AGU chamou atenção da imprensa.


PLP 205/12: Nota oficial do SINPROFAZ

Em defesa de uma Advocacia de Estado, contra qualquer tentativa de aniquilamento institucional da Advocacia Pública Federal, o SINPROFAZ emite a presente nota.


Um governo medíocre

Um governo medíocre vilaniza os servidores públicos federais e prioriza o inchaço dos cargos em comissão sem concurso público.

Um governo medíocre sucateia o COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras, órgão que subsidia com informações relevantes as Carreiras de Estado no combate à lavagem de dinheiro e à corrupção, condenando o órgão a ter apenas dez analistas de informações, enquanto milhares de informações sensíveis são recebidas diariamente e se perdem nos escaninhos cibernéticos da falta de estrutura.

Há mais garçons uniformizados servindo cafezinhos em bandejas de prata nos palácios de Brasília do que analistas de informações no COAF combatendo a lavagem de dinheiro e a corrupção.

As fronteiras brasileiras escancaradas, mas a Policia Federal e Receita Federal do Brasil sem quadros e sem equipamentos suficientes para combater o contrabando de drogas e o descaminho de armas.

A Advocacia Pública Federal sucateada, sem prerrogativas, sem carreira de apoio, sem sistemas informatizados integrados, que já existem, mas são sonegados aos advogados públicos federais.

O IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, sucateado e esvaziado não consegue fiscalizar e combater os desmatamentos e a destruição da Amazônia, do Pantanal, da Mata Atlântica, dos Pampas e do Cerrado.

De outro lado, a mídia privada e orquestrada faz com que o governo prescinda de porta-vozes palacianos, porque distorce a justa demanda por recomposição do valor de compra dos salários do funcionalismo publico federal confundindo-a com supostos pedidos de aumento de salário.

Tirante os casos isolados em que o fosso salarial é vergonhoso, como no caso dos professores universitários, as demais categorias buscam recomposição das perdas, muito aquém dos dissídios coletivos da iniciativa privada, que contemplam ganhos reais todos os últimos anos.

Distorcem números e querem confundir a vetusta recuperação salarial do governo Lula, que apenas enfrentou os oito anos de trevas e aniquilamento dos servidores públicos federais do governo anterior àquele.

O Estado não é feito de palácios faraônicos, de prédios públicos enfileirados ou de casas civis paralelas.

O Estado brasileiro é constituído fundamentalmente por seus servidores públicos concursados, os quais impedem os oportunistas de plantão de esvaziarem os cofres públicos e ainda prestam os serviços públicos em favor do Povo, nada obstante os governos medíocres de ocasião.

Heráclio Mendes de Camargo Neto
Diretor de Assuntos Profissionais e Estudos Técnicos do SINPROFAZ


Campanha salarial: proposta do MPOG não atende à Advocacia Pública Federal

O reajuste de 15,8% até 2015 formalizado no sábado, 15/08, foi rejeitado pelos dirigentes sindicais e associativos da Advocacia e Defensoria Públicas Federais.


“A advocacia pública cresce com a democracia”

Por Marcos de Vasconcellos e Elton Bezerra Advogar para o Estado é diferente de advogar para o governo. Para Márcia Maria Barreta Fernandes Semer, presidente recentemente reeleita da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (Apesp), a diferença que, para leigos, pode parecer apenas de nomenclatura, deve ser resguardada com cuidado. A classe pode…


SINPROFAZ subscreve nota de apoio a servidor do MPOG

O servidor público César Brod pediu exoneração do cargo que ocupava por discordar dos rumos que o Governo vem dando às negociações por reajuste salarial.


Projeto visa revogar decreto que enfraquece mobilizações de servidores públicos

Deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB/SP) apresentou projeto que revoga o decreto que estipula medidas para a continuidade do serviço público durante greves, paralisações ou operações-padrão.


Grande manifestação no Ministério do Planejamento dia 8 de agosto

Mobilização reunirá entidades que representam carreiras da Advocacia e Defensoria Públicas Federais, Auditoria do Fisco e do Trabalho, Delegados e Peritos da Polícia Federal e do Ciclo de Gestão e do Núcleo Financeiro, entre elas o Sinprofaz.


AGU é Função Essencial à Justiça, e deve ser composta por Membrosconcursados

Marcos Luiz da Silva – Presidente da Associação Nacional dos Advogados da União.

A Advocacia-Geral da União, instituição criada pelo Constituinte de 1988 para defender o Estado Brasileiro e o interesse público, passando a realizar algumas das atribuições que antes pertenciam ao Ministério Público Federal, poderá sofrer um duro golpe nos próximos dias. O Governo Federal se prepara para enviar ao Congresso Nacional um anteprojeto de Lei Orgânica para a instituição que a transforma em um “sistema”, pelo menos no nome, e ainda institui a possibilidade de que Advogados Privados não concursados passem a ostentar a condição de membros da instituição, com os mesmos direitos e prerrogativas que seriam concedidas a um Advogado da União concursado.

