Advocacia de Estado: Cícero, Demóstenes e Macunaíma – SINPROFAZ

NOTÍCIAS


Confira as notícias

19 set, 2012

Advocacia de Estado: Cícero, Demóstenes e Macunaíma


“Somos todos escravos da Lei para que possamos ser livres” Cícero

Em defesa do Estado de Direito, o Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional – SINPROFAZ reitera seu compromisso com a Advocacia de Estado, porque, depois de anos de protelação e sigilo, sem debater democraticamente com as Carreiras da Advocacia-Geral da União, o governo federal enviou ao Congresso Nacional o projeto de lei complementar, PLP nº 205/2012, que altera a Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União.

A nova Lei Orgânica deveria resguardar as atribuições constitucionais da Advocacia-Geral da União, função essencial à Justiça e órgão técnico responsável pelo controle de legalidade e constitucionalidade dos atos administrativos, pela prestação de consultoria ao Estado e pela defesa do patrimônio público.

Entretanto, a primeira excrescência jurídica do PLP nº 205/2012 aparece logo no artigo 2º-A, o qual transforma em “membros da Advocacia-Geral da União” os meros detentores de cargos de natureza especial e em comissão de conteúdo eminentemente jurídico.

Noutras palavras, a aprovação desse dispositivo propiciaria a nomeação de pessoas sem qualquer vínculo com a Advocacia-Geral da União para ocuparem cargos em comissão à revelia da Constituição Federal e dos princípios da moralidade, da impessoalidade e do concurso público.

Esse dispositivo representa um atentado ao Estado Democrático de Direito, reinaugurado em 1988, quando a Constituição Federal eliminou do convívio da Advocacia-Geral da União e do serviço público o compadrio e o clientelismo, que envolviam as nomeações políticas sem critérios técnicos e sem o filtro da isonomia de oportunidades e da eficiência administrativa, resguardadas pelo concurso público.

No mesmo sentido, o projeto de lei abre as portas para a advocacia sem compromisso com o Estado, ao permitir que estranhos à Advocacia Pública Federal ocupem os cargos de Consultor Jurídico dos Ministérios, conforme prevê o artigo 58 do projeto.

Ensina o Ínclito Ministro Ayres Britto que a Constituição Federal exige para os procuradores públicos, em sentido amplo, como exige para os juízes, o concurso público com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases (RE 558.258/SP).

Contudo, essa advocacia de Estado, que a nova lei orgânica deveria robustecer, é solapada reiteradas vezes nesse projeto de lei, que mais parece uma consolidação de poderes na pessoa do Advogado-Geral da União, em detrimento de uma desejada ordenação impessoal da estrutura, prerrogativas e deveres da Advocacia-Geral da União.

A hierarquização prevista na proposta legislativa viola a discricionariedade técnica dos Advogados, resguardada pela Constituição e pelo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, tornando meramente formal e engessada a atuação dos Advogados Públicos Federais, que têm compromisso inarredável com o Estado brasileiro, e não precisam de autorização, muito menos, de apenação do governante de plantão para dizer sobre a juridicidade no âmbito da Administração Pública.

Num Estado de Direito, a Constituição Federal e as Leis aprovadas pelo Poder Legislativo informam primaria e soberanamente a atuação dos Advogados Públicos Federais. Por óbvio, tudo que não colidir com a Lei pode e deve ser contemplado nos pareceres e manifestações da AGU.

Confirmando as críticas externadas, o artigo 4º, XXII, do projeto de lei concede ao Advogado-Geral da União o poder de suspender, com prazo determinado, a exigibilidade de créditos tributários e não tributários e a inscrição em cadastros restritivos da Administração Federal no curso de processo de conciliação.

Esse dispositivo de natureza eminentemente tributária é subliminarmente colocado num projeto de lei orgânica da Advocacia Pública Federal, sem qualquer relação com o objeto legislativo, criando uma situação esdrúxula de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, a qual não guarda coerência com as hipóteses previstas no artigo 151 do Código Tributário Nacional e sem qualquer salvaguarda em relação à prescrição tributaria, mas dá margem ao subjetivismo, que pode ser utilizado como instrumento político nefasto, em detrimento dos princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade.

No país dos casuísmos clientelistas, que pretendemos avidamente superar, a convalidação desse anacrônico dispositivo abriria as portas para favorecimentos políticos subalternos e constrangimentos a contribuintes idôneos, que poderiam ser tratados de forma desigual e, portanto, inconstitucional.

Em apertada síntese, esses são apenas alguns aspectos a serem combatidos no PLP nº 205/2012, os quais precisam ser enfrentados no Congresso Nacional.

Resta evidenciada a tentativa de amesquinhamento do espaço público na Advocacia-Geral da União, notadamente em face do desproporcional alargamento da discricionariedade e do subjetivismo conferidos às competências do Advogado-Geral da União, em afronta evidente aos princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade pública.

Finalmente, ensina Demóstenes: “É de bom cidadão preferir as palavras que salvam às palavras que agradam.”. Portanto, em nosso Estado de Direito, sob o vigilância cotidiana da opinião pública, uma vez mais, o Parlamento brasileiro preferirá a vontade da Lei à vontade do governante de plantão, salvaguardando a sociedade brasileira de eventuais gestores macunaímicos, que tratam a Coisa Pública como se sua fosse, quando deliberar sobre o mérito do PLP nº 205/2012, que originará a nova Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União.

SINPROFAZ – Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional



VOLTAR