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Direito financeiro e educação. O FUNDEB: Natureza jurídica, regime de fiscalização e fixação de competências

Autor: Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, Estudos de pós-doutoramento na Universidade de Boston. Doutor e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Consultor da União. Professor do Programa de Mestrado em Direito da Universidade Católica de Brasília. Procurador da Fazenda Nacional.

Veículo: Revista da PGFN, ano 1 número 1, jan/jun. 2011

Resumo – O ensaio aproxima Direito Financeiro e Educação a partir de análise relativa ao modelo do Fundeb, no que se refere à definição da natureza jurídica do fundo, bem como no que se refere ao regime de competências para sua efetiva fiscalização.

1 Introdução e contornos do problema

O presente ensaio tem por objetivo inventariar problema recorrente de Direito Financeiro enquanto instrumento para fomento da educação. Neste contexto, pretende-se investigar a natureza do repasse de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação-Fundeb, bem como explicitarse um regime de fixação da responsabilidade pela fiscalização dos aludidos recursos. A preocupação principal consiste em se identificar a quem compete a fiscalização e acompanhamento do modelo do Fundeb, especialmente no que se refere à malversação dos recursos do fundo, em tema de responsabilização administrativa (improbidade) e penal. A questão é discutida no Supremo Tribunal Federal, suscita consequências importantíssimas para o Tribunal de Contas da União, a par de exigir da Advocacia-Pública a determinação de algumas posições, de natureza institucional.

No presente texto defende-se que a natureza jurídica do repasse de recursos do Fundeb é de feição constitucional, processando-se de modo automático, o que não se confunde com a natureza do fundo propriamente dito, que é um fundo contábil. A fiscalização dos referidos recursos é do Tribunal de Contas da União, em colaboração com os Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, e também do Ministério Público Federal e dos Ministérios Públicos Estaduais, do Distrito Federal e dos Territórios. Tem-se competência fiscalizatória concorrente, na qual o interesse da União não é apenas econômico.

Para tais fins, estuda-se, em primeiro lugar, o papel do Fundeb no contexto educacional brasileiro, especialmente com fundamento e referência no Plano Nacional de Educação. Nesse sentido, verificase o núcleo do problema: trata-se de questão muito simples que reflete as imperfeições de nosso federalismo fiscal, e seus desdobramentos no âmbito do federalismo educativo1.

Em seguida, avalia-se a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, caudalosa no assunto. O STF julga recorrentemente conflitos de competência entre o Ministério Público Federal e várias projeções de Ministério Público Estadual, a propósito da fixação de competência para o monitoramento de recursos do Fundeb, especialmente em matéria penal. Ainda menos do que dilema de Direito Público a questão é também significativo problema de Ciência Política. E por ter como pano de fundo a repartição de valores decorrentes da cobrança de tributos, é de interesse de todos quantos atuamos em favor da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

2 O Fundeb no contexto do modelo educacional brasileiro

Prognósticos e possibilidades referentes ao modelo e ao financiamento da educação no Brasil qualificam a Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001, que aprovou o Plano Nacional de Educação2 e deu outras providências. O referido plano, fixado em documento anexo à lei, estende-se por período de dez anos, isto é, alcança até o ano de 2011 (art. 1º). Dispôs-se que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deveriam, com base no plano, elaborar planos decenais correspondentes (art. 2º). Determinou-se que a União, em articulação com os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e a sociedade civil, procederia a avaliações periódicas da implementação do referido plano (art. 3º).

Determinou-se que o Poder Legislativo, por intermédio das Comissões de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados e da Comissão de Educação do Senado Federal, acompanharia a execução do plano (§ 1º do art. 3º). Fixou-se que a primeira avaliação realizar-se-ia no quarto ano de vigência da lei, cabendo ao Congresso Nacional aprovar as medidas legais decorrentes, com vistas à correção de deficiências e distorções (§ 2º do art. 3º). À União caberia instituir Sistema Nacional de Avaliação e estabelecer os mecanismos necessários ao acompanhamento das metas constantes do plano (art. 4º).

Tem-se que os planos plurianuais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios seriam elaborados de modo a dar suporte às metas constantes do Plano Nacional de Educação e dos respectivos planos decenais (art. 5º). Instituiu-se o ‘Dia do Plano Nacional de Educação’, a ser comemorado, anualmente, em 12 de dezembro, por força da Lei nº 12.012, de 2009. Principia-se o anexo com histórico relativo aos planos de educação, a partir da instalação da República entre nós.3 Lembrou-se que a educação começou a se impor como condição fundamental para o desenvolvimento do País a partir do momento em que o quadro social, político e econômico do início do século XIX começou a se desenhar4.

Pensou-se um conjunto de prioridades5. Entre elas, a garantia do ensino fundamental obrigatório de oito anos a todas as crianças de 7 a 14 anos, assegurando-se o ingresso e permanência delas na escola, bem como a conclusão do ciclo. Era também prioridade a garantia do ensino fundamental a todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria ou que não o concluíram. É o tema da erradicação do analfabetismo. Ainda, o conjunto de prioridades sugeria a ampliação do atendimento nos demais níveis de ensino – a educação infantil, o ensino médio e a educação superior.

E, especialmente, no que se refere ao financiamento do modelo, basicamente, para o ano de 1999, os recursos eram originários da rubrica manutenção e desenvolvimento do ensino – art. 212 da Constituição – (34,5%), do salário-educação (6,7%), da contribuição social sobre o lucro das pessoas jurídicas (4,8%), da contribuição social para a seguridade social (6,3%), do então fundo de estabilização fiscal (19,4%), de recursos diretamente arrecadados (2.2%), bem como de outras fontes, não objetivamente nominadas (15,9%)6.

Registrou-se também que, em 1997, os gastos com a educação, por esferas federativas, era de 23,6% por parte da União, de 47,1% por parte dos Estados e de 29,3% por parte dos Municípios. Explicitou-se, inclusive, a origem, a natureza e o modelo do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério – FUNDEF7, não mais existente, no sentido de que este era

[…] constituído por uma cesta de recursos equivalentes a 15% de alguns impostos do estado (FPE, ICMS, cota do IPI-Exp.) e dos Municípios (FPM, cota do ICMS, cota do IPI-Exp), além da compensação referente às perdas com a desoneração das exportações, decorrentes da Lei Complementar n° 87/96. Os núcleos da proposta do FUNDEF são: o estabelecimento de um valor mínimo por aluno a ser despendido anualmente (fixado em 315 reais para os anos de 1998 e 1999); a redistribuição dos recursos do fundo, segundo o número de matrículas e a subvinculação de 60% de seu valor para o pagamento de profissionais do magistério em efetivo exercício. Se o fundo, no âmbito de determinado estado não atingir o valor mínimo, a União efetua a complementação. Em 1998 esta foi equivalente a cerca de 435 milhões (Tabela 23). Para o exercício de 1999 a previsão é de que a complementação da União seja de cerca de 610 milhões (Portaria nº 286/99-MF)8.

A composição do FUNDEF, no ano de 1998, fora de 13,9% do Fundo de Participação dos Municípios, de 12,4% do Fundo de Participação dos Estados, de 66,3% do ICMS, de 1,8% do IPI-Exportação, bem como de um complemento da União, de 3,2%, a par de outras receitas. Posteriormente, o financiamento da educação no Brasil contará com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica-Fundeb, criado em 2007, e que em 2009 alcançou quase 80 bilhões de reais. Os valores são pulverizados entre as redes estaduais e municipais de ensino. Os números de distribuição são fracionados por aluno. Há piso que, uma vez não alcançado, será suplementado pela União Federal. O Fundeb é responsável pela elevação dos investimentos da educação, calculados em relação ao PIB.