Segundo o anteprojeto, Advogados Privados nomeados para atuar em órgãos das Consultorias Jurídicas dos Ministérios, e que ocupam DAS na Esplanada, passariam a ser considerados MEMBROS DA AGU. Estes Advogados, portanto, durante o período em que permanecessem nos cargos, seriam considerados, para todos os efeitos, Advogados da União, como se tivessem se submetido ao dificílimo concurso público para essa importante carreira, considerada pelo texto constitucional função essencial à justiça.

Assim, caso o Ministro de uma determinada pasta queira ter a sua própria AGU, e os seus próprios Advogados da União, basta que nomeie para sua Consultoria Jurídica alguém com que tem afinidade político-ideológico, talvez membro do seu próprio partido político, e afinado com as suas ideias e propostas. Em resumo: a proposta abre as portas da AGU para o aparelhamento político-ideológico da instituição, que, como órgão essencial à preservação do Estado Democrático de Direito, deveria ser preservada e afastada de qualquer possibilidade de sofrer intervenção político-partidária em seus quadros.

Há ainda a possibilidade se que um parecer proferido por um Advogado da União seja substituído no processo administrativo, caso haja a discordância do seu superior. Nada mais ofensivo à independência técnica e a imunidade que é inerente à profissão do Advogado.

Esperava-se o contrário. A expectativa da imensa maioria dos Advogados da União era de que o anteprojeto traria muitos avanços, mas sem esses retrocessos. Em pleno ano de 2012, passados 22 (vinte e dois) anos da promulgação do texto constitucional em vigor, os Advogados da União alimentavam a expectativa de que viesse um texto mais progressista, e voltado para uma blindagem da instituição contra qualquer investida política, prevendo, por óbvio, que os cargos da instituição fossem privativos de membros da carreira. Isso já foi reconhecido em inúmeros julgados pelo Supremo Tribunal Federal em relação às Procuradorias Estaduais, cujas atribuições são privativas dos Procuradores de Estado concursados. A expectativa é que a AGU e o Governo Federal, visando atender o interesse público e da sociedade brasileira, buscassem esse caminho, o que, infelizmente, parece não ser o que vem ocorrendo.

A Sociedade Brasileira precisa ficar de olho. A AGU, e os Advogados da União, atuam em importantes políticas públicas promovidas pelo Governo Federal, como PAC, Copa do Mundo, Olimpíadas, mobilidade urbana, bolsa família, saúde, enfim, em praticamente toda e qualquer iniciativa administrativa da União. Esses profissionais reconhecidamente competentes são os responsáveis pela aferição de legalidade dos atos do Poder Público federal, e orientam os gestores públicos a como praticarem atos sem ferir a Constituição e as Leis do País. Participam de atos administrativos como licitações e contratos, acompanhando, com a seu tirocínio jurídico, todos os processos judiciais propostas contra a União, alguns bilionários e de forte impacto nas contas públicas.

Os Advogados da União estão atentos a essa proposta esdrúxula, e já lançaram campanha contra a “privatização” da AGU. É preciso que o Governo Federal recue nessa proposta, tão perniciosa à nossa instituição e ao Estado Brasileiro. Com isso, estará agindo com lucidez, e cumprindo o seu desiderato constitucional, que prega um Estado Democrático e Republicano, e não um Estado sujeito ao controle personalista e de interesses que não se coadunam com o interesse público.


Nota pública contra decreto que prevê substituição de grevistas

Fórum Nacional da Advocacia Pública Federal assina nota conjunta das entidades de servidores públicos repudiando o Decreto nº 7.777/2012.


SINPROFAZ convoca reunião com PFNs em Porto Alegre na quinta-feira, 19

Sindicato conclama os PFNs do Rio Grande do Sul a participarem de reunião nesta quinta para tratar da realidade crítica da Advocacia Pública Federal frente ao descaso do Poder Executivo.


Lei Orgânica da AGU não pode ser modificada sem debates

Por Luciane Moessa de Souza

Em alguns dos temas mais sensíveis para a advocacia pública federal, os dois anteprojetos em tramitação pouco avançam ou, no caso do anteprojeto Adams, chega-se a retroceder. É o caso dos seguintes temas: a) autonomia institucional (administrativa e financeira) da Advocacia-Geral da União; b) autonomia funcional ou independência técnica e inamovibilidade de seus membros; c) necessário fortalecimento da consultoria jurídica; d) necessário avanço em termos de democratização e profissionalização da gestão, aí incluídos o preenchimento de cargos de confiança, a lotação e a distribuição de trabalhos de acordo com critérios previamente definidos, relacionados ao perfil do cargo e de seus potenciais ocupantes.

É bom notar que todos estes aspectos são facetas de uma mesma moeda: a realização de um controle de juridicidade efetivo da atuação da Administração Pública, missão primordial da advocacia pública, quando compreendida enquanto advocacia de Estado, como peça essencial na engrenagem que está presente em um verdadeiro Estado Democrático de Direito.

