Por Arthur Rosa | De São Paulo
Os devedores da União estão praticamente sem escapatória. Se não encontram recursos em contas bancárias, por meio do Bacen-Jud, os procuradores federais partem diretamente para a penhora de recebíveis de cartões de crédito. Em 2011, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que adotou esse caminho um ano antes, conseguiu bloquear aproximadamente R$ 6 milhões de grandes varejistas.
A estratégia também foi incorporada pela Procuradoria-Geral Federal (PGF) – órgão vinculado à Advocacia-Geral da União (AGU) – para a cobrança de parte dos R$ 40 bilhões devidos às 155 autarquias e fundações públicas federais. Os procuradores entendem que os valores repassados pelas operadoras de cartão de crédito podem ser classificados como dinheiro, primeiro item da lista de bens penhoráveis prevista na Lei de Execuções Fiscais (nº 6.830, de 1980) e no Código de Processo Civil (Lei nº 5.869, de 1973).
“Se não tem nada na conta, pedimos a penhora de recebíveis”, diz o coordenador-geral de cobrança e recuperação de créditos da PGF, procurador federal Fabio Munhoz, lembrando, porém, que o índice de recuperação em execuções fiscais, “quando é bom”, chega a 2%. “Por isso, estamos apostando em meios alternativos, como protesto de certidões de dívida ativa (CDAs) e conciliação. Por meio do protesto, alcançamos índice de 46% no primeiro semestre.”
Em São Paulo, a penhora de recebíveis de cartão de crédito virou a primeira opção em muitos casos. O Estado está cobrando grandes redes de varejo, de supermercados e de farmácias. Hoje, há cerca de 600 pedidos tramitando na Justiça. O índice de vitórias, de acordo com o subprocurador-geral do Estado, Eduardo José Fagundes, é alto. De 28 decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça paulista (TJ-SP), de acordo com levantamento realizado pela Área do Contencioso Tributário-Fiscal, 21 são favoráveis ao governo estadual. “Deu muito certo. É um procedimento eficaz para o setor varejista”, afirma o subprocurador.
Já há, porém, casos de contribuintes que conseguiram burlar a estratégia adotada em 2010 pela Fazenda paulista. De acordo com o subprocurador-geral, criaram-se empresas só para receber créditos de cartões. “Conseguimos, por meio de nossa inteligência fiscal, identificar esse caminho”, diz. Meios para escapar da penhora on-line também foram identificados pelo Grupo Gestor do Sistema de Atendimento ao Poder Judiciário (Bacen-Jud). Mesmo assim, foram congelados R$ 22 bilhões em 2011 para pagamento de credores em todo o país – 10% a mais em relação ao ano anterior.
O Estado de São Paulo está obtendo vitórias, segundo Fagundes, mesmo em pedidos de substituição de bens penhorados por créditos de cartões. O relator de um caso julgado recentemente pela 2ª Câmara de Direito Público do TJ-SP, desembargador Corrêa Vianna, entendeu que o crédito repassado “assume, para o fornecedor, o caráter de dinheiro, com máxima liquidez”, assumindo, portanto, ordem prioritária na penhora. “É pleno o respaldo legal à penhora de créditos oriundos de vendas intermediadas por cartão de crédito ou débito.”
Na esfera federal, a União também coleciona vitórias – algumas limitando percentualmente a penhora -, mesmo com precedente favorável no Superior Tribunal de Justiça (STJ), relatado em 2003 pelo ministro Luiz Fux, hoje no Supremo Tribunal Federal (STF). Para ele, além de não estar prevista na lista de bens penhoráveis, a medida “implicaria carrear para as administradoras de cartão responsabilidade patrimonial não prevista em lei”. Naquela época, porém, esse tipo de pedido era feito de forma esporádica. “O assunto precisa ser examinado pela nova composição do STJ, que dará a palavra final”, diz William Roberto Crestani, do escritório Pinheiro Neto Advogados.
Há também precedentes favoráveis aos contribuintes nos tribunais regionais federais (TRFs). Na 4ª Região, a 3ª Turma negou o pedido pleiteado pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). A relatora do caso, desembargadora Maria Lúcia Luz Leiria, entendeu que, além de não estar listada no artigo 655 do CPC, a medida por interferir na atividade econômica da empresa, poderia até mesmo inviabilizá-la. “Provoca um problema no fluxo de caixa. O comerciante que sofre a penhora já arcou com muitos dos custos para a venda de suas mercadorias”, afirma Glaucia Lauletta, sócia do Mattos Filho Advogados.