O financiamento da educação resulta, e reflete, diretamente, o arranjo fiscal do modelo federativo brasileiro, especialmente no que se refere à repartição de receitas9. Conseguintemente, deve-se admitir que qualquer tentativa de se alterar o regime de responsabilidades educacionais, por parte do Estado, enfrenta constrangimento de interpretações simplistas relativas ao modelo federativo brasileiro.

Por exemplo, a União que, entre outros, cuida da educação pública de terceiro grau, conta com recursos ordinários do Tesouro (decorrentes dos impostos em geral, isto é, dos tributos não vinculados), inclusive com vinculação de 18% de tais receitas para as rubricas educacionais. A União também conta com aportes de várias contribuições sociais, e refiro-me à quota federal do salário-educação, a valores de contribuição social sobre o lucro líquido, sobre a seguridade social, receitas brutas de concursos de prognósticos, a valores do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, a par, e talvez principalmente, da aplicação do salário-educação, em quota federal, do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação-FNDE.


Aos Estados, a quem compete o gerenciamento da educação de nível médio, garante-se a vinculação de receita de impostos (25%), transferências de salário-educação, a aplicação de quotas de salário-educação, em sua dimensão estadual, além, naturalmente de recursos do FNDE. Aos Municípios, a quem se fixa responsabilidade pela educação infantil, há também a aplicação de receita de impostos (25%), subvinculações do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e da Valorização dos Profissionais da Educação-Fundeb, fundo de natureza contábil, e que foi instituído pela Emenda Constitucional nº 53, de 19 de dezembro de 2006. Municípios também contam com recursos oriundos de transferências de salário-educação, a par de outras fontes do próprio FNDE.

Leva-se em conta, também, as diretrizes da Lei nº 11.494, de 2007, na forma prevista no art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Definiu-se que a fiscalização do cumprimento, pela União, da aplicação do mínimo de 18% da receita resultante de impostos federais na manutenção e desenvolvimento do ensino, prevista no art. 212 da Constituição Federal, deverá ser realizada mediante inspeções, auditorias e análise de demonstrativos próprios, relatórios, dados e informações pertinentes. De fato, tem-se modelo de competência fiscalizatória concorrente.

Quanto ao Fundeb, dispôs-se que deverão ser encaminhados ao Tribunal de Contas da União, a cada exercício, vários dados, a serem utilizados na distribuição dos recursos do referido fundo. Definiu-se também que deverão ser encaminhados ao Tribunal de Contas da União, a cada exercício, por meio de arquivo eletrônico, vários dados, relativos ao exercício imediatamente anterior, especialmente, até 15 de março, pelo Ministério da Fazenda, os valores da arrecadação efetiva, em cada Estado e no Distrito Federal, dos impostos e das transferências de que trata o art. 3º da Lei nº 11.494, de 2007, demonstrados por fonte de receita; e, até 31 de março, pelo Ministério da Educação, o demonstrativo do ajuste anual da distribuição dos recursos do Fundeb previsto no art. 6º, § 2º, da Lei nº 11.494, de 2007, contendo os valores e os fundos beneficiários.

No que se refere à fiscalização da aplicação, no âmbito de recursos federais oriundos da complementação da União, definiu-se que esta será realizada mediante inspeções, auditorias e análise de demonstrativos próprios, relatórios, dados e informações pertinentes. E ainda, determinouse que a fiscalização a cargo do Tribunal de Contas da União será exercida inclusive junto aos órgãos estaduais e municipais incumbidos da aplicação dos recursos do Fundo, em conformidade com a programação prevista em seus Planos de Auditoria ou por determinação dos Colegiados ou Relatores; que compete à Unidade Técnica em cuja clientela esteja incluído o Ministério da Educação, bem como às Secretarias de Controle Externo nos Estados, no âmbito de suas respectivas atribuições, a execução dos trabalhos de fiscalização. No caso de indicação de ocorrência de desfalque ou desvio de dinheiro, bens ou valores públicos, o Tribunal de Contas da União examinará em cada caso a relevância das irregularidades identificadas e a materialidade dos prejuízos causados ao Fundeb, para decidir se determina a instauração ou conversão do processo em tomada de contas especial.

E assim, ao decidir, o Tribunal remeterá cópia da documentação pertinente ao respectivo Tribunal de Contas Estadual ou Municipal (no caso de São Paulo, por exemplo) para conhecimento e providências de sua alçada, bem como aos Ministérios Públicos da União e dos Estados para as medidas que entenderem necessárias quanto ao ajuizamento das ações civis e penais cabíveis.

E o plano, concretamente, realiza-se prioritariamente mediante a aplicação de recursos do Fundeb, de onde, conclusivamente, a percepção de que o mau uso dos recursos é um problema de todos, sem exclusão, e não apenas do Estado ou do Município que inadequadamente usou dos valores.

3 A natureza do Fundeb e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

A classificação dos fundos tem sido recorrentemente um problema para a Administração Pública, especialmente no que se refere aos efeitos práticos de qualquer iniciativa definitiva de taxonomia. Em âmbito federal a questão preocupa, principalmente, o Tesouro Nacional, a quem incumbe, efetivamente, o controle dos fluxos dos altíssimos valores envolvidos. Neste sentido, há previsão de fundos de gestão orçamentária, de gestão especial e de natureza contábil. O Fundeb se encontra no último grupo. Ao que consta, os fundos de gestão orçamentária realizam a execução orçamentária e financeira das despesas orçamentárias financiadas por receitas orçamentárias vinculadas a essa finalidade. De acordo com o Tesouro Nacional entre os fundos de gestão orçamentária se classificam o Fundo Nacional da Saúde, o Fundo da Criança e Adolescente e o Fundo da Imprensa Nacional, entre outros.

Os fundos de gestão especial subsistem para a execução de programas específicos, mediante capitalização, empréstimos, financiamentos, garantias e avais. Exemplifica-se com o Fundo Constitucional do Centro-Oeste, com o Fundo de Investimento do Nordeste, com o Fundo de Investimento da Amazônia. Os fundos de natureza contábil instrumentalizam transferências, redefinem fontes orçamentárias, instrumentalizam a repartição de receitas, recolhem, movimentam e controlam receitas orçamentárias (bem como a necessária distribuição) para o atendimento de necessidades específicas. É o caso do Fundo de Participação dos Estados, do Fundo de Participação dos Municípios e do Fundeb, especialmente.

O fundo é uma mera rubrica contábil. Não detém patrimônio. Não é órgão. Não é entidade jurídica. Não detém personalidade própria. É instrumento. Não é fim. Propicia meios. Eventual inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (no caso de alguns fundos) é determinação que decorre da necessidade da administração tributária deter informações cadastrais. Em outras palavras, segundo documento do Tesouro Nacional, a criação do CNPJ não interfere na execução orçamentária e financeira […] o fundo que contratar e receber notas fiscais utilizando o CNPJ do próprio fundo, terá apenas as obrigações tributárias decorrentes de seus atos.

A fiscalização dos recursos do Fundeb, bem como o acompanhamento, controle social e comprovação é objeto de extensa regulamentação normativa, a saber, em primeiro lugar, conforme o disposto no capítulo VI da Lei nº 11.494, de 2007.