Também merece menção, pelas inúmeras controvérsias envolvidas, o fato de os dois anteprojetos tratarem de forma inadequada da possibilidade de utilização de meios consensuais de solução de controvérsias na esfera pública, já que as diretrizes neles contidas pouco ou nada contribuem para o avanço de tais métodos de forma segura, eficiente e democrática.

Por fim, descreverei como dois temas controvertidos de grande importância para as carreiras da advocacia pública federal são tratados de forma absolutamente inadequada pelo anteprojeto Adams: a representação judicial e extrajudicial de agentes públicos e o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais.

A autonomia institucional da Advocacia-Geral da União é assunto ignorado pelo anteprojeto Adams, ao passo que o anteprojeto Toffoli a prevê de forma bastante “tímida”, eis que sujeita aos termos de contrato de desempenho firmado com os três poderes. Cabe ressaltar que, no anteprojeto Adams, a inexistência de tal autonomia não se revela apenas na ausência de menção expressa à mesma, mas sobretudo na mal-vinda ingerência do Poder Executivo na nomeação de todos os cargos de cúpula da instituição, desde o procurador-geral federal, da União e do Banco Central, passando pelos procuradores-chefes de todas as autarquias e fundações federais até o consultor geral da União e os consultores jurídicos junto aos Ministérios — tudo nos mesmos moldes da escolha política do advogado-geral da União.

É de se reconhecer que o sistema constitucional em vigor concede a esta função o mesmo tratamento instável que caracteriza todos os cargos de ministro de Estado, já que não se assegura ao seu titular o exercício de qualquer mandato, a exemplo do que se dá com o procurador-geral da República. Todavia, se, para efeito de nomeação do advogado-geral, seria necessária uma mudança no texto constitucional, não se pode dizer o mesmo de tais funções e nada impede — muito pelo contrário, tudo recomenda — que a Lei Orgânica venha a prever critério diverso do meramente político para o preenchimento de tais cargos, bem como a existência de mandato, de modo a proteger os seus titulares de pressões políticas ilegítimas, que muitas vezes distorcem a atuação de seus ocupantes com o intuito puro e simples de permanecer no cargo.

Cabe sublinhar que o anteprojeto Adams se diferencia negativamente do elaborado durante a gestão Toffoli pelo fato de estipular que tais cargos de cúpula serão exercidos “preferencialmente” por membros da carreira, enquanto que o de Toffoli estabelece que tais cargos devem ser sempre exercidos por membros de carreira. Além disso, no anteprojeto Toffoli, a escolha dos ocupantes de tais cargos é de competência do AGU, devendo apenas serem ouvidos o ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central, para os cargos de procurador-geral da Fazenda Nacional e procurador-geral do Banco Central, respectivamente.

É evidente que não faz qualquer sentido falar em autonomia funcional ou independência técnica (como dispõe o anteprojeto Toffoli, de forma genérica, “nos termos de regulamentação do Conselho Superior da AGU”) dos membros da advocacia pública federal se nossos gestores ocuparem cargos de natureza política e não técnica. Ademais, a falta de respeito à independência técnica está evidente nos dois anteprojetos em todas as previsões de que os pareceres deverão ser aprovados por superiores hierárquicos (detentores singulares de cargos), sem jamais ser prevista a discussão de divergências por comitês de especialistas, que poderiam propiciar a uniformização do entendimento no âmbito de uma discussão de caráter técnico e aberta à participação dos interessados e detentores de argumentos relevantes.

A hierarquia entre membros da carreira, que deveria ser apenas administrativa, revela-se assim claramente técnica, com a cristalina sobreposição do critério político sobre o jurídico. No anteprojeto Toffoli, contudo, ao menos está prevista a inamovibilidade dos membros, ressalvadas as mesmas exceções constitucionalmente previstas para magistrados e membros do Ministério Público, colocando tais membros a salvo de retaliações pela via das remoções de ofício.

Aliás, é preciso notar que esta prevalência do poder político sobre o critério jurídico se expressa claramente quando não há regras prévias para distribuição dos trabalhos, como é comum na consultoria jurídica de cúpula. Este sistema permite claramente o direcionamento das atividades de acordo com a possibilidade de “influenciar” no conteúdo do parecer que será emitido. Se eventualmente algum imprevisto ocorrer e for proferido parecer que desagrade aos “superiores”, está prevista a excrescência do instituto da avocação (mantida pelos dois anteprojetos), sendo que o anteprojeto Adams “supera” qualquer precedente ao estabelecer que o parecer não aprovado deverá ser desentranhado dos autos do procedimento administrativo, de modo a prejudicar a um só tempo a transparência administrativa e a possibilidade de controle posterior da juridicidade da atuação administrativa, seja pelo controle externo, seja pelo controle social, seja pelo controle judicial.

Também é expressão clara desta renúncia à autonomia e ao reconhecimento da competência técnica da instituição para realizar controle interno de juridicidade o fato de que se mantém o sistema de pareceres jurídicos não vinculantes para a Administração Federal, a menos que o(a) presidente da República os aprove com esta finalidade. Atribui-se ao leigo, detentor de cargo político, a palavra final acerca de opinião de caráter técnico-jurídico, afrontando-se assim a lógica e os sustentáculos básicos de um Estado Democrático de Direito.

