Por Maíra Magro | De Brasília
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidirá o destino de milhares de pessoas e empresas que entraram em programas de parcelamento de dívidas tributárias, como o Refis, mas continuam com dinheiro bloqueado ou bem penhorado a pedido do Fisco. Enquanto os contribuintes reclamam de penalidade dupla, a Fazenda teme que a liberação desses valores resulte em um calote generalizado.
“Nos preocupa que o parcelamento seja usado como instrumento de levantamento de garantias”, diz o procurador da Fazenda Nacional Claudio Xavier Seefelder Filho, coordenador-geral de representação judicial no STJ. Ele explica o cenário visualizado pelo Fisco: “O devedor entra no parcelamento, paga uma quantia ínfima, levanta o dinheiro ou os bens penhorados. Depois rescinde o parcelamento, vende tudo e a Fazenda fica a ver navios.”
Em um julgamento que servirá de modelo para casos semelhantes, o STJ analisará um recurso da Fazenda Nacional contra um devedor do Rio Grande do Norte – uma pessoa física que tenta liberar um bloqueio de R$ 550 mil de sua conta, depois de ter entrado no Refis em 2009 para pagar uma dívida de Imposto de Renda. O dinheiro foi bloqueado a pedido do Fisco durante o processo de execução, cobrança do débito na Justiça.
O contribuinte argumenta que depende do dinheiro para pagar despesas básicas de subsistência. “O que causa estranheza é o fato de que, embora tenha reconhecido o parcelamento, o Fisco continua insistindo que a pessoa seja duplamente onerada”, reclama o advogado do devedor, Renato Duarte Melo.
Segundo o advogado, inúmeros devedores estão na mesma situação – alguns com dinheiro bloqueado, imóvel ou outros bens penhorados para garantir processos de execução. No caso de seu cliente, o dinheiro foi bloqueado pelo sistema Bacen-Jud, por ordem de um juiz federal em Natal.
Depois que o contribuinte aderiu ao Refis, o advogado solicitou ao juiz a liberação dos valores, justificando a necessidade de uso com despesas ordinárias. “Com o parcelamento, a própria Fazenda emite uma certidão negativa de débito. Não há porque manter o dinheiro preso”, afirma Melo. De acordo com ele, uma corrente de argumentação jurídica defende que, no caso da penhora de imóveis, não haveria prejuízo em mantê-la, pois o contribuinte poderia continuar obtendo renda com esses bens. “Mas para numerário em dinheiro, a situação é muito mais grave. O contribuinte fica de mãos atadas. Com qual dinheiro vai pagar o parcelamento?”
O procurador da Fazenda Nacional alega, por sua vez, que o valor poderia ser convertido em pagamento da dívida. “A Fazenda não teria nenhum problema em fazer isso”, diz o procurador Claudio Seefelder. Segundo ele, no caso da penhora de bens, uma situação comum é o contribuinte acabar se livrando daqueles de maior liquidez – por isso a preferência em bloquear renda. “Ele vende a parte boa e fica só a parte ruim, que a Fazenda não consegue vender nunca. A dívida fica impagável.”
Em primeira instância, o juiz negou o pedido do devedor potiguar, entendendo que o parcelamento não acarreta a liberação de garantias usadas para lastrear a cobrança. O contribuinte recorreu para o Tribunal Regional Federal (TRF) da 5ª Região, que reverteu a decisão.
A Fazenda foi então ao STJ. No dia 28 de fevereiro, o relator do caso na 1ª Turma, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, sugeriu que o processo fosse remetido à Corte Especial, formada pelos 15 ministros mais antigos e competente para analisar questões relacionadas à Constituição Federal.
Valor Econômico 14.03.2012