Há extensa previsão relativa a instrumentos de controle e de fiscalização. Verifica-se determinação para ação prioritária do Ministério da Educação, a quem compete atuar, principalmente, no monitoramento da aplicação dos recursos dos fundos, por meio de sistema de informações orçamentárias e financeiras e de cooperação com os Tribunais de Contas dos Estados e Municípios e do Distrito Federal. Além, naturalmente, da fiscalização que o Ministério da Educação é submetido ao Tribunal de Contas da União.

A norma de regência explicita também competências de órgãos de controle interno no âmbito da União, bem como de órgãos de controle interno no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Há também determinação para atuação dos Tribunais de Contas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, a par da fiscalização pelo Tribunal de Contas da União, no que tange às atribuições a cargo dos órgãos federais, especialmente em relação à complementação da União.

Deve-se levar em conta que as fontes de recursos do Fundeb têm as mais variadas origens. Recursos federais oxigenam o Fundeb, direta e indiretamente. Nesta última hipótese, via fundos de participação estaduais e municipais, bem como por intermédio de quotas partes de ITR. Na primeira hipótese, nos casos de recursos diretos, a título de complementação da União. Assim, em tese, e em princípio, limitar-se a participação da União, quanto à fiscalização de recursos, apenas nas hipóteses de complementação, seria tomar-se a parte pelo todo. E não deve ser o caso.

A quem cabe a fiscalização dos recursos do Fundeb? A matéria é exaustivamente discutida em âmbito de Supremo Tribunal Federal (e o era desde a época do FUNDEF) por força dos contornos de constitucionalidade que o problema coloca, a propósito, especialmente, da fixação de critérios funcionais para o federalismo educativo.

Por exemplo, ainda em contexto do antigo FUNDEF, o Supremo Tribunal Federal, no HC 80867/PI, relatado pela Ministra Ellen Gracie, em julgamento de 18 de dezembro de 2001, na Primeira Turma, decidiu que o desvio de verbas do FUNDEF, qualificaria interesse da União a ser preservado, pelo que a competência fiscalizatória era do Tribunal de Contas da União, bem como eventual crime seria apurado junto à Justiça Federal.

No entanto, na ACO 1156/SP, relatada pelo Ministro Cezar Peluso, e julgada em 1º de julho de 2009, na composição plena do Tribunal, em tema de conflito de competências entre Ministério Público Federal e Ministério Público Estadual, decidiu-se que a competência é do Ministério Público Estadual, quando não se tenha complementação de verbas federais, bem entendido, em matéria de ação civil de reparação de dano ao Erário, por conta de improbidade administrativa.

Não foi este, porém, o entendimento que prevaleceu na ACO 1151/MG, relatada pelo Ministro Joaquim Barbosa, em julgamento de 12 de agosto de 2010, que se reportou a precedentes do STF no sentido de que, tratando-se de crimes envolvendo recursos do FUNDEF, a atribuição investigatória é do Ministério Público Federal, ainda que eventuais desvios ou irregularidades tenham sido praticados, em tese, por Prefeito Municipal.


Há tendência também consolidada, no sentido de se qualificar o interesse da União, na hipótese do desvio de verbas, especialmente do Fundeb (embora o julgado em seguida fora produzido em discussão de FUNDEF). É o caso do decidido no RE 464621/RN, relatado pela Ministra Ellen Gracie, em julgamento da Segunda Turma, em 14 de outubro de 2008.

Relevante também o conteúdo do MS 27410/DF, relatado pelo Ministro Joaquim Barbosa, julgado em 13 de agosto de 2010, quando se decidiu que o Tribunal de Contas tem competência para fiscalizar contas de Prefeito, por força de dispositivos constitucionais (art. 71, II e VI), bem como de disposição de Lei Orgânica do TCU (art. 41, IV, da Lei nº 8443, de 1992).

Na ACO 1319/SP relatada pelo Ministro Dias Toffoli em julgamento de 17 de junho de 2010, fixou-se a tese que o presente ensaio abraça, no sentido de que a matéria sugere competência fiscalizatória concorrente, e que recursos da União (ainda que não em sua forma de complementação) exigem a intervenção da União. Isto é, a questão envolve o Ministério Público Federal, a Advocacia-Geral da União, o Tribunal de Contas da União. É o que o interesse da União não é apenas financeiro. Transcende para os interesses da sociedade, que devem ser tutelados, da matéria mais eficiente possível. No que interessa:

Observo, todavia, que o FUNDEF é composto por verbas do Fundo de Participação do Estado e dos Municípios (FPE e FPM); por receita gerada com a arrecadação do imposto sobre produtos industrializados (IPI) proporcional às exportações do Estado; e por verbas federais destinadas a compensar a perda dos Estados com a desoneração do ICMS sobre as exportações determinada pela Lei Complementar nº 87/96 (art. 1º, § 1º, da Lei n° 9.424/96). Assim, mesmo que não contribua a título de complementação, a União destina recursos ao referido fundo, seja por meio da receita do IPI ou de parcela que compensa a perda com a arrecadação do ICMS nos Estados. Por esse motivo, o desvio de verbas do FUNDEF, embora atinja interesses econômicos local, atrai a competência da Justiça Federal e a conseqüente atribuição do Ministério Público Federal. De qualquer forma, tenho É verdade que o ensino fundamental compete prioritariamente aos Estados e Municípios, conforme dispõe o art. 211, §§ 2º e 3º, da Constituição Federal. No entanto, tal previsão não exclui o papel da União na promoção do ensino básico, tanto é que o caput do dispositivo prevê que “a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.10

A questão, então, deve ser enfrentada e resolvida em face dos seguintes problemas. A) Em âmbito penal, quem detém competência para fiscalizar malversação de recursos do Fundeb, no caso de desvio estadual ou municipal? A Justiça Federal ou a Justiça Estadual? B) De igual modo, a quem compete a posição de dominis litis, o Ministério Público Federal ou o Ministério Público Estadual? C) No que se refere à posição do Tribunal de Contas, no mesmo caso, a quem incumbe a fiscalização, ao Tribunal de Contas da União ou aos Tribunais de Contas Estaduais? Bem entendido, as questões são colocadas nas hipóteses nas quais não se tenha complementação de recursos federais. Neste último caso, indiscutível a presença da União.

No que se refere à competência para apreciação da matéria em seus aspectos penais, especialmente, dispõe o inciso I do art. 109 da Constituição que aos juízes federais compete processar e julgar as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes, exceto as de falência, as de infortunística e as sujeitas à Justiça Eleitoral e Justiça do Trabalho. E ainda, dispõe também o inciso IV do art. 109 da Constituição que é competência da Justiça Federal julgar infrações penais praticadas em detrimento de interesse da União, excluídas as contravenções. Deve-se, assim, definir-se o conteúdo do interesse da União. A matéria foi tratada no julgado pelo Ministro Dias Toffoli no precedente acima reproduzido, quando se entendeu que o interesse de que menciona o texto constitucional não é apenas de fundo econômico. Além do que, há vários recursos que compõem o Fundeb que tem origem federal, ainda que não se fale em modelo de complementação.

A matéria é de competência da Justiça Federal, o que, por via de consequência, assinala para a competência do Ministério Público Federal e, ainda, para a Advocacia-Geral da União. Deve-se, tão somente, verificar hipóteses de concursos de crimes, bem como eventuais foros privilegiados dos réus, de modo a, eventualmente, e nos exatos limites dos casos levados a juízo, alterar-se o regime de competências.