No que concerne ao controle abstrato e concentrado de constitucionalidade, os anteprojetos Toffoli e Adams se diferenciam, pois o primeiro prevê que haja manifestação do advogado-geral da União (não vinculando a posição deste, portanto, à defesa do texto questionado nas ações diretas de inconstitucionalidade), ao passo que o anteprojeto Adams tem uma redação que constitui uma contradição lógica, já que fala ao mesmo tempo em defesa do ato normativo e defesa da supremacia da Constituição, tal qual se a própria razão da instituição do controle de constitucionalidade (qual seja, a possibilidade de serem editados atos normativos inconstitucionais) inexistisse.

No que toca à profissionalização e democratização da gestão, nenhum dos dois anteprojetos, sequer de longe, prevê a necessidade de estipular critérios claros e objetivos para lotação de membros da carreira e seus servidores, para o preenchimento de funções de confiança ou para a distribuição dos trabalhos. Tais critérios somente são lembrados no que concerne à promoção. Contudo, eles são necessários não apenas para proteção de interesses corporativos, mas sobretudo para a garantia de exercício das atribuições institucionais de forma eficiente e isonômica — interesse de toda a sociedade portanto. Ainda caberia aos anteprojetos avançar na previsão de hipóteses e formato de audiências e consultas públicas. Estas estão previstas apenas no anteprojeto Adams, porém da forma centralizada que caracteriza todo o anteprojeto, como atribuição exclusiva do advogado-geral da União. Vale registrar que o anteprojeto Adams também retrocede ao não prever a Ouvidoria-Geral da Advocacia-Geral da União, extensamente detalhada no anteprojeto Toffoli.

No que tange à utilização de meios consensuais de solução de controvérsias, assim como desistências e reconhecimentos de pedidos, os dois anteprojetos mantêm a excessiva centralização de atribuições e pecam por não estipularem claramente os critérios jurídicos para prática de tais atos e homologação de atos ou acordos celebrados. Se não é adequada a celebração de transações individualmente por cada advogado público, seria muito mais apropriada a criação de comitês temáticos aptos a analisarem e homologarem tais acordos do que a concentração no advogado-geral da União — o que certamente inviabiliza a expansão desta alternativa.

Outro equívoco comum aos dois anteprojetos consiste em manter as competências atinentes aos meios consensuais no âmbito da Consultoria-Geral da União, que não tem qualquer ingerência sobre os conflitos judicializados. Por último, resta evidente a inconstitucionalidade (por violação ao princípio federativo) do anteprojeto Adams ao prever que transações entre entes federais e estados, Distrito Federal e municípios sejam firmadas sem a participação simétrica de seus órgãos jurídicos, mas tão somente sob a supervisão da AGU. O assunto que mais mereceria tratamento neste aspecto — em quais conflitos deve ser adotado o caminho consensual — não foi abordado por nenhum dos anteprojetos.

Quanto à representação judicial e extrajudicial de agentes públicos, o anteprojeto Toffoli avança, estipulando critérios para que esta situação ocorra, quais sejam, a solicitação do agente, que a controvérsia se refira a atos praticados no exercício de suas funções e na defesa do interesse público, nos termos de ato do AGU. Melhor teria feito se previsse nos termos de ato do Conselho Superior da AGU. O anteprojeto Adams simplesmente permite tal ocorrência sem estipular qualquer requisito, deixando o assunto em aberto para a lei ordinária, violando claramente a reserva constitucional de matéria atinente às atribuições institucionais da AGU à lei complementar.

Por fim, quando se trata de exercício da advocacia fora das atribuições institucionais, enquanto o anteprojeto Toffoli contém retrocesso ao não possibilitar a advocacia pro bono, atualmente permitida por ato normativo do AGU, o anteprojeto Adams, apesar de acertar ao manter esta possibilidade, passa a permitir o exercício da advocacia “quando em licença sem vencimento”, sem sequer excepcionar os casos em que há conflito de interesses entre a parte e a Administração Pública federal, abrindo as portas tanto para o uso de informações privilegiadas, com claro risco de prejuízo ao interesse público, quanto para a concorrência desleal com os advogados privados.

Em suma, o anteprojeto Toffoli, marcado pela relativa participação que caracterizou sua elaboração, consagrou alguns avanços importantes para a advocacia pública, embora devesse ir muito além do que foi. Foi, porém, esquecido pelo atual advogado-geral da União, que, às margens tanto do Conselho Superior da Advocacia-Geral da União quanto das associações que representam os membros das carreiras, elaborou um outro anteprojeto que, no que diz respeito aos temas essenciais aqui versados, apenas promoveu retrocessos.

Muitos outros temas estão presentes nos dois anteprojetos, como a descrição das atribuições da Corregedoria, as prerrogativas, deveres, vedações e impedimentos dos membros da carreira, o regime de responsabilidade, as atribuições do Conselho Superior, a incorporação da Procuradoria-Geral do Banco Central, os requisitos para aprovação no concurso, entre vários outros.

