Você moraria num condomínio que tivesse uma dívida que comprometesse 10% (Dez por cento) da sua taxa condominial todos os meses? Pior: que esses 10% (Dez por cento) não fossem suficientes para pagar nem os juros da dívida do seu condomínio e que essa dívida crescesse sem parar?
Dez por cento do seu condomínio apenas para pagar parte de uma divida que não parasse de crescer!
Pois bem, também não moraria nesse condomínio por vontade própria. Entretanto, sinto informá-lo: todos moramos nesse condomínio.
Esse é o condomínio chamado República Federativa do Brasil, que gasta mais de 10% (dez por cento) da arrecadação no âmbito federal para pagar parte dos juros de uma dívida interna que não para de crescer e que providencia a rolagem ad infinitum do resto.
Fica pior. Segundo o Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC, quase ¼ do orçamento do nosso condomínio em 2011 será encaminhado para a rubrica de juros e amortizações da dívida (22,06% do orçamento), in http://www.inesc.org.br/noticias/noticias-do-inesc/2010/novembro/orcamento-2011-um-ajuste-fiscal-seletivo/.
Portanto, a maior rubrica do nosso condomínio não é a da previdência social (21,89% do orçamento), saúde ou educação para muitos, mas é a rubrica de juros dos mais altos do mundo e da rolagem da dívida para poucos.
Aí, disseram-me no botequim que a pressão inflacionária não deixou alternativas ao Banco Central em 2011. Mas não se lembraram que, durante a crise de 2008, enquanto todos os paises praticamente zeravam as taxas básicas de juros das respectivas economias, o Brasil manteve em dois dígitos (13,75% ao ano, para ser mais exato) a invencível taxa SELIC.
Ora, em momento de necessidade, aumentar agora a taxa SELIC de 5% (Cinco por cento) para 5,75% (Cinco vírgula setenta e cinco por cento) seria bem diferente de aumentá-la de 11% (Onze por cento) para 11,75% (Onze vírgula setenta e cinco por cento).
A diferença, que é sutil ou aborrecida para muita gente boa, implica dezenas de bilhões desviados para remunerar o capital que entra e sai do Brasil com o aperto de um botão, em detrimento da previdência social, saúde, educação, segurança e do investimento produtivo em infraestrutura, por exemplo.
A dívida pública federal em janeiro de 2011 atingiu R$ 1.628.990.000.000,00 (Hum trilhão e seiscentos e vinte e oito bilhões e novecentos e noventa milhões de reais), segundo números extraídos do sítio do Tesouro Nacional.
Sobre esse montante incidem os 11,75% (Onze vírgula setenta e cinco por cento) da taxa SELIC.
O que seria gestão temerária no âmbito privado é tratado com desinteresse ou resignação no âmbito público, sem percebermos que 0,25% (zero vírgula vinte e cinco por cento) de aumento na taxa SELIC implica um aumento de R$ 4.072.475.000,00 (Quatro bilhões e setenta e dois milhões e quatrocentos e setenta e cinco mil reais) ao ano na dívida interna.
Isso tudo não é contemplado para efeito da propalada “responsabilidade fiscal”, porque a conta de juros não entra na arquitetura sofisticada dos números do orçamento.
A autonomia do Banco Central do Brasil não pode ser absoluta, porque quem tem o mandato popular num Estado de Direito não é o presidente do Banco Central, demissível ad nutum, mas, no caso presente, a síndica.
Portanto, ao reclamar justamente da alta carga tributária, lembre-se de que boa parte dos nossos tributos paga apenas parte de uma dívida que também é sua e não para de crescer.
Diante desse quadro, talvez, precisemos convocar uma assembleia geral extraordinária, quem sabe na Cinelândia, para dizermos que não aceitamos mais a má gestão dos dinheiros no condomínio Brasil.
Heráclio Mendes de Camargo Neto, condômino.