O interesse é da União. Primeiro, porque há transposição de recursos que decorrem da capacidade de arrecadação do ente central. Segundo, porque há hipóteses de complementação de valores estaduais e municipais por parte dos cofres da União. Terceiro, porque se trata de educação, em sua dimensão nacional, isto é, de diretrizes e bases da educação nacional, matéria de competência legislativa privativa da União, nos termos do disposto no inciso XXIV do art. 22 da Constituição Federal, nada obstante ser matéria de competência legislativa concorrente entre União, Estados, Distrito Federal e ao Distrito Federal a fixação de normas sobre educação, cultura, ensino e desporto.

A matéria é de competência fiscalizatória primordial do Tribunal de Contas da União. O assunto é de matriz constitucional. O inciso II do art. 71 da Constituição Federal dispõe que é competência do Tribunal de Contas da União julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, bem como julgar as contas de quem derem causa a irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público.

Recursos públicos exigem fiscalização do Tribunal de Contas, ainda que geridos por ente privado, conforme o Supremo Tribunal Federal há decidiu no MS 21.6.444, relatado pelo Ministro Néri da Silveira, em julgamento do Plenário de 4 de novembro de 1993, quando se assentou que embora a entidade seja de direito privado, sujeita-se à fiscalização do Estado, pois recebe recursos de origem estatal, e seus dirigentes hão de prestar contas dos valores recebidos; quem gere dinheiro público ou administra bens ou interesses da comunidade deve contas ao órgão competente para a fiscalização.

Não há fiscalização do Tribunal de Contas da União em relação aos Estados quando os recursos sejam originários dos próprios Estados, a exemplo de valores oriundos da exploração de recursos naturais da plataforma continental, como definido pelo Supremo Tribunal Federal no MS 24.312, relatado pela Ministra Ellen Gracie, em julgamento de Plenário de 19 de fevereiro de 2003.

O inciso IV do art. 41 da Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992 dispõe que é competência do Tribunal de Contas da União fiscalizar, na forma estabelecida no Regimento Interno, a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município.

E o problema não é semântico. É prático, utilitário, pragmático. Não há, de fato, convênio, e nem acordo, e muito menos ajuste. No repasse de verbas do Fundeb o que se tem é o cumprimento de disposição constitucional, pormenorizada em lei federal, e ajustada pelo próprio Tribunal de Contas e pelo Ministério da Educação.

A locução outro instrumento congênere é de amplo uso, sugere horizonte de sentido que deve ser focado à luz de critérios de filtragem constitucional, a exemplo do contexto no qual se desenha o Tribunal de Contas, bem como de superiores princípios que sugerem a educação como valor superlativo a ser perseguido numa sociedade de informação, e de inspiração democrática.

O Tribunal de Contas da União alcança os responsáveis pela aplicação de quaisquer recursos repassados pela União, mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a estado, ao Distrito Federal ou a município, como disposto no inciso VIII do art. 5º do Regimento Interno daquele Sodalício. Como já assinalado, deve-se conferir à locução outros instrumentos congêneres um sentido que lhe dê uma máxima eficácia, isto é, a concepção é de ampliação dos recursos e motores de regimes de fiscalização.

E ainda que por entendimento próprio o Tribunal de Contas da União deduzisse forma distinta, dispondo, de modo endógeno e autopoiético (a usarmos expressão bem ao sabor da teoria dos sistemas de Niklas Luhmann) não se deve prestigiar o entendimento, sem maiores digressões, bem entendido. Como argumentado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, quando se discutiu o problema do FUNDEF relativo ao Município de Rosana, na ACO 1161/SP, relatada pelo Ministro Dias Toffoli, e julgada em 8 de março de 2010, os atos normativos internos do TCU, dispondo sobre o exercício deste mister, que sequer é exclusivo, não se prestam nem têm força para determinar a competência jurisdicional. A matéria é de Constituição. E é de lei. E não de construção pretoriana.

Na referida ACO 1161/SP o Ministro Dias Toffoli decidiu que havia competência tanto do Ministério Público Federal quanto do Ministério Público Estadual. Àquele compete conduzir a ação penal, a este último a ação civil, no que se refere à apuração e responsabilização por improbidade administrativa.


Em matéria de Fundeb as competências devem ser exercidas de modo conjunto e ordenado. Tratando-se de competência fiscalizatória concorrente, deve-se zelar por atuação conjunta entre o Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual, entre o Tribunal de Contas da União e o Tribunal de Contas dos Estados. E não se deve restringir a competência do Tribunal de Contas da União pelo fato de que há mais de 5.500 municípios no Brasil. A questão é de gerenciamento, e não de tangenciamento da realidade por intermédio de interpretação legal. E por matéria de acompanhamento concorrente ao que é federal imputa-se a fixação das diretrizes gerais. Até porque, segundo a lei, o acompanhamento e o controle social sobre a distribuição, a transferência e a aplicação dos recursos dos Fundos serão exercidos, junto aos respectivos governos, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, por conselhos instituídos especificamente para esse fim.

4 Conclusões

Conclui-se que a natureza jurídica do repasse de recursos do Fundeb é de feição constitucional, processando-se de modo automático, o que não se confunde com a natureza do fundo propriamente dito, que é um fundo contábil. A fiscalização dos referidos recursos é do Tribunal de Contas da União, em colaboração com os Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, a par do Ministério Público Federal e dos Ministérios Públicos Estaduais, do Distrito Federal e dos Territórios, respeitando-se também as competências fixadas no Capitulo VI da Lei nº 11.494, de 2007, no que toca à composição dos vários conselhos lá indicados. Tem-se uma competência fiscalizatória concorrente, na qual o interesse da União não é apenas econômico. Por isso, não se pode negar a preocupação da União nas causas referentes à malversação dos recursos do Fundeb, ainda que não se tenha complementação de recursos federais.

Notas

1 A questão toda sugere uma discussão do modelo federalista. Conferir, para os propósitos de uma teoria do federalismo educativo, Rui de Britto Álvares Afonso Pedro Luis Barros e Silva, – vários autores, Federalismo no Brasil – Desigualdades Regionais e Desenvolvimento. São Paulo: Fundap, 1995, e dos mesmos autores, Reforma Tributária e Federação. São Paulo, Fundap, 1995. José Alfredo de Oliveira Baracho, O Princípio da Subsidiariedade – Conceito e Evolução. Rio de Janeiro: Forense, 1996, bem como Teoria Geral do Federalismo, Rio de Janeiro: Forense, 1986. Gilberto Bercovici, Dilemas do Estado Federal Brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. Michael Bothe, Federalismo, um Conceito em Evolução. São Paulo: Fund. Konrad-Adenauer, 1995. Levi Carneiro, Federalismo e Judiciarismo. Rio de Janeiro: Alba Officinas Graphicas, 1930. Dalmo Dallari, O Estado federal. São Paulo: Ática, 1986. Sérgio Ferrari, Constituição Federal e Federação. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. Peter House, Modern federalism – An Analitical Approach, Lexington, 1982. Janice Helena Ferreri Morbidelli, Um Novo Pacto Federativo para o Brasil. São Paulo: Celso Bastos, 1999. Dircêo Torrecillas Ramos, O Federalismo Assimétrico. Rio de Janeiro: ed. Forense, 2000.
2 Conferir, para abordagem geral dos presentes desafios da educação brasileira, Colin Brock e Simon Schwartzman, Os Desafios da Educação no Brasil, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005. O volume conta com excelentes ensaios sobre vários assuntos, a exemplo da qualidade e da equidade na educação brasileira, do problema da educação técnica, da bifurcação da educação superior em publica e privada, dos desafios da pós-graduação, entre tantos outros.
3 Maria Lúcia de Arruda Aranha. História da Educação e da Pedagogia- Geral e do Brasil, São Paulo: Moderna, 2006, especialmente p. 294 e ss.
4 Conferir Paulo Ghiraldelli Jr. História da Educação Brasileira. São Paulo: Cortez, 2009.
5 Para um mapeamento do problema das prioridades da educação no contexto da América Latina, Simon Schwartzman e Cristián Cox (eds.). Políticas Educacionais e Coesão Social, uma Agenda Latino- Americana. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
6 Plano Nacional de Educação, anexo, p. 51.
7 Recursos do fundo, hoje Fundeb, vinculam-se diretamente a políticas de formação de professores. Conferir Cristina Helena Almeida de Carvalho. Política Econômica, Finanças Públicas e as Políticas para Educação Superior: de FHC (1995-2002) a Lula (2002-2006). In Margarita Victoria Rodriguez e Maria de Lourdes Pinto de Almeida, Políticas Educacionais e Formação de Professores em Tempos de Globalização, Brasília: Liber Livro Editora, 2008. p. 191 e ss.
8 Plano Nacional de Educação, anexo, p. 52.
9 Conferir, especialmente, Fernando Rezende. Federalismo Fiscal: em Busca de um Novo Modelo. In Romualdo Portela de Oliveira e Wagner Santana (orgs.). Educação e Federalismo no Brasil: Combater as Desigualdades, Garantir a Diversidade, Brasília: UNESCO, 2010. p. 71 e ss.
10 Supremo Tribunal Federal, ACO 1319/SP relatada pelo Ministro Dias Toffoli em julgamento de 17 de junho de 2010.