Não se trata certamente de norma que possa ser reformada de forma centralizada e arbitrária, mas sim deve ser propiciada a ampla discussão, embasada em argumentos pertinentes que permitam avançar rumo a uma advocacia de Estado efetivamente comprometida com a concretização de um Estado Democrático de Direito. Ainda não é tarde para exigirmos esta mudança de rumos.


Luciane Moessa de Souza é procuradora do Banco Central do Brasil, integrante da Associação dos Procuradores do Banco Central.

Revista Consultor Jurídico, 16 de julho de 2012


Sinprofaz convoca reunião com PFNs do Rio de Janeiro na segunda (16)

O Sinprofaz conclama os Procuradores da Fazenda Nacional do Rio de Janeiro a participarem de reunião na próxima segunda-feira (16) para tratar da realidade crítica da Advocacia Pública Federal frente ao descaso do Poder Executivo.


Entidades da Advocacia Pública Federal se reúnem em São Paulo

Integrantes da Advocacia Pública Federal de São Paulo se reuniram na Escola da AGU para deliberar ações de protesto ante ao descaso do Governo aos pleitos emergenciais das carreiras.


Advocacia e Defensoria Públicas Federais farão reuniões nos Estados

A partir da próxima semana, Dirigentes da Advocacia e Defensoria Pública Federais, Forvm, Unafe e Anadef, farão agenda em vários estados do país com o objetivo de impulsionar mobilizações locais por melhores condições de trabalho e reajuste salarial.


Lei Orgânica Nacional para Advocacia Pública é debatida em audiência na CCJC

Em audiência na CCJC da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (10), parlamentares e dirigentes da Advocacia Pública federal, estadual e municipal discutiram a possibilidade de criação de uma lei orgânica única para as três esferas de atuação.


SINPROFAZ amplia força política no Congresso

O trabalho sistemático de interlocução do SINPROFAZ no Congresso tem resultado em maior fortalecimento político para as causas da Carreira.


Marcada audiência sobre Lei Orgânica Nacional da Advocacia Pública

Será na próxima terça-feira, 10 de julho, na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados. Representantes do Forvm Nacional vão participar.


SINPROFAZ divulga recomendações do indicativo de greve

Notificar chefias sobre as condições de trabalho e entregar os pareceres jurídicos e certidões no último dia do prazo são algumas das recomendações do Sindicato.


Defesa da democracia é um compromisso de todos nós

João Carlos Souto*

De longa data a Ordem dos Advogados do Brasil tem assumido posições que transcendem a mera representação e defesa dos advogados, sua principal missão. A OAB enfrentou a ditadura militar e deu início ao processo de impeachment na década de 90 do século XX, convidando a ABI para conjuntamente assinar a petição mais tarde protocolada na Câmara dos Deputados.

No que diz respeito ao seu enfrentamento à ditadura, ela, naquele período, não se limitou na defesa das prerrogativas dos advogados; ao contrário, se manteve aberta, diligente e corajosa para os graves problemas políticos que afligiam o Brasil de fins da década de 60 ao início dos anos 80 do século XX.

A opção pela defesa da democracia e pelo enfrentamento ao establishment por certo foi o grande responsável pela conquista literalmente com sangue e suor da respeitabilidade da sociedade brasileira, que passou a identificar na OAB uma entidade civil preocupada não somente com os interesses corporativos da advocacia, mas, para além disso, uma entidade aliada na defesa do Estado Democrático de Direito.

É sintomático que após esse engajamento político/social OAB e advogados tenham obtido relevante espaço na Constituição Federal de 1988, como nunca antes na História:
indispensabilidade do advogado à administração da Justiça, participação em bancas de concurso público na área jurídica, legitimidade para deflagrar o processo de controle abstrato da constitucionalidade das leis, previsão de assento em tribunais, e, por obra do Constituinte Derivado, voz e voto nos órgãos de controle administrativo da magistratura e do Ministério Público.

Guardadas as devidas proporções defendo que o Fórum Nacional da Advocacia Pública Federal deva assumir posições para além da mera defesa das prerrogativas das carreiras que ele representa. Tanto quanto possível e sempre que esteja em evidência assunto que diga respeito à democracia, aos princípios constitucionais fundamentais, o Fórum Nacional pode e deve se manifestar.

Além da defesa da própria democracia essa postura contribui para imprimir maior visibilidade à Instituição (AGU) e as carreiras que o Fórum representa. Nessa linha, publicamos artigo na Folha de São Paulo em defesa da advocacia pública na construção das balizas legais do pré-sal, entre outras atividades de relevo para além da defesa remuneratória.

Com todo o respeito, parece-me equivocada a posição dos que defendem a atuação exclusiva do Fórum Nacional em defesa das carreiras. Não me parece a opção mais inteligente se ater as entranhas de cada carreira, identificar-se exclusivamente como uma entidade de defesa das prerrogativas, da pauta das carreiras, enfim, da corporação.

