Por Sergio Leo e Marta Watanabe | De Brasília e São Paulo
Engenheiro eletrônico, formado pela Universidade de Brasília (UnB), o baiano Roberto Azevêdo poderia estar hoje envolvido na construção das hidrelétricas amazônicas do governo Dilma Rousseff. Em 1982, trabalhava para uma consultora, Themag, no cálculo de potências das grandes barragens da época. É casado com Maria Nazareth Farani Azevêdo, que conheceu quando davam aulas de inglês, na Casa Thomas Jefferson, em Brasília. Maria Nazareth decidiu fazer diplomacia e Azevêdo resolveu acompanhá-la, mesmo sem falar o francês exigido nos testes para o Instituto Rio Branco. Estudou com a mulher e passou na primeira tentativa, em 1983.
Até hoje, com amigos, o novo diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), quando lembra o começo da carreira, brinca que se tornou diplomata “por amor”. Já ao mundo da diplomacia comercial ele chegou pela disciplina de engenheiro. Ao ser transferido para Genebra, em 1997, cuidava, a princípio, de arquivos, tarefa burocrática reservada aos novatos da delegação; em 2001, porém, impressionou o então embaixador, Celso Amorim, ao participar de reuniões com advogados encarregados do litígio entre Brasil e Canadá, na disputa entre as empresas Bombardier e Embraer. Dedicado ao tema de subsídios, Azevêdo havia estudado detalhadamente as regras da OMC sobre o assunto e trouxe para as discussões propostas que se revelaram fundamentais na briga com o Canadá. Passou, a seguir, a ser chamado para opinar em outros casos e, ainda em 2001, quando o Brasil resolveu criar uma coordenação-geral exclusivamente para tratar das disputas comerciais, o conselheiro Roberto Azevêdo, foi nomeado para o posto, para o qual havia se pensado em um embaixador.
Em 2004, em meio à discussão sobre a formação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), Amorim, já ministro das Relações Exteriores, designou Azevêdo para o time de negociadores brasileiros. Da discussão sobre a Alca, que acabou em impasse, ele foi para a chefia do departamento econômico, e passou a comandar a delegação brasileira nas negociações da Rodada Doha, de liberalização comercial na OMC, que, agora, como diretor-geral da organização, terá a tarefa de levar a algum resultado. Durante a campanha para a direção da OMC, um amigo, em Brasília, chegou a propor, em tom de brincadeira, que o Brasil reivindicasse dos candidatos testes de aptidão física. Integrante, quando adolescente, da equipe brasileira de natação, Azevêdo é esportista e chegou a ter, aos 12 anos, o terceiro melhor tempo do Brasil. Jogador de tênis como a esposa, hoje joga futebol aos fins de semana.
O novo diretor-geral da OMC conseguiu um feito raro na diplomacia, em suas passagens por Brasília e Genebra: é elogiado por todos com quem trabalhou, e, aparentemente, não tem desafetos. Discreto, é estimado pelos diversos grupos políticos no Itamaraty e elogiado até por autoridades com quem sentou em lados opostos em contenciosos internacionais, como o ex-representante comercial da Casa Branca (USTR, em inglês), Ron Kirk. “É um excelente diplomata, gosto muito dele”, disse Kirk ao Valor, em Davos, em janeiro. “Um engenheiro veio mostrar que não precisamos de advogados”, graceja o ex-presidente do Órgão de Apelação da OMC, Luiz Olavo Baptista, que conta ter ouvido esse comentário de uma autoridade em Genebra. O advogado brasileiro se diz impressionado com a atuação do diplomata. “Em vários casos demonstrou lógica, capacidade de exposição e profissionalismo; atuava melhor que 80% dos advogados”, diz Baptista.
Azevêdo é visto por diplomatas de outros países como negociador leal e honestamente dedicado a encontrar soluções. Na preparação para a conferência ministerial da OMC, em Bali, no fim deste ano, o diplomata é um dos principais formuladores da proposta que deve permitir, na reunião, uma “colheita antecipada” de resultados, com acordos parciais em temas como redução de barreiras técnicas e burocráticas ao comércio.
“Roberto foi treinado para ser diplomata, aquele que entende os dois lados”, define a economista Vera Thorstensen, ex-assessora da missão brasileira em Genebra. “Até mesmo nos painéis [de arbitragem na OMC], todos falavam dele por conta disso: ele realmente tenta entender a situação de cada envolvido e é capaz de construir pontes.”
Azevêdo montou sua campanha com o argumento de que, ao conhecer os detalhes das negociações passadas, inclusive as personalidades dos negociadores, estaria mais preparado para negociar a superação de impasses, no momento em que se formam inúmeros acordos à margem da OMC. “O resgate da Rodada Doha não depende dele, mas ele pode atuar de forma conciliadora, fazendo com que as partes apresentem novas fórmulas para levar a discussão à frente”, acredita o embaixador Rubens Barbosa, presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Fonte: Valor Econômico