Referências Bibliográficas

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Forum atua em prol de membros e servidores da AGU

Dirigentes do Forum reivindicaram criação de sala de amamentação, creche e posto de saúde em reunião com a Secretaria-Geral de Administração da AGU.


Crise do formalismo no direito tributário brasileiro

Autor: Marco Aurélio Greco, Advogado – Doutor em Direito Professor da FGV-DireitoGV

Veículo: Revista da PGFN, ano 1 número 1, jan/jun. 2011

O leitor pode pensar que a frase acima foi retirada de um livro doutrinário sobre planejamento tributário ou, então, que se encontra em texto de Direito Constitucional, ou mesmo de Teoria Geral do Direito, onde se discute o tema da ponderação de valores consagrados na Constituição de 1988.

Ledo engano.

Trata-se de trecho de ementa de acórdão da 4ª Câmara do Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda1 proferido à vista de Auto de Infração lavrado contra certo contribuinte em razão de determinada operação de reorganização societária que realizou.

Um Tribunal Administrativo formado por especialistas na matéria tributária, reconhecidamente preparados para examinar os mais intrincados temas ligados à aplicação das leis tributárias em si e em cotejo com aspectos de ordem contábil ou societária está a fazer uma ponderação de valores constitucionais para solucionar um caso concreto?

A perplexidade que a leitura da frase pode ensejar para quem teve uma formação formalista cresce quando o leitor se depara com o parágrafo imediatamente anterior da ementa, assim redigido:

O fato de cada uma das transações, isoladamente e do ponto de vista formal, ostentar legalidade, não garante a legitimidade do conjunto de operações, quando fica comprovado que os atos praticados tinham objetivo diverso daquele que lhes é próprio.

Novas perplexidades para o menos avisado: legalidade das transações isoladas não é suficiente? Que vem a ser esta “legitimidade” que o acórdão exige exista no conjunto de operações?2

Este é um bom exemplo para mostrar a mudança de eixo das discussões ocorrida nos últimos anos no âmbito do Direito Tributário brasileiro.

Recordo brevemente alguns pontos.

O Direito Tributário – como área de conhecimento sistematizado no campo jurídico – é recente. Embora o tributo em si exista há séculos, a reunião das normas e princípios que o regulam num conjunto circunscrito, objeto de exame específico não tem cem anos. O referencial histórico que pode ser mencionado a indicar o surgimento dessa preocupação encontrase na edição do Código Tributário Alemão de 1.919.3

No Brasil da primeira metade do Século XX, o estudo jurídico dos tributos aparecia no bojo da Ciência das Finanças e só a partir da obra e dos esforços de alguns estudiosos é que a partir da década de 40 passou a ganhar espaço o tratamento em separado dos tributos como objeto de preocupação científica.4

Nas décadas seguintes, os estudos receberam profundas influências oriundas de duas vertentes distintas: a vertente constitucional (com raízes explícitas na experiência norte-americana)5 e a vertente administrativa (com raízes da experiência continental européia) a ponto de a doutrina situar o Direito Tributário como capítulo do Direito Administrativo (ATALIBA, 1973, p. 33). Influências de caráter oposto, pois a constitucional prestigiava os direitos e garantias individuais enquanto a administrativa invocava como um de seus princípios fundamentais a supremacia do interesse público sobre o interesse particular.

O produto final deste conjunto foi o surgimento de uma concepção do Direito Tributário com inúmeros defensores e que pode ser resumida como o conjunto de normas protetivas do patrimônio individual e limitadoras das investidas do Fisco.6

Princípios constitucionais tributários – nesse contexto – eram as previsões que vedassem algo ao Fisco, seja em termos de instrumento (legalidade), do objeto alcançado (irretroatividade), em relação ao momento da cobrança (anterioridade) ou à dimensão da exigência (proibição do confisco).7 Princípios cuja formulação começava com um “não” (não pode cobrar sem lei; não pode cobrar em relação ao que já aconteceu; não pode cobrar antes de certa data; não pode confiscar etc.).

Uma relação historicamente conflituosa – como é a relação Fisco/ contribuinte – era vista da perspectiva da proteção ao cidadão viabilizada através de normas de bloqueio do exercício do poder. Neste contexto, a lei em sentido formal passou a ser o requisito indispensável para autorizar qualquer exigência pelo Fisco. Iniciou o que se pode designar por “idolatria da lei” vista, porém, como entidade virtual; ou seja, texto com vida própria que se destaca do contexto que levou à sua produção e daquele no qual será aplicada para assumir a condição de algo bastante em si. Uma forte influência platônica e idealista.

Acrescente-se que, a partir de 1964, o Brasil viveu o período da Revolução em que estavam em vigor os Atos Institucionais e as discussões de caráter substancial (isonomia, desigualdades sociais, distribuição de renda etc.) não encontravam espaço. Tanto é assim, que, ao ensejo da Emenda Constitucional n. 18, de 1965, que reformulou o sistema constitucional tributário – em grandes linhas até hoje vigente – encontra-se a revogação expressa do artigo 202 da Constituição Federal de 1946 que consagrava o princípio da capacidade contributiva. Suprimiu-se da Constituição o referencial substancial que servia de fundamento à tributação, para torná-la algo autodenominado de racional, mas que, na prática, mostrou-se mera expressão do exercício de poder.8

O modelo teórico de tratamento dos temas tributários ganhou importante avanço no início da década de 70 – por obra de Geraldo Ataliba no seu “Hipótese de incidência” (1973). Este Autor manifestava intensa preocupação com os fundamentos filosóficos de sua abordagem, basta ver que logo na terceira página do texto já invoca Juan Manuel Teran (jusfilósofo mexicano) e Lourival Vilanova.9 Este livro desenvolve um novo (à época) instrumental para análise da lei tributária, a partir da visão kelseniana dos âmbitos de validade da norma jurídica, que foram trazidos para o debate tributário como os “aspectos” (material, pessoal, espacial e temporal) da “hipótese de incidência” da lei tributária.