O Fórum Nacional será tanto mais forte, mais importante, mais lembrado, mais citado, se buscar, com prudência e equilíbrio, dar continuidade ao processo de abertura e inserção que procuramos imprimir durante nossa presidência (2007/2011). Evidentemente que ninguém concebe o Fórum Nacional como uma entidade a se ocupar dos problemas mundiais, claro que não. Contudo, a manifestação sobre assuntos graves, de cunho jurídico, nacional ou internacional, é sempre bem vinda e importante na construção da visibilidade do Fórum e de sua própria identidade.

E integra a nossa identidade, como cidadãos, e, mais ainda, como profissionais do Direito, responsáveis pela defesa do Estado de Direito, a democracia na América Latina. É importante lembrar que o Constituinte Originário de 1988 estabeleceu como princípio fundamental da República Federativa do Brasil, no plano internacional, a integração econômica, política, social e cultural da América Latina.

Faço essas considerações em torno da crise institucional instalada no Paraguai com a deposição do presidente Fernando Lugo, vítima de um impeachment em um processo mais que sumário. Aqui cabe uma comparação: embora Danton já soubesse o resultado do julgamento montado por Robespierre e seus comparsas, a ele, no século XVIII, não lhe foi negada a palavra, pelo menos por alguns dias. A Lugo concederam não mais que algumas horas.

A democracia se fez ausente na América Latina por largo período. Os que temos 40 anos vivemos os últimos momentos de uma ditadura militar, em que sindicatos eram fechados, imprensa amordaçada e o Ministério Público uma repartição do Poder Executivo, isso para não citar vícios ainda mais graves dos 21 anos de chumbo. Todos temos responsabilidade na defesa da democracia, para que esses episódios de triste memória não se repitam.

A democracia no Paraguai diz respeito ao Brasil, aos princípios fundamentais da nossa República, e nós da advocacia pública temos um compromisso umbilical com a defesa do Estado de Direito, com a defesa desses princípios.


*Procurador da Fazenda Nacional, professor de Direito Constitucional, ex-presidente do Fórum Nacional da Advocacia Pública Federal (2007/2011) e do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (2005/2009).

Publicado em Consultor Jurídico


A lei não veda cessão de advogado público para a Justiça

Por Paulo César Negrão de Lacerda

A Ordem dos Advogados do Brasil — Seção do Estado do Rio de Janeiro (OAB-RJ) apresentou representação junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), objetivando a instauração de procedimento de controle administrativo, em razão da nomeação de procurador da Fazenda Nacional para o exercício de cargo em comissão de assessor judiciário, no Tribunal Regional Federa da 2ª Região.

Dentre os fundamentos apresentados pela OAB-RJ, destaca-se o suposto comprometimento do equilíbrio do Poder Judiciário, em razão da nomeação de assessores oriundos da advocacia pública.

Nas palavras explicitadas na representação em questão, tal nomeação colocaria “em xeque a isenção do Judiciário, causando desequilíbrio de forças no processo, uma vez que os procuradores da Fazenda Nacional atuam representando uma das partes nos processos que envolvem matéria tributária de interesse da União Federal”.

Para aferir a procedência da referida representação, é preciso examinar, primeiramente, se tal cessão estaria em consonância com a Constituição e com as leis em vigor.

Como se sabe, as funções de confiança e os cargos em comissão estão expressamente previstos no artigo 37, incisos II e V, da Carta da República: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

(…)
II — a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

(…)
V — as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (…)” (grifos nossos).

Por seu turno, o artigo 93, da Lei 8.112/1990, que disciplina a cessão de servidores para exercício de cargo comissionado, dispõe que “o servidor poderá ser cedido para ter exercício em outro órgão ou entidade dos Poderes da União, dos estados, ou do Distrito Federal e dos municípios”, na hipótese de “exercício de cargo em comissão ou função de confiança”.

O dispositivo em foco restou regulamentado pelo Decreto 4.050/2001, que, igualmente, prevê a cessão de servidor para “outro órgão ou entidade dos Poderes da União”.

De pronto, pode-se, então, afirmar que a ordem legal, claramente, prevê e disciplina a cessão de servidores entre os poderes da União. Cumpre, então, verificar se há alguma especificidade no caso dos advogados públicos, nomeadamente, dos membros da Advocacia-Geral da União.

A Lei Orgânica das carreiras da Advocacia-Geral da União (Lei Complementar 73/93), em seu artigo 26, esclarece que os membros daquelas carreiras têm os direitos assegurados pela Lei 8.112/90, ou seja, também estão submetidos à legislação que disciplina os servidores públicos em geral, salvo, naturalmente, se houver alguma vedação específica prevista naquela lei complementar, o que, à evidência, não é o caso.

Destarte, é certo concluir, com tranquilidade, que o Direito brasileiro não veda a cessão de servidores entre os poderes da União, sejam eles advogados públicos ou não, regulamentando devidamente a hipótese.

Mesmo havendo respaldo na legislação, cumpre verificar, ainda, se haveria a suposta violação à isenção do Judiciário, que causaria desequilíbrio de forças no processo, como aludido pela OAB-RJ.

Nessa senda, é preciso ter em mente, por primeiro, o óbvio aspecto de que a atividade jurisdicional é atribuição exclusiva e indeclinável do magistrado, sobre quem pesa toda a responsabilidade e todo o ônus da árdua tarefa de julgar. Portanto, em princípio, é a isenção e o equilíbrio do magistrado que se revelam como condições fundamentais para a imparcialidade do julgamento, não as do mero assessor, subordinado ao magistrado.

Por seu turno, a alegação de que o advogado público, cedido para ocupar cargo de assessor no Poder Judiciário, seguiria vinculado à Fazenda não se sustenta, haja vista que, na hipótese de cessão, o advogado público é afastado de suas funções e atribuições originárias e passa a exercer, em caráter exclusivo, o cargo comissionado de assessor, sendo-lhe vedado o exercício da advocacia, mesmo a institucional.

Com efeito, o artigo 12, inciso XVII, da Resolução 3/2008, do Conselho da Justiça Federal, cuida de estabelecer que, para tomar posse no cargo comissionado de assessor judiciário, CJ-2, o advogado público deve comprovar haver requerido a licença dos quadros da OAB em que esteja inscrito.

Sem dúvida, o advogado público sem inscrição regular perante a OAB ou licenciado, como no caso vertente, já não está habilitado a advogar para quem quer que seja, por força do artigo 3°, caput e parágrafo 1°, da Lei 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia).

Ou seja, uma vez cedido, o advogado público perde a condição de advogado, e, por isso mesmo, já não deve mais ser parcial, i.e., pugnar pelos interesses de seu antigo cliente, in casu, a Fazenda Pública. Muito ao revés, mercê de seu juramento, prestado na forma do artigo 12, XVII, anteriormente mencionado, seu dever passa a ser o da imparcialidade e sua subordinação ao magistrado assessorado.

Também não deve impressionar a tese de que os advogados públicos são remunerados pelo erário e, assim, de alguma forma, seriam “sócios” do Fisco, haja vista que os membros da advocacia pública federal são remunerados com recursos do Tesouro Nacional, da mesma forma que todos os juízes federais e membros do Ministério Público Federal, conforme os artigos 2° e 74, da Constituição.

Importante esclarecer, outrossim, que a remuneração dos membros da advocacia pública federal é fixa. Ou seja, não varia ao sabor do sucesso ou insucesso judicial do Fisco, assim como a de magistrados e procuradores da República (art. 1°, caput, da Lei 11.358/2006, com a redação dada pela Lei 11.490/2007).

O advogado público, portanto, uma vez cedido e empossado em cargo de assessor no Poder Judiciário, deixa de ter qualquer interesse, seja jurídico, seja econômico, no resultado das causas sob as quais é chamado a prestar seus serviços. Seu único interesse é o de colaborar da melhor forma possível com o trabalho do magistrado a que estiver vinculado. Não há, pois, qualquer conflito de interesses.

Portanto, se o advogado público, após sua cessão, é afastado dos quadros da OAB e não mais pode advogar, se não tem mais o dever de parcialidade ou de zelar de maneira especial pela Fazenda Pública na condição de seu representante judicial, se a legislação pátria não veda a aludida cessão, onde então residiria a violação à isenção do Poder Judiciário?

Em uma suposta formação ideológica do advogado público? Conforme a afirmação feita pelo senhor subprocurador da OAB-RJ, em entrevistas publicadas nesta ConJur[1] e no Jornal Valor Econômico do dia 19 do mês em curso (“É uma questão de ideologia de procuração. A pessoa que foi formada na Procuradoria e que vai para o tribunal não vai conseguir ser neutra na análise”).

Ora, tal afirmação faz carga contra a capacidade profissional dos advogados públicos, reduzidos à condição de autômatos que apenas saberiam reproduzir a suposta “formação” que lhes conferiria a advocacia pública. Como profissionais, seriam condenados a defender o Fisco eternamente, sem capacidade, por defeito de formação, para exercer qualquer outro cargo que não o de advogado público.

Essa tese, sobretudo, não se coaduna com a realidade sensível, eis que muitos advogados públicos exerceram anteriormente a advocacia em caráter privado. Muitos advogados tributaristas foram procuradores da Fazenda, assim como muitos juízes foram procuradores. De fato, alguns dos mais notáveis tributaristas e constitucionalistas em atividade são ou foram advogados públicos, dentre eles, os eminentes professores Ricardo Lobo Torres e Luis Roberto Barroso. Sem dúvida, a experiência na advocacia pública e na defesa do Estado os engrandeceu como profissionais, não o contrário, como a afirmação acima faz parecer.


Ademais, note-se que a própria OAB-RJ indicou nada menos do que 2 (dois) procuradores da Fazenda Nacional (Marcus Abraham e Ronaldo Campos e Silva) na última lista sêxtupla para o preenchimento de vaga aberta para o quinto constitucional do egrégio TRF-2ª Região. O mesmo tribunal objeto da representação em foco.