A partir deste estímulo, os estudos de Teoria Geral do Direito, aplicados ao campo do Direito Tributário, se desdobraram naquilo que era possível fazer dentro do contexto histórico então vivido que se mostrava reativo a discussões de caráter substancial. A discussão tributária a partir de então centrou-se na hipótese de incidência (=previsão abstrata) e, num segundo momento, na sua formulação legal.

A utilidade deste modelo é inegável, pois permite sistematizar o debate, da perspectiva formal e da hierarquia das normas; a meu ver, o modelo mais viável no contexto político então vigente. Mas trata-se de modelo insuficiente, pois a realidade jurídica e o fenômeno tributário não se esgotam nestes aspectos. Fato e valor também compõem a experiência jurídica.

Paralelamente (estou falando do início da década de 70), foram criados os Cursos de Pós-Graduação em Direito na PUC de São Paulo em cuja formulação Geraldo Ataliba e Celso Antonio Bandeira de Mello fizeram questão que as disciplinas Filosofia do Direito e Teoria Geral do Direito fossem obrigatórias para todos os alunos, quaisquer que fossem suas respectivas áreas de concentração.

Com isto, abriu-se espaço para as lições de Tércio Sampaio Ferraz Júnior no âmbito da disciplina de Filosofia do Direito para a qual foi convidado e passou a lecionar em 1973. Naquela oportunidade, o Professor Tércio trouxe para o debate uma visão pragmática do Direito (que supõe o exame da temática da função e, por conseqüência, dos fins para cujo atingimento contribui a própria dogmática) e introduziu nas discussões que a partir de então se travaram elementos oriundos da semiótica, em particular os três planos da linguagem (sintático, semântico e pragmático).

A preocupação com a linguagem começava a ganhar espaço; no início se apresentava quase como um desafio para descobrir termos mais elaborados a serem utilizados;10 disto caminhou-se para um aprofundamento do estudo da linguagem em si como objeto científico.

Neste momento, deu-se uma fusão que é importante referir para bem entender a evolução do debate no âmbito tributário: a variável política – que não permitia o debate de questões substanciais – levou a privilegiar as análises e discussões jurídicas que se concentrassem nos aspectos formais e lingüísticos do texto legal (aspectos da hipótese de incidência) o que tornava a utilização do instrumental vindo da semiótica (na sintática e na semântica), politicamente “aceitável”. Debater com a Autoridade no plano sintático e semântico e suscitar questões ligadas à hierarquia (das normas) era um porto seguro onde o questionamento do exercício da autoridade estatal (via tributação) podia se dar sem maiores riscos.

Discussões nestes dois planos (sintático e semântico) foram a tônica dos debates por mais de vinte anos, enquanto a pragmática e a análise da função ficaram na penumbra. A lição de BOBBIO (1977) que expunha a passagem da visão estrutural para a funcional e o novo papel do direito nas sociedades industriais modernas, assumiam, nesse contexto, um caráter quase que etéreo.


Isto é compreensível, pois o formalismo e o estruturalismo encontram espaço propício em contextos autoritários como instrumento de proteção de valores democráticos (CALABRESI, 2000, p. 482) ou conservadores em que não se pretenda dar espaço para discussões de caráter substancial quanto aos fatos sociais (LE ROY, 1999, p. 24).

No plano doutrinário, a “hipótese de incidência” desdobrou-se na “regra matriz de incidência” (na visão de Paulo de Barros Carvalho11); a “hipótese de incidência” foi o modelo teórico amplamente adotado para exame da constitucionalidade de um sem-número de exigências tributárias.

O debate no plano semântico repercutiu inclusive no Supremo Tribunal Federal, basta lembrar a questão da incidência ou não da contribuição previdenciária sobre pagamentos a trabalhadores autônomos e o debate sobre o sentido do termo “folha de salários” na redação original do artigo 195 da CF/88.12

Por outro lado, os debates sobre isonomia, capacidade contributiva, distorções de fato no plano da concorrência pela diversidade de entendimentos tributários, financiamento do Estado, funções do Estado e políticas públicas eram temas pouco ou nada examinados.

Infelizmente, o debate a nível pragmático ficou em segundo plano. Discussões mais abrangentes sobre a função social dos institutos, da propriedade, do tributo e mesmo da dogmática jurídica (como aponta o título da obra do Professor Tércio) não encontraram o mesmo desdobramento teórico e prático. Nem mesmo o debate sobre o procedimento como modo de agir do Poder Público encontrou tão ampla produção teórica como a relativa à hipótese de incidência.

Neste contexto, se por um lado a ação do Fisco era controlada por instrumentos formais, a ação do contribuinte também só encontrava limites formais. Vigorava a visão que prestigia uma liberdade absoluta do contribuinte para organizar sua vida, como bem lhe aprouvesse desde que o fizesse por atos lícitos, praticados antes da ocorrência do fato gerador e sem simulação. Restrições a essa liberdade só poderiam advir de lei expressa que vedasse certo comportamento (XAVIER, 2001). Não havia um controle material ou funcional do sentido e alcance do exercício da liberdade individual.

Diversas foram as conseqüências que resultaram deste contexto político, teórico e jurídico. Uma delas foi a idolatria da lei em si, que transformou a legalidade tributária que tinha a feição de uma “legalidade libertação” – por ser instrumento de bloqueio da ação do poder estatal – numa “legalidade dominação” com sucessivas restrições à liberdade do contribuinte (GRECO, 2008b).

Por outro lado, a liberdade absoluta do contribuinte levou a uma infinidade de estruturas negociais e reestruturações societárias que, com propriedade, foram consideradas meramente “de papel”. A prevalência da forma levou, da perspectiva da legalidade, à veiculação de praticamente quaisquer conteúdos desde que através de lei em sentido formal; e da perspectiva da liberdade de auto-organização ao surgimento de “montagens jurídicas” sem qualquer substância econômica, empresarial ou extra-tributária. Enquanto o modelo formal de abordagem do fenômeno tributário era levado à sua quintessência e privilegiava a forma – e não apenas esta, pois chegava até mesmo à idolatria da linguagem em que esta se apresentava – a realidade política, social e fática mudava profundamente.

A Constituição de 1988 assumiu o perfil de uma Constituição da Sociedade Civil, diversamente da Carta de 1967 que possuía o feitio de uma Constituição do Estado-aparato (GRECO, 2005). Esta mudança se espraia por todo seu texto a começar pelo artigo 1º que afirma categoricamente ser o Brasil um Estado Democrático de Direito e não apenas um Estado de Direito e seu art. 3º, I coloca a construção de uma sociedade livre, justa e solidária como objetivo fundamental da República. Isto implica colocar a variável social ao lado e no mesmo plano da individual e abre espaço para se reconhecer a solidariedade social como fundamento último da tributação (GRECO, 2005).

Note-se, também, que seu artigo 5º não assume o papel de um elenco de “direitos e garantias individuais” (como o art. 150 da CF/67 e o art. 153 na redação da EC-1/69) para contemplar os “Direitos e deveres individuais e coletivos”. Mudança relevante, pois seu inciso XXIII aponta na direção de a liberdade individual passar a ser condicionada a uma razão não meramente individual. Isto foi explicitado pelo artigo 421 do Código Civil de 2002 ao prever que “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”. Vale dizer, a função social não é mero limite, mas também razão do exercício dessa liberdade, o que põe às claras a importância dos motivos que levam à celebração de determinado ato ou negócio jurídico (GRECO, 2008a, p. 505-514).

Especificamente em matéria tributária, a CF/88 colocou os antigos princípios constitucionais tributários (legalidade, anterioridade e irretroatividade) como “limitações constitucionais”, vale dizer, como regras de bloqueio ao exercício do poder, mas não como preceitos que consagrem um valor positivo prestigiado pelo ordenamento. Valor positivo é, por exemplo, a capacidade contributiva (art. 145, § 1º, 1ª parte).

Em suma, a variável política e filosófica encampada na Constituição mudou.

Por outro lado, a sociedade passou a ver nos direitos fundamentais e na eficácia jurídica das normas que os prevêem um canal relevante de reconhecimento e atendimento das demandas sociais.

Por fim, criou-se a consciência de que a criatividade deve ser prestigiada, mas é importante reagir contra a mera esperteza de quem quer levar vantagem como se o indivíduo vivesse isolado, tendo o mundo submetido à sua disposição ou predação.

A isto se acrescentem as lições de Ricardo Lobo Torres (2003) quando acentua a evolução ocorrida no plano teórico, pois passamos da jurisprudência dos conceitos, para a jurisprudência dos valores, inclusive no âmbito tributário.

A mudança política, social e fática levou a uma mudança de mentalidade que repercutiu no modo pelo qual devem ser compreendidas as condutas do Fisco e do contribuinte. Em relação à conduta do Fisco questionam-se as finalidades de sua ação, bem como a destinação e a aplicação dos recursos arrecadados e sua compatibilidade efetiva com as políticas públicas que devem subsidiar; em relação à conduta do contribuinte questiona-se a existência de um fundamento substancial que a justifique (razão ou motivo para o exercício da liberdade de contratar).

A própria idéia de quebra de igualdade tributária foi revista; se, no regime da CF/67, havia quebra de isonomia quando o tributo era exigido discriminatoriamente de alguém, no modelo da CF/88 o prestígio da capacidade contributiva como princípio tributário explícito aponta haver quebra de isonomia também quando o tributo não é exigido de alguém que manifestou a capacidade contributiva contemplada na lei. Daí os dois sentidos que podem ser extraídos do artigo 150, II da CF/88: (i) como proibição de exigências discriminatórias e (ii) como proibição de não exigir o tributo de todos que se encontrem em situação equivalente.13

Paralelamente, evoluiu o debate sobre as normas programáticas que – de uma simples recomendação (como eram vistas na década de 60), passaram a ver-lhes reconhecida a eficácia negativa de bloqueio de preceitos legais que as contrariassem (SILVA, 1968, p. 161), para alcançarem na CF/88 o reconhecimento de sua eficácia positiva de direcionamento da produção legislativa e jurisprudencial. Esta eficácia positiva das normas programáticas gerou reflexos não apenas no plano das prestações positivas pelo Estado, mas também, no plano da interpretação e aplicação das normas jurídicas em geral e tributárias em particular (PIMENTA, 1999, p. 237; GRECO, 2008a, p. 329).

É de se compreender porque textos como aquele em que defendi a possibilidade de existir abuso de direito por parte do contribuinte ao reorganizar sua vida para obter menor carga tributária (1996) foi execrado, e o que afirmava a eficácia positiva da norma de prevê a capacidade contributiva (1998) ser considerado “audaciosamente original” (XAVIER, 2001, p. 104). Alguns chegaram a dizer que instaurar um debate teórico sobre a justificação substancial da ação do contribuinte que vise pagar o menor tributo legalmente possível seria “abrir a caixa de Pandora”. Os fatos se mostraram mais fortes do que os modelos formais. O debate substancial está instaurado e, talvez para surpresa de alguns, isto não se deu predominantemente no âmbito do Poder Judiciário (onde o tema da ponderação de valores constitucionais encontra espaço propício), mas no âmbito da jurisprudência administrativa, como é exemplo o acórdão referido no início do presente estudo. Note-se como esse acórdão lida com os conceitos de legalidade e de legitimidade. Aquela ligada ao critério eminentemente formal, enquanto esta é atrelada a um valor prestigiado pelo ordenamento.

Pondera-se (mitiga-se) a liberdade com a isonomia e a capacidade contributiva. Exige-se um motivo para que a conduta do contribuinte seja fiscalmente aceitável. Passa a assumir relevância o conjunto de atos praticados e não cada um isoladamente; o filme e não apenas a foto; o fazer efetivo e não apenas o querer abstrato.

O debate tributário – com todas as letras – deixou de ser um debate formal. Não se trata de prevalência da substância sobre a forma, mas de coexistência; não se trata de sobre+por, mas de com+por valores.

A grande questão que agora se põe é de saber quais os parâmetros e critérios a serem adotados nesse novo contexto em que a substância é tão importante quanto a forma.

Neste momento, resgatar o debate sobre a perspectiva funcional e reavivar lições como as que permanecem latentes na obra de Tércio Sampaio Ferraz Júnior é tarefa que certamente contribuirá positivamente para a construção da sociedade livre, justa e solidária que o artigo 3º, I da CF/88 alça a primeiro objetivo fundamental da República.


 

Notas

1 BRASIL. Ministério da Fazenda, Acórdão n. 104-21.675 da 4ª Câmara do 1º Conselho de Contribuintes, proferido na Sessão de 22.06.2006, Relator Nelson Mallmann, ementa disponível em: http://www.conselhos.fazenda.gov.br. Acesso em: 25.jun. 2008..
2 Embora sobre tema não tributário, a referência à “legitimidade” como parâmetro a ser considerado na análise de contratos, convênios etc., é também invocada no voto do Min. Cezar Peluso no MS-24.584 (STF, Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ-20.06.2008). A interpretação que me parece mais adequada é de entender que a legitimidade se encontra na sintonia com os valores consagrados no ordenamento, o que abre espaço para uma análise tridimensional do fenômeno tributário.
3 RUY BARBOSA NOGUEIRA expõe que o Código Tributário Alemão “… a partir de sua elaboração em 1919, foi o verdadeiro marco da sistematização científico-legislativa do Direito Tributário e provocou não só na doutrina, como na jurisprudência, avanço na forma e no conteúdo deste ramo do Direito, mas também irradiou conceitos e institutos a outros ramos jurídicos, ultrapassando fronteiras e repercutindo nas legislações e elaborações doutrinárias e jurisprudenciais tributárias de outros países.” (NOGUEIRA, 1978, p. XI).
4 Um dos primeiros autores de Direito Tributário no Brasil foi ALIOMAR BALEEIRO que, em 1951, publicou seu clássico Limitações constitucionais ao poder de tributar.
5 A ponto de o Decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890, ao criar o Supremo Tribunal Federal e disciplinar o processo no âmbito federal, estabelecer categoricamente que: “Art. 386. Constituirão legislação subsidiaria em casos omissos as antigas leis do processo criminal, civil e commercial, não sendo contrarias ás disposições e espirito do presente decreto. Os estatutos dos povos cultos e especialmente os que regem as relações juridicas na Republica dos Estados Unidos da America do Norte, os casos de common law e equity, serão tambem subsidiarios da jurisprudencia e processo federal.” (grifei e realcei) Ou seja, na lacuna da legislação brasileira deveria ser aplicada a experiência norte-americana! . Disponível em: http:// www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=66054. Acesso em: 19.11.2008).
6 MACHADO, 2004, p. 60.
7 Note-se que BALEEIRO (1951), sob a denominação de “limitações” examina os denominados “princípios” constitucionais tributários.
8 Para um exame da passagem do poder para a função no campo tributário, veja-se o meu “Do poder à função tributária”, no volume Princípios e limites da tributação 2, coord. Roberto Ferraz, São Paulo: Quartier Latin, 2009.
9 ATALIBA, 1973, p. 11.
10 “Calha à fiveleta” é um exemplo de expressão clássica que à época passou a ser freqüentemente utilizada.
11 Para um exemplo atual da aplicação deste modelo, veja-se CARVALHO, 2008.
12 BRASIL, Supremo Tribunal Federal, RE-166.772, Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ-16.12.1994.
13 Aqui talvez esteja a raiz da “ideologia da incidência” a que se refere o Min. Luiz Fux no seu voto proferido no REsp. 1.027.799, 1ª T. Rel. Min. José Delgado, DJ-20.08.2008.

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ASAclub fará prospecção em Belo Horizonte

Nos dias 21 a 23 de setembro, o consultor de convênios do ASAclub estará na cidade de Belo Horizonte negociando novas parcerias aos associados.


AGU amplia áreas de atuação na recuperação de verbas públicas

SINPROFAZ parabeniza o Diretor do Departamento de Patrimônio e Probidade da AGU, o Advogado da União André Mendonça, que vem ampliando as áreas de atuação do setor. Ano passado foram recuperados R$ 491 milhões para os cofres federais.


Sem investimento, PGFN arrecada menos do que pode

Autor: Allan Titonelli Nunes, Procurador da Fazenda Nacional

Data de publicação: 17 de julho de 2011

Veiculo: Revista Consultor Jurídico – CONJUR

 

A atividade financeira do Estado moderno está ligada à necessidade de captar, gerir e executar os recursos públicos para a concretização dos interesses da sociedade.

Para o alcance dos objetivos e atividades a serem exercidas pelo Estado será necessária a arrecadação de recursos, a qual não se esgota em si mesma, sendo um instrumento para a concretização daqueles.

Ocorre que para a construção de um país mais igualitário, diminuindo a desigualdade social existente, é primordial que todos contribuam, na medida de suas possibilidades. Entretanto, sempre haverá aqueles que deixam de cumprir com suas obrigações.

Nesse pormenor, o ordenamento jurídico brasileiro incumbiu à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a arrecadação dos tributos e demais receitas não pagas e inscritas em dívida ativa da União. Tendo a Lei Complementar 73/1993 atribuído à PGFN a responsabilidade pela[1]: a) apuração da liquidez e certeza da dívida ativa da União de natureza tributária, inscrevendo-a para fins de cobrança, amigável ou judicial; b) representação da União, na execução de sua dívida ativa de caráter tributário; c) exame prévio da legalidade dos contratos, acordos, ajustes e convênios que interessem ao Ministério da Fazenda, inclusive os referentes à dívida pública externa, e promoção da respectiva rescisão por via administrativa ou judicial; e d) representação da União nas causas de natureza fiscal.

Assim, o procurador da Fazenda Nacional é o agente capaz de garantir a isonomia entre o devedor e o cidadão que paga seus tributos, através da cobrança dos créditos da União. Na medida em que todos passarem a contribuir haverá maior disponibilidade de caixa para a execução das políticas públicas, bem como possibilitará a realização de uma maior transferência da carga tributária, saindo da incidência sobre consumo para a renda.

Para a concretização desse anseio o princípio da capacidade contributiva deverá ser o vetor de interpretação e execução do Sistema Tributário Nacional, onde cada cidadão contribuirá na medida de suas riquezas, concretizando, consequentemente, a isonomia tributária.

Logo, considerando as reiteradas manifestações do governo federal de maior racionalidade e eficiência nos gastos da União e do ajuste fiscal, deveria haver uma melhor estruturação da PGFN. Isso porque a adoção de medidas tendentes à diminuição do estoque da dívida da União pode resultar em receitas “extras” para a União implementar suas políticas públicas. Nesse contexto, as reportagens (Conjur[2] e Estadão[3]: “Passivo judicial da União ultrapassa R$ 390 bilhões”, O Globo[4]: “Governo vai atrás de R$32 bi em dívidas este ano”) destacaram o papel estratégico da PGFN na recuperação dos créditos federais.

Sendo certo que mesmo sem haver carreira de apoio, estrutura física, técnica e instrumental adequada para o exercício das atividades dos procuradores da Fazenda Nacional e sem a nomeação de todo seu quadro de procuradores, a PGFN apresentou resultados excelentes no ano de 2010, os quais passam a ser relatados[5]:

  1. A atuação judicial da PGFN evitou uma perda de R$ 567.575.263.751,93 dos cofres da União. Resultado do sucesso em causas judiciais discutidas no Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais.
  2. No ano de 2010, a PGFN arrecadou o montante de R$ 16.221.010.504,74 para os cofres da União.
  3. Considerando-se o total arrecadado e a despesa total da PGFN, no ano de 2010, pode-se dizer que para cada R$ 1,00 alocado na PGFN, o órgão retornou à sociedade e ao Estado, aproximadamente, R$ 34,47.
  4. Ainda considerando o total arrecadado e o número de procuradores da Fazenda Nacional em 2010 (2.043, dois mil e quarenta e três procuradores), pode-se dizer que cada procurador arrecadou, em média, R$ 7.939.799,56 para a União.

A publicação “Os Números da PGFN”[6] possui diversos outros dados referentes ao órgão em destaque, os quais deixam de ser citados face a análise perfunctória da questão neste artigo.

Pelos números divulgados pode-se perceber que a PGFN é superavitária e autossustentável. Outrossim, apesar de ser um órgão estratégico para a União, há deficiências estruturais que podem ser eliminadas. Essa realidade pode ser alterada com a adoção de algumas medidas como: a criação de uma carreira de apoio; modernização das instalações e funcionalidades técnicas do sistema de informática; implantação de remuneração isonômica em relação às carreiras essenciais à Justiça, evitando o elevado índice de evasão de procuradores e demais membros da AGU; diminuição do número de processos por procurador, através da nomeação de todo o quadro de procuradores da Fazenda Nacional; instituição de prerrogativas isonômicas àquelas existentes para os juízes e promotores, visando dar condições de igualdade no enfrentamento judicial; entre outras.

A demora na implantação dessas soluções resulta em um aproveitamento inferior ao que o órgão poderia estar atingido. Em época de anúncio de contenção de gastos o planejamento estratégico deve ser valorizado, motivo pelo qual o investimento na PGFN é lucro, uma vez que, levando em conta os dados de 2010, cada R$ 1,00 empregado resultou em um retorno de R$ 34,47 à sociedade e ao Estado. Essas considerações servem como um alerta para o governo federal, o qual tem pautado sua atuação na valorização das soluções técnicas.

Notas

[1] Atribuições previstas nos incisos do Art. 12, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993. BRASIL. Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993. Disponível em:
[2] Disponível em:
[3] Disponível em: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110130/not_imp672968,0.php Acesso em: 05.01.2011.
[4] Disponível em: http://oglobo.globo.com/economia/mat/2011/01/23/governo-vai-atras-de-32-bilhoes-em-dividas-este-ano-923589701.asp Acesso em: 01.05.2011.
[5] Disponível em : http://www.pgfn.fazenda.gov.br/h_37806_interpgfn_site/noticias/a-pgfn-em-numeros-2010 Acesso em: 10.05.2011.
[6] GADELHA, Marco Antônio. Os Números da PGFN. Sinprofaz. Brasília: 2008. Disponível em :

 

Allan Titonelli Nunes é procurador da Fazenda Nacional e diretor secretário do SINPROFAZ.

Revista Consultor Jurídico, 17 de julho de 2011

Link para publicação:http://www.conjur.com.br/2011-jul-17/devido-falta-investimento-pgfn-arrecada


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