Tais procuradores — que mereceram, inclusive, o voto de um dos autores e defensores da representação em questão, Luiz Gustavo Bichara[2], vice-presidente da Comissão Especial de Assuntos Tributários da OAB-RJ — acaso, estariam infensos à “ideologia da procuração”, a que alude o senhor subprocurador da OAB-RJ? Por quais motivos?

Nem se diga que a situação, então, seria diversa, eis que os procuradores, eventualmente, empossados na condição de desembargadores perderiam inteiramente seu vínculo com a Fazenda, pois, como visto anteriormente, os advogados públicos, na condição de assessores, também o perdem (na verdade, os advogados públicos perdem seu vínculo com a própria advocacia, pois são licenciados dos quadros da OAB, como visto).

Também não procederia a, eventual, alegação de que a desvinculação de procuradores nomeados desembargadores seria definitiva, enquanto a de assessores seria meramente transitória, para, daí, concluir que, por transitória, a desvinculação dos assessores não seria suficiente para garantir sua imparcialidade.

Os cargos de advogado-geral da União e de ministro da Justiça, cujos provimentos também são essencialmente transitórios, têm sido preenchidos por advogados com notória atuação no âmbito privado — como é o caso, v.g., dos ministros Márcio Thomaz Bastos (Justiça) e Dias Toffoli (AGU) — e ninguém em sã consciência jamais duvidou que advogados, ainda que donos de grandes bancas de advocacia, pudessem exercer, com dignidade, isenção e competência, aqueles honrosos cargos.

Em verdade, a representação em causa parece desconsiderar um fato evidente: os advogados públicos são, antes de tudo, advogados. Capazes, portanto, de exercer todos os muitos papéis e desafios que se afiguram para os operadores do Direito. Hoje, defendem o Fisco. Amanhã, afastados da advocacia pública, podem estar a defender o contribuinte.

Quando a lei não lhes veda a advocacia fora das atribuições institucionais, como no caso dos procuradores do Estado do Rio de Janeiro, podem, inclusive, desempenhar os dois papéis: ora defensores do Fisco Estadual, como procuradores, ora defensores dos contribuintes em face do Fisco Federal, como advogados. Sempre com invulgar competência.

Oportuno, finalmente, destacar que a situação em debate não é uma exceção brasileira, como se vê do Decreto-Lei 545,de 14 de dezembro de 1999[3], que organiza a composição e funcionamento da secretaria e dos serviços de apoio do Tribunal Constitucional Português, que, em seu artigo 21, 1, assim dispõe:

“1 — O Presidente do Tribunal Constitucional pode recorrer à requisição de funcionários e agentes da administração directa e indirecta do Estado, incluindo empresas públicas, bem como da administração local, para o exercício de funções de apoio técnico e administrativo ao respectivo Gabinete ou recorrer a contratos em regime de prestação de serviços, os quais caducam automaticamente com a sua cessação de funções.”

Lembro-me, vivamente, do dia em que o atual presidente da OAB-RJ pediu votos aos procuradores da Fazenda Nacional, por ocasião de sua reeleição. Naquela oportunidade, declinei, entusiasmado, meu apoio pessoal, assim como muitos outros colegas.

Agora, convido todos os advogados públicos do Rio de Janeiro a uma profunda reflexão, pois, aparentemente, na ótica, hoje, prevalente na OAB-RJ, devemos ter menos direitos do que os demais advogados, eis que a representação em tablado, se for acolhida, importará em criar mais uma vedação exclusiva para os advogados públicos, além de todas aquelas que a lei já nos impõe.


[1] Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-jun-15/procuradora-cedida-assessora-trf-pivo-briga-cnj> Acesso em: 19 jun.2012

[2] Conforme noticiado pelo sítio eletrônico da OAB/RJ em 1º de março de 2012. Disponível em: <http://www.oabrj.org.br/detalheNoticia/69892/OABRJ-age-contra-sobrecarga-de-varas-e-cessao-de-procuradores.html> Acesso em: 19 jun.2012

[3] Disponível em: <http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/legislacao0202.html#art21> Acesso em 19 jun.2012.


Paulo César Negrão de Lacerda é procurador da Fazenda Nacional no Rio de Janeiro.

Revista Consultor Jurídico, 20 de junho de 2012


Divulgado resultado da eleição para CSAGU

A divulgação confirma os nomes dos Procuradores da Fazenda Carlos Barreto Campelo Roichman e Marcelo Gentil Monteiro para representação da carreira no Conselho.


Atuação do SINPROFAZ pela melhoria nas condições de trabalho

Sindicato atua em várias frentes – administrativas e judiciais – para corrigir problemas como falta de estrutura, de carreira de apoio e sistemas informatizados precários.


Eleição para CSAGU começa na segunda, 11/06

Os Procuradores da Fazenda Carlos Barreto Campello Roichman e Marcelo Gentil Monteiro formam a chapa para disputar às vagas de representantes da carreira no